Barriga de aluguer e o "Estado-fantoche"
Se aprovasse aquela lei, o Estado seria uma pessoa de bem?
2 – Por estes dias, debate-se e vota-se no Parlamento a lei que pretende criar o acesso de casais inférteis às chamadas “barrigas de aluguer”. Independentemente das questões éticas sobre as quais já muito se falou, importa perceber como funcionará, na prática. tal lei.
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2 – Por estes dias, debate-se e vota-se no Parlamento a lei que pretende criar o acesso de casais inférteis às chamadas “barrigas de aluguer”. Independentemente das questões éticas sobre as quais já muito se falou, importa perceber como funcionará, na prática. tal lei.
A infertilidade de uma mulher é uma dor a que nos curvamos com profundo respeito. Por isso não pactuamos com o que se prepara no Parlamento, a troco dos louros colhidos por alguns partidos ou deputados, que se pretendem “progressistas”.
3 – Feito um contrato (dizem alguns, gratuito) entre o casal que deseja o filho e a mulher que se disporia a ceder o seu útero, iniciar-se-ia a fecundação com óvulos da mãe infértil (por não ter, por exemplo, útero), ou com óvulos da própria mãe de aluguer, ou de terceira mulher. Como a fecundação é in vitro, em qualquer dos casos terá de existir uma estimulação ovária para produção de vários óvulos, naquele ciclo ovulatório (o insucesso da prática é grande). A estimulação, feita por fármacos, não é nada suave; ao invés, traz difíceis perturbações físicas e psíquicas.
4 – Em paralelo, haveria a recolha de sémen em laboratório, feita ao marido do casal. Uma vez fecundado em meio laboratorial, seria implantado o embrião ou embriões. A técnica tem uma taxa de sucesso reduzida; por isso, criam-se vários embriões (seres humanos) que, por não serem todos implantados, são congelados.
5 – A mãe portadora submeter-se-ia então à implantação do embrião. Se tivesse sucesso, estava iniciada a gravidez. Nasceriam então os deveres do casal, tais como o de alimentar e prover a todas as despesas necessárias ao desenrolar daquela gravidez. Durante nove meses, o casal iria fazer tudo o que fosse necessário. E, pela ordem natural da vida, iriam ter contactos pontuais com a mãe gestante, que não deixaria de ter a sua vida pessoal.
6 – Durante esses nove meses, ninguém conhece as emoções, os pensamentos, os gostos e desgostos, as aflições e alegrias que lhe vão no coração da mãe. Durante aqueles nove meses o seu corpo modifica-se muito, a interacção com o bebé é grande, a alteração hormonal é notória e… “não há machado que corte a raiz ao pensamento…” (como diz o poeta).
7 – O parto é um momento de grande exaltação, e, apesar do casal estar presente, quem tem as dores, quem faz a respiração, quem dá à luz é a mãe que gerou o bebé. Nascia uma linda menina! Mas a mãe não a entrega ao casal. Dar à luz muda o pensar daquela mãe.
8 – O casal teria na mão um contrato. Como iria accionar judicialmente aquele contrato? Que protecção dá o Estado àquele casal, que até pode ter dado o óvulo e o sémen para a gestação? O Estado envia os Srs. da GNR para tirar àquele filho a mãe que o gerou e a quem está vinculado? E, se os Srs. da GNR não conseguissem cumprir o mandado, quem indemnizaria este casal?
9 – A infertilidade de um casal é demasiado séria para se brincar com ela. O Estado deve ser uma pessoa de bem. Dir-se-á: “Mas isso acontece?” Sim, acontece! Há centenas/milhares de acções judiciais nos EUA, por via destas práticas.
10 – Para terminar, voltemos ainda ao nosso casal, que agora, sem aquele bebé, sabe que tem mais quatro embriões (seres humanos) que ficaram congelados. O que vai fazer com eles? O Estado tem uma “bolsa de mães portadoras” que possa oferecer-lhe?
11 – Esta lei apresenta-se, no preâmbulo, com a promessa de resolver o problema dos casais inférteis... Se aprovasse aquela lei, o Estado seria uma pessoa de bem? Onde termina a cegueira ideológica? Brincamos com a vida das pessoas fragilizadas?
Advogada