Unidades Locais de Saúde não estão a evitar internamentos desnecessários

Hospitais e centros de saúde que deveriam funcionar integrados mostram dificuldades em acompanhar os doentes e em cumprir tempos de espera. Entidade Reguladora da Saúde já tinha deixado alerta em 2011.

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A ULS de Matosinhos foi a primeira a ser criada, em 1999 Paulo Ricca

O trabalho foi feito pela ERS, a pedido do ministro da Saúde, Paulo Macedo, para perceber como é o acesso dos cidadãos aos cuidados de saúde prestados pelas Unidades Locais de Saúde (ULS) e também a qualidade dos serviços, a eficiência e o desempenho financeiro destas instituições. A ULS de Matosinhos foi a primeira a ser criada, em 1999. Só em 2007 foi criada a segunda, a ULS do Norte Alentejano, mas entretanto o país já conta com mais seis: ULS do Alto Minho, ULS do Baixo Alentejo, ULS da Guarda, ULS de Castelo Branco, ULS do Nordeste e ULS do Litoral Alentejano.

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O trabalho foi feito pela ERS, a pedido do ministro da Saúde, Paulo Macedo, para perceber como é o acesso dos cidadãos aos cuidados de saúde prestados pelas Unidades Locais de Saúde (ULS) e também a qualidade dos serviços, a eficiência e o desempenho financeiro destas instituições. A ULS de Matosinhos foi a primeira a ser criada, em 1999. Só em 2007 foi criada a segunda, a ULS do Norte Alentejano, mas entretanto o país já conta com mais seis: ULS do Alto Minho, ULS do Baixo Alentejo, ULS da Guarda, ULS de Castelo Branco, ULS do Nordeste e ULS do Litoral Alentejano.

A diferença entre uma ULS e os hospitais e centros de saúde tradicionais é que a ULS integra estes cuidados sob a alçada de uma mesma equipa de gestão. A forma como os serviços são pagos também é diferente. Os hospitais não integrados recebem de acordo com os actos que contratualizaram, enquanto a ULS é paga através de um chamado modelo de “capitação”, em que recebe uma verba por cada pessoa da sua área, independentemente dos cuidados prestados nos cuidados primários e hospitalares. O objectivo é ligar de forma mais eficaz os centros de saúde com os hospitais e cuidados continuados e reduzir custos por uma maior aposta na prevenção.

A incapacidade de evitar internamentos é precisamente uma das falhas apontadas no relatório da ERS. “Esta constatação sugere que os eventuais ganhos ao nível da coordenação entre cuidados de saúde primários e hospitalares proporcionados pela criação de ULS não se estarão a reflectir numa redução de hospitalizações desnecessárias”, lê-se no documento. A única ULS a revelar melhores resultados neste campo do que os restantes hospitais é a do Baixo Alentejo.

A ERS lembra, por isso, que “a integração dos cuidados de saúde constitui uma resposta organizacional aos desafios com que os sistemas de saúde se deparam e que “na génese das ULS esteve o objectivo de criar, por intermédio de um processo de gestão e de integração vertical, de diferentes níveis de cuidados, uma via para melhorar a interligação dos cuidados de saúde primários com os cuidados hospitalares”.

Os tempos de resposta são também outra das falhas apontadas. “Destaca-se o comportamento incumpridor do tempo de resposta, útil e adequado, para marcação e realização dos meios complementares de diagnóstico e terapêutica e de consultas de especialidade e, ainda, para marcação e realização de cirurgias programadas, no âmbito do Sistema Integrado de Gestão de Inscritos para Cirurgia”, diz o documento. A espera para cirurgias é, porém, um problema comum entre as ULS e os hospitais não integrados neste modelo, com a ERS a destacar que “a percentagem de episódios operados com tempo de espera superior ao tempo máximo de resposta garantida tem vindo a aumentar” em ambos. Já os indicadores relacionados com a segurança do doente são melhores fora das ULS, mas a excelência clínica e instalações são equivalentes dentro e fora das ULS.

A ERS avaliou também as queixas e reclamações dos doentes e encontrou um cenário semelhante entra as ULS e restantes unidades. A excepção vai para as queixas relacionadas com tempos de espera superiores a uma hora, que é um motivo muito mais invocado pelos utentes das ULS. Em termos de quantidade de profissionais de saúde, verificou-se que os hospitais das ULS têm menos recursos do que os hospitais não integrados. Já nos centros de saúde a situação é inversa, sobretudo com os das ULS a contarem com um rácio de enfermeiros superior ao dos médicos.

Os hospitais fora das ULS, entre 2010 e 2013, também conseguiram aumentar mais a proporção de cirurgias realizadas em ambulatório, ou seja, sem necessidade de internar o doente. Nos actos em que foi preciso internamento, os doentes das ULS ficaram mais dias nos hospitais até à alta. Por último, em termos de pagamentos a fornecedores, parece não haver diferenças dentro e fora das ULS, com todas as unidades a derraparem nos prazos legais apesar da “priorização anunciada pelo Governo relativamente a esta matéria”.

Demasiadas entradas pela urgência e cesarianas
A ERS já tinha feito em 2011 um estudo sobre as ULS que apontava para problemas semelhantes. O relatório dessa altura indicava que estas unidades apresentavam “um maior número de consultas realizadas com tempos de espera superiores aos tempos máximos de resposta garantidos e tempos médios e máximos mais elevados entre o pedido de consulta e a data do seu agendamento, em comparação com os hospitais que não pertencem a ULS”. As conclusões apontavam também para que, no que toca ao acesso aos cuidados de saúde primários e hospitalares, “não existem, em termos legais e práticos, diferenças nos procedimentos adoptados no seio das unidades locais de saúde face aos demais estabelecimentos do SNS”.

As falhas nas ULS também tinham já sido referidas no final de 2014 nas conclusões do trabalho Portugal Top 5 – A Excelência dos Hospitais, realizado pela consultora multinacional de origem espanhola IASIST. O estudo alertava que a maior parte dos doentes internados nos hospitais continuam a chegar às unidades de saúde através das urgências, quando as doenças já estão bastante descompensadas.

Nos 41 hospitais do Serviço Nacional de Saúde esta situação variava, em média, entre os 60% e os 75% — sendo o pior valor registado precisamente nas ULS e o melhor nos grandes centros hospitalares. “O modelo das ULS continua a fazer sentido, mas agora só utiliza o nome. O essencial da questão é que estas unidades não têm um comportamento ajustado a uma estrutura integrada. São apenas um somatório de serviços”, explicava na altura o director-geral da IASIST, Manuel Delgado. A demora média no internamento nas ULS era outro dos problemas apontados, assim como a elevada taxa de cesarianas.