Moção de censura ao Governo francês serve para confirmar reformas por decreto

Aprovação da Lei Macron é considerada fundamental por Hollande e Manuel Valls para provar a Bruxelas empenho nas reformas da economia. Por isso, usaram um mecanismo constitucional para a aprovar sem ser votada no Parlamento.

Foto
François Hollande, Manuel Valls e o ministro da Economia, Emmanuel Macron STEPHANE DE SAKUTIN/AFP

A deputada Emmanuelle Cosse, da Europa Ecologia-Os Verdes – partido que já esteve no governo, como aliado do PS, logo a seguir às eleições de 2012, mas entretanto desfez a aliança – criticou duramente o uso desta medida: “Isto é uma admissão de fraqueza, uma negação da democracia e uma arma anti-parlamentar”, declarou, usando a sua conta de Twitter. Com estas palavras, recordou que François Hollande disse em 2006, na última vez que o artigo 49.3 foi usado, pelo então primeiro-ministro do partido de centro-direita UMP, Dominique de Villepin, que a “democracia estava a ser negada”.

A verdade faz-nos mais fortes

Das guerras aos desastres ambientais, da economia às ameaças epidémicas, quando os dias são de incerteza, o jornalismo do Público torna-se o porto de abrigo para os portugueses que querem pensar melhor. Juntos vemos melhor. Dê força à informação responsável que o ajuda entender o mundo, a pensar e decidir.

A deputada Emmanuelle Cosse, da Europa Ecologia-Os Verdes – partido que já esteve no governo, como aliado do PS, logo a seguir às eleições de 2012, mas entretanto desfez a aliança – criticou duramente o uso desta medida: “Isto é uma admissão de fraqueza, uma negação da democracia e uma arma anti-parlamentar”, declarou, usando a sua conta de Twitter. Com estas palavras, recordou que François Hollande disse em 2006, na última vez que o artigo 49.3 foi usado, pelo então primeiro-ministro do partido de centro-direita UMP, Dominique de Villepin, que a “democracia estava a ser negada”.

Os tempos são outros e Manuel Valls e Hollande consideraram legítimo usar este mecanismo já aplicado 83 vezes desde 1958. “Assumiram a responsabilidade do Governo perante a Assembleia Nacional”, como se escreve no ponto 3 do artigo 49 da Constituição, para suspender a discussão de uma lei e dar um prazo de 24 horas para que os deputados apresentem uma moção de censura que, dentro de mais um dia, será discutida e votada. A UMP, de novo liderada pelo ex-Presidente Nicolas Sarkozy (que não é deputado) fê-lo, e será votada esta tarde.

“O Presidente considera esta lei um marco da sua presidência, uma renovação para a sociedade e a economia. Achou que era preciso acabar com rodeios, depois de se terem realizado debates muito ricos.” Foi esta a explicação dada no Palácio Presidencial aos jornalistas do Le Monde para avançar com esta espécie de governação por decreto – se bem que por mediação de uma moção de censura da oposição.

O pacote legislativo apresentado pelo ministro da Economia Emmanuel Macron é vasto: as reformas que prevê vão desde o alargamento da abertura das lojas 12 domingos por ano, em vez dos cinco actuais, novas regulamentações para o funcionamento dos notários e para o transporte de passageiros em camionetas, por exemplo. Não se pode dizer que houve falta de debate: em plenário e em comissão, sofreu cerca de mil alterações e mereceu 200 horas de debate.

No entanto, este pacote legislativo é altamente contestado pelos profissionais que afecta e pelos sindicatos – na verdade, o protesto contra a Lei Macron faz parte dos motivos para a convocatória de uma greve nacional feita por três centrais sindicais para 9 de Abril.

Franceses gostam da lei
Só que, apesar de suscitar tanta resistência entre os políticos, 61% dos franceses está a favor da Lei Macron, segundo uma sondagem Odoxa-FTI consulting para o jornal económico Les Echos. E entre os que lhe são favoráveis, 58% dizem ser de esquerda.

A moção de censura não tem hipóteses de sucesso, apesar de aos 228 votos do centro-direita se deverem juntar os 15 dos comunistas e da Frente de Esquerda. Os revoltosos ecologistas e socialistas avançaram que não se devem juntar à censura. Prevendo a hipótese de que os socialistas o fizessem, o ministro da Agricultura e porta-voz do Governo, Stéphane Le Foll, avisou que “não têm lugar no PS”. Por outras palavras, seriam expulsos. Resta-lhes a possibilidade da abstenção para expressar o seu descontentamento sem pôr em causa o Executivo de Valls, que tem 288 deputados e precisa apenas de mais um para ter a maioria absoluta.

O que esta crise política anuncia é já o congresso do PS francês marcado para Junho, onde se confrontarão duas visões diferentes do partido e também do que deverá ser o caminho para a sociedade e a economia francesa.

De um lado, a ala mais social-democrata, como Manuel Valls, comprometida com uma modernização económica, e em acabar com algumas especificidades francesas que em Bruxelas são vistas como motivos para os seus défices excessivos e excessiva estatização. Do outro, a ala esquerda do partido, em que pontificam os ex-ministros Arnaud Montebourg e Benoit Hamon, nomes respeitados pelos deputados revoltosos, que ao contrário preconizam mais intervenção do Estado.

Estas guerras internas, conjugadas com a ascensão eleitoral da Frente Nacional de Marine Le Pen, prometem dar maus resultados para o PS já nas próximas eleições para os departamentos (uma divisão administrativa regional francesa) em Março.