De um almoço de trabalho directa para a maternidade

Susana Santos, directora de relações externas do El Corte Inglés, e Célia Reis, directora-geral da Altran Portugal, multinacional especializada em consultoria de inovação e tecnologia, dizem que as mulheres que chegam ao topo não são tão exigentes com os salários como os homens.

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Susana Santos, directora de relações externas do El Corte Inglés, e Célia Reis, directora-geral da Altran Portugal, multinacional especializada em consultoria de inovação e tecnologia, não se conhecem. Mas ambas frequentaram o mesmo MBA para executivos, da  AESE - Escola de Direcção e Negócios, onde eram uma minoria dentro de turmas sobretudo de homens. E têm em comum estas conversas menos convencionais com os seus obstetras.

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Susana Santos, directora de relações externas do El Corte Inglés, e Célia Reis, directora-geral da Altran Portugal, multinacional especializada em consultoria de inovação e tecnologia, não se conhecem. Mas ambas frequentaram o mesmo MBA para executivos, da  AESE - Escola de Direcção e Negócios, onde eram uma minoria dentro de turmas sobretudo de homens. E têm em comum estas conversas menos convencionais com os seus obstetras.

Célia Reis, 46 anos, que é engenheira informática e que quando estava grávida tinha acabado de formar a sua própria empresa, lembra-se de discutir com o médico as datas previsíveis do parto para as tentar casar com a sua agenda de trabalho. Lembra-se que os dois filhos, que hoje têm 18 e 15 anos, lhe fizeram o favor de nascer a uma sexta-feira.  E no segundo filho, como já sabia ler os sinais de parto conseguiu ainda levar uma reunião de trabalho até ao fim. “Sai do cliente para a maternidade.”

Célia Reis acorda todos os dias às 4h30 da manhã, é a hora a que tem o despertador. Responde e envia emails das 5h às 7h, do outro lado já recebe respostas, sobretudo de colegas homens que ocupam cargos como o seu. Quer isto dizer que qualquer pessoa, homem ou mulher, que queira chegar a lugares de topo no mundo empresarial tem de fazer sacrifícios, mas não tem dúvidas que as mulheres têm de fazer muitos mais.

Está pacificada com as decisões que foi tendo de tomar mas diz que “foi muito difícil e doloroso”. Na decisão de não amamentar o filho durante pelo menos três meses diz que “biologicamente não lhe dei prioridade”, porventura não o deixou com as defesas que viriam do leite materno, mas não quer dizer que se arrependa. “Foi uma escolha. Teria feito da mesma maneira. Estava a arrancar com a minha empresa, não podia parar”. Há um constante contrabalançar entre “o que ganhamos e o que não conseguimos fazer. Eu sou feliz assim.”

Quando Célia Reis acaba de responder aos seus emails, a família acorda, são 7h da manhã, toma o pequeno-almoço com o marido e os dois filhos e vai levá-los à escola. Sente que, com o seu exemplo, está a ensinar-lhes que construir coisas “exige sacríficos, escolhas, não se pode ter tudo”.

Susana Santos, 44 anos, mãe de uma filha de 11 e um rapaz de 6 anos, conta que quando o filho tinha dois anos de idade ele teve um problema de saúde grave que, para algumas mães, exigiria que lhe dedicasse 100% do seu tempo. Ela não o fez. Mesmo que fosse mais grave do que afinal revelou ser, Susana Santos não tem dúvida de que não teria deixado de trabalhar, porque isso significaria deixar de ser quem é, uma mulher que formou a sua empresa com 23 anos, que chegou a ter três empregos ao mesmo tempo “pelo prazer de experimentar”. “As crianças têm o direito de viver num ambiente de harmonia e tranquilidade”, e os pais também têm de colocar o seu bem-estar na equação, sob o risco de caírem numa “vertigem de queixa e da auto-comiseração”.

Susana Santos diz que este continua a ser “um mundo de gravatas” mas que há mudanças que podem conduzir a outras mudanças. À sua volta vê cada vez mais homens a partilhar licenças de paternidade, o que torna ainda mais desnecessária a pergunta discriminatória que é feita, nalgumas empresas, apenas às mulheres: pretende ter filhos? Susana Santos diz que sempre que surge um candidato de uma determinada idade, homem ou mulher, parte do pressuposto que vai querer ter filhos. Mas essa pergunta, obviamente, nunca é feita e lembra que quando o Corte Inglés abriu contrataram cerca de 2000 mil pessoas, no final do ano houve umas 80% que entraram para o quadro. O que se constatou é que houve um verdadeiro babyboom no segundo ano da empresa, “nasceram umas centenas de bebés”, filhos de trabalhadores e trabalhadoras, o que é a prova de que são “a estabilidade e a segurança no trabalho o grande motor da natalidade”.

Quando lhe falam de disparidades salariais entre homens e mulheres, a Pordata diz que nos quadros superiores são na ordem dos 30%, Célia Reis explica que existe esta diferença pelo facto de as mulheres que sobem até cargos altos de chefia não negociarem tanto os salários. “Como queremos entrar, não negociamos tanto”. E, na sua opinião, as mulheres olham mais “ao pacote: a remuneração é feita de realização profissional, há laços emotivos, e a outra parte é o salário. Para nós a componente emocional é maior e não negociamos tanto a parte financeira”.

Susana Santos explica esta desigualdade no mesmo sentido. Do lado do empregador, é como se ao darem o cargo a uma mulher a empresa estivesse já a fazer uma aposta nela, que já se pode considerar afortunada. Do lado das mulheres, é como se elas interiorizassem o raciocínio: quando chegam ao topo as mulheres dão-se por contentes “e não resmungam”.