E quando chegar o último dia?

Como será quando chegar o último dia? Ninguém gosta de finais, ainda para mais se formos a personagem central da história.

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Tuncay / Flickr

A uma hora insuspeita, numa rua despovoada, ouvi alguém perguntar isto a outrém: o que farias se só tivesses mais vinte e quatro horas de vida? A pergunta não me era dirigida, mas armei-me em presunçoso e repeti-a em voz alta, só que baixinho, não fosse alguém ouvir. O que farias tu se soubesses que só te restam mil, quatrocentos e quarenta minutos em cima deste planeta?

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A uma hora insuspeita, numa rua despovoada, ouvi alguém perguntar isto a outrém: o que farias se só tivesses mais vinte e quatro horas de vida? A pergunta não me era dirigida, mas armei-me em presunçoso e repeti-a em voz alta, só que baixinho, não fosse alguém ouvir. O que farias tu se soubesses que só te restam mil, quatrocentos e quarenta minutos em cima deste planeta?

Este é um daqueles quadros condicionais que são convenientes à alma que se sente perdida, que não se sabe mapear por entre as ventanias das horas confusas. É com indagações deste género que se compreendem as mecânicas das prioridades, as valências que se nos impõem em situações limite. Quem vale mais?, quem vence os campeonatos do amor?, quem pode ser dispensado da nossa resquícia atenção?, como fazer uso do tempo.

Ah sim, o tempo. Muitos de nós queixam-se do dinheiro (ou da falta dele) mas pouco nota no tempo e exponencial escassez. Se calhar devíamos queixar-nos tanto dos impostos como das pessoas que nos interrompem os raciocínios e as acções ou não nos autorizam a fazer o que bem entendermos com a quantidade de segundos com que fomos devidamente guarnecidos. Sim, senhores da Galp Energia que demoram quinze minutos a atender um telefonema, (também) estou a falar convosco.

Pensar no fim assusta. Ninguém gosta de finais, ainda para mais se formos a personagem central da história. Temores à parte, talvez devêssemos ser capazes de ter uma "bucket list" para as últimas horas, só para saborear de novo os prazeres simples que nos ligam ao mundo natural, do qual viemos e ao qual havemos de retornar. Sentir as gotículas do oceano no rosto ou o calor de uma chuva tropical, beijar uns lábios perfeitamente curvilíneos – ah, os lábios, caramba, esses teus lábios -, ouvir crepitar uma lareira reconfortante, deixar derreter o chocolate na língua, ler uma página ao calhas daquele livro que nos arrebatou, escutar de perto aquela canção irrepetível. Como será quando chegar o último dia? E se só tivesses mais vinte e quatro horas nesta Terra?

(Feliz e) Evidentemente, não sabemos qual dos dias será o último. Sobra-nos a alternativa de não esquecer o que nos alimenta as faíscas eléctricas neuronais para que não se chegue ao derradeiro suspiro, numa conclusão de que isto, afinal, de pouco serviu. Já o dizia o mago Bruce Lee: “O fundamental para alcançar a imortalidade é viver uma vida que valha a pena recordar”. Não podemos dar-nos ao luxo de esquecer as vontades que desde sempre nos moldaram. Devíamos erigir monumentos aos nossos sonhos.