O escândalo sem fim do Brasil chega a Portugal
A operação Lava Jato, que liga os casos “mensalão” e “petrolão”, no Brasil, começou com uma denúncia do empresário Hermes Magnus. Saiba quais são as ligações entre os vários processos judiciais que abalam a política brasileira.
Hermes Freitas Magnus tinha uma empresa, a Dunel, fabricante de componentes industriais, e precisava de capital. José Janene mostrou-se interessado em investir. Parecia um bom negócio. A Dunel tinha clientes importantes (Siemens, Whirlpool, Total Petrochemical). E Janene tinha o dinheiro de que Magnus precisava. Em 2008, pouco tempo depois de começar a sociedade, tudo se precipitou. Magnus começou a desconfiar que Janene não queria investir no negócio, mas apenas “lavar dinheiro”.
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Hermes Freitas Magnus tinha uma empresa, a Dunel, fabricante de componentes industriais, e precisava de capital. José Janene mostrou-se interessado em investir. Parecia um bom negócio. A Dunel tinha clientes importantes (Siemens, Whirlpool, Total Petrochemical). E Janene tinha o dinheiro de que Magnus precisava. Em 2008, pouco tempo depois de começar a sociedade, tudo se precipitou. Magnus começou a desconfiar que Janene não queria investir no negócio, mas apenas “lavar dinheiro”.
A empresa que cedia o capital à Dunel, uma tal de CSA Project Finance, era, afinal, uma “central de negócios escusos”. E Janene, mais do que um simples investidor, era um cacique paranaense do Partido Progressista envolvido no escândalo “mensalão” (uma rede de financiamento ilegal de partidos políticos brasileiros que serviria para pagar votos através de comissões de empresas beneficiadas pelo Governo da altura, liderado por Lula da Silva). Janene era o líder do PP na câmara dos deputados e terá recebido 1,3 milhões de euros no esquema. Foi, no entanto, absolvido no Senado e não chegou a perder o seu mandato. Viria a morrer em 2010, de problemas cardíacos.
Mas assim que Hermes Magnus se apercebeu da intenção de ser usado como “correio” nos negócios entre Janene e outro implicado no “mensalão”, o “doleiro” (negociante ilegal de divisas) Alberto Youssef, comunicou o caso à polícia. Os factos apresentados por Magnus em 2008 só fizeram sentido, para as autoridades brasileiras, no ano passado, quando foi montada a operação Lava Jato.
Em 14 de Março do ano passado, a polícia federal prendeu Youssef. Três dias depois foi a vez de Paulo Roberto Costa, ex-director de Abastecimento da Petrobras (a petrolífera brasileira), ser detido. Ambos passaram a ser “arrependidos” no processo. As empresas de fachada de Youssef – como a que queria investir na empresa de Magnus – movimentaram centenas de milhões de euros, nos últimos anos. Esse dinheiro seria pago por empresas que ganhavam concursos públicos e serviria para comprar favores políticos.
A partir daqui, a polícia chegou ao “petrolão”, um esquema semelhante, mas muito maior. Uma autêntica "aula de crime", como lhe chamou o procurador-geral da República do Brasil, Rodrigo Janot. Os testemunhos dos “arrependidos” chegaram, segundo a imprensa brasileira, a implicar os dois presidentes do PT, Lula da Silva e Dilma Roussef, mas oficialmente os suspeitos são, além de vários empresários, sete senadores, 11 deputados federais, um ministro, um ex-ministro e três governadores. Todos pertencem a três partidos, o PT, o PMDB e o PP e surgem como beneficiados por uma “comissão” de 3% sobre o valor dos contratos celebrados entre a Petrobras e um conjunto de 13 empresas de construção (Camargo Correa, Odebrecht, entre outras).
A pista portuguesa desta operação, que Hermes Magnus aponta na entrevista que deu ao PÚBLICO, já é conhecida das autoridades brasileiras há algum tempo. Nos seus depoimentos, o principal arguido do “mensalão”, Marcos Valério, revelou que esteve em Portugal para obter financiamento partidário, por sugestão de outro arguido, o poderoso chefe da Casa Civil de Lula, José Dirceu (ambos foram condenados pela Justiça). As reuniões em Lisboa tiveram como interlocutores António Mexia, ex-ministro das Obras Públicas, entre 2002 e 2004, e Miguel Horta e Costa, ex-presidente executivo da Portugal Telecom, entre 2002 e 2006. O BES foi implicado por ter participado num negócio deste esquema. Mas Valério entrou em contradições e nenhum dos portugueses foi constituído arguido por falta de provas. Horta e Costa, António Mexia e Ricardo Salgado foram ouvidos pela Justiça brasileira como testemunhas de defesa de José Dirceu, de Marcos Valério, do ex-tesoureiro do Partido Trabalhista Brasileiro (PTB) Emerson Palmieri e do presidente do PT, Roberto Jefferson.