Costa vê nas declarações de Juncker o fim "deste ciclo político"

Secretário-geral do PS aconselha líderes europeus a escutar palavras "sábias" do Presidente da Comissão Europeia.

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As declarações de Jean-Claude Juncker estão a ser recebidas com polémica Reuters

Um "momento de viragem" que os restantes líderes europeus deviam também assumir, desafiou o secretário-geral socialista: "A declaração do presidente Juncker é sábia e espero que seja bem escutada e compreendida pelos diferentes Governos, que têm aqui uma grande oportunidade, de uma vez por todas, de travarem este caminho para o precipício, de assumirmos de uma vez por todas que há um problema na Europa, que não é um problema exclusivamente grego e que tem de ser resolvido de uma forma solidária." 

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Um "momento de viragem" que os restantes líderes europeus deviam também assumir, desafiou o secretário-geral socialista: "A declaração do presidente Juncker é sábia e espero que seja bem escutada e compreendida pelos diferentes Governos, que têm aqui uma grande oportunidade, de uma vez por todas, de travarem este caminho para o precipício, de assumirmos de uma vez por todas que há um problema na Europa, que não é um problema exclusivamente grego e que tem de ser resolvido de uma forma solidária." 

Horas antes, o também socialista João Galamba desafiara o primeiro-ministro a “explicar o que pensa" sobre as declarações do presidente da Comissão Europeia, Jean-Claude Juncker, sobre o tratamento indigno aos países da periferia do euro, tendo em conta que o apoiou para presidir à Comissão.

"Quem já está confrontado com estas declarações é o primeiro-ministro, que aliás terá de explicar o que pensa das declarações de alguém que [a maioria PSD/CDS-PP] apoiou para liderar a Comissão Europeia", afirmou o dirigente do PS. Galamba realçou que o comportamento da ministra das Finanças - elogiada ao lado no congénere alemão que apresentou Portugal “indignamente como troféu da austeridade” -, também está "em total contraste" com as posições de Juncker.

O presidente da Comissão Europeia, Jean-Claude Juncker, afirmou na quarta-feira que a troika "pecou contra a dignidade" de portugueses, gregos e também irlandeses", admitindo que a afirmação pode parecer “estúpida” por ser dita pelo próprio ex-líder do Eurogrupo.

"Ver Jean-Claude Juncker a reconhecer o óbvio - que os países da periferia foram vítimas de uma estratégia errada e indigna - e ver no mesmo dia o Governo português submisso em Berlim, a prestar-se ser quase um pin na lapela do ministro das Finanças Schäuble é a demonstração de que temos um Governo que não defende os interesses nacionais e está do lado errado da História", acrescentou.

Para o secretário nacional do PS, as críticas de Juncker à troika revelam "que há uma maior abertura para reconhecer o falhanço da austeridade e a necessidade de mudar de políticas do que muitas vezes muitos querem fazer crer". "O Governo está empenhado em passar a ideia de que a Grécia está isolada, de que é de facto uma posição unânime no Eurogrupo que Portugal e a Irlanda foram o sucesso da austeridade, e o que estas declarações vêm mostrar é que não é bem assim, que há uma pluralidade nas opiniões dos líderes europeus e parece haver alguma abertura para reconhecer que a austeridade fracassou", considerou.

João Galamba defendeu ainda que apoiar a Grécia "serve os interesses de Portugal e sobretudo o interesse europeu": "Devemos olhar para a Grécia como um exemplo de um problema europeu e um problema europeu que nos diz muito respeito".

Juncker foi “infeliz”, diz o Governo
"Acho, manifestamente, que é uma declaração bastante infeliz do presidente da Comissão Europeia porque nunca a dignidade de Portugal nem dos portugueses foi beliscada, pela troika ou qualquer das suas instituições. Só posso classificá-la como declaração infeliz", afirmou o ministro da Presidência, Luís Marques Guedes, na conferência de imprensa após o conselho de ministros, em Lisboa.

"O programa da troika imposto a Portugal é um programa bastante duro, cuja dureza tinha a ver com a situação extremamente difícil em que o país se encontrava. É conhecido que Portugal conseguiu, através da credibilidade e confiança que granjeou, ir fazendo correcções ao próprio programa, em termos de metas e objectivos", referiu o responsável governamental português.

Para Marques Guedes, as metas e objectivos "eram manifestamente desajustados porque tinham sido mal negociados de início"."Cumprimos e Portugal conseguiu sair da situação difícil e merecer a confiança dos parceiros europeus", destacou.

Juncker quer alargar para quarteto, aponta PCP
Depois de meses a falar-se na possibilidade de a troika poder vir a ter um modelo de duo, saindo o Fundo Monetário Internacional (FMI), afinal o que o presidente da Comissão Europeia pretende é um modelo reforçado da troika, passando-a a quarteto, aponta, por seu lado, o eurodeputado João Ferreira. Mudando o modelo, mas mantendo as mesmas políticas de austeridade, diz o comunista.

“O caminho foi ele que o deixou claro: quem lá está deve continuar. E o modelo deve ser reforçado, acrescentando um quarto elemento; ou seja, que a troika passe a quarteto. E entre alguém cuja intenção seja legitimar politicamente a troika. Alguém que esteja na dependência do Eurogrupo”, descreve João Ferreira ao PÚBLICO.

“A situação dramática que se vive em Portugal, na Grécia ou na Irlanda, não se deve a aspectos formais da composição da troika. Deve-se, sim, ao conteúdo, às políticas. Mas perante o profundo descrédito destas políticas, quem as defendeu e continua a defender precisa de novas condições para a continuar a impor”, considera o eurodeputado.

João Ferreira diz mesmo que Juncker “procura uma nova forma de legitimar” a intervenção da troika. “Isto mostra que por vias diversas se procura alterar alguma coisa para que fique tudo na mesma, mudar a forma sem mudar o conteúdo; mudar o embrulho, mas manter o presente envenenado; garantir novas condições formais com a continuação das mesmas políticas.”

"São declarações que revelam uma enorme desfaçatez, proferidas por alguém que teve pesadíssimas responsabilidades, enquanto presidente do Eurogrupo, no desenho dos programas de intervenção da troika", assinalou, por seu lado, o eurodeputado do PCP à Lusa.

A "naturalidade", segundo PSD e CDS
"Eu encaro com toda a naturalidade. Não há aí novidade nenhuma. Carlos Moedas já tinha chamado a atenção para o facto de o modelo da troika não ser o mais adequado", desvalorizou Paulo Rangel citado pela Lusa.

De acordo com Paulo Rangel, as declarações de Juncker correspondem apenas a uma posição no seio da comissão que era partilhada por muitos. "Os comissários português e irlandês disseram há uns tempos que era importante mudar o modelo da troika porque consideravam, por experiência própria, que esse modelo tinha algumas limitações e criava desequilíbrios democráticos", recordou. E acrescentou que Jean-Claude Juncker sempre foi uma pessoa muito crítica do modelo, mesmo quando presidia ao Eurogrupo.

Sobre as críticas de Juncker à anterior Comissão Europeia (CE), liderada por Durão Barroso, Paulo Rangel disse não concordar porque "se houve alguém sensível à questão", foi Durão Barroso. "Não tem razão nenhuma. Se houve instituição que lutou o mais possível num contexto muito difícil, porque ainda não havia montado nenhum esquema europeu para responder às crises, e a dependência dos estados era enorme, foi Durão Barroso", disse o eurodeputado social-democrata.

Nuno Magalhães, líder parlamentar centrista, preferiu salientar que as declarações de Jean-Claude Juncker sobre a troika coincidem com "os alertas" deixados pelo CDS-PP nos últimos três anos, mas que essa situação foi "superada" por "mérito dos portugueses".

"Aquilo que o senhor Juncker disse foi aquilo que o CDS ao longo dos tempos, de uma forma mais ou menos explícita, foi alertando: um governo de protectorado é um vexame, é uma humilhação que o PS nos deixou; foi muito difícil co-governar com os credores", afirmou Nuno Magalhães aos jornalistas no parlamento.

O presidente do grupo parlamentar do CDS-PP assinalou que os centristas alertaram "várias vezes" para "uma discrepância pouco aceitável entre aquilo que responsáveis do FMI, sobretudo, mas também da Comissão Europeia e do BCE, diziam à comunicação social e o que os técnicos aqui propunham e exigiam".

"Dito isto, e sabendo até que o senhor Juncker já tinha dito algo parecido no seu discurso no Parlamento Europeu, não nos surpreende. Agora, gostaria de deixar bem claro que foi graças ao esforço, à dignidade, à vontade - e às vezes contra a vontade da própria troika -, que os portugueses se livraram da troika", declarou.

O "bom caminho para fazer a mea culpa" é acabar com a troika, diz o Bloco
"Se o senhor Juncker entende que as instituições europeias pecaram contra a dignidade dos povos então está numa excelente posição para alterar esse rumo das coisas", afirmou, por seu lado, a eurodeputada do Bloco de Esquerda.

Segundo Marisa Matias, a prova de que a dignidade dos povos foi colocada em causa é espelhada nos indicadores, quer na Grécia, quer em Portugal, lembrando que os dois países perderam, num caso "um milhão de postos de trabalho e em outro caso meio milhão".

"Houve nos dois países o aumento da pobreza infantil, da pobreza em geral, da desigualdade social, assistimos ao aumento do desemprego enorme e à destruição da economia", lamentou a eurodeputada. Apesar dos sacrifícios, nenhum dos objectivos avançados pelos programas de ajustamento foi cumprido, sendo que a dívida, "que continuou a crescer", se encontra agora "em níveis insustentáveis" quer na Grécia quer em Portugal.

Para Marisa Matias há um "bom caminho para fazer a mea culpa" que passa pela adopção de políticas que deixem de fora a troika e que apontem para a eliminação da austeridade. "Há muito boas oportunidades agora para demonstrar se se quer mudar alguma coisa ou não. Há amanhã uma reunião do Eurogrupo onde esses sinais se podem transformar em acções", explicou, lembrando que Juncker tem tido palavras críticas em relação a várias coisas e de incentivo ao investimento.

No entanto, Marisa Matias sublinhou que as propostas apresentadas pela Comissão Europeia, nomeadamente o plano de investimento, "deixam de fora aqueles que mais precisam".