Governo grego não quer dialogar com troika mas sim com a Europa
Atenas vai “tentar convencer os parceiros que é o do interesse da Europa desenhar um novo acordo” e quer realizar uma conferência europeia para discutir a dívida, uma ideia afastada pelo presidente do Eurogrupo.
Jeroen Dijsselbloem e Yanis Varoufakis descreveram como “construtivo” o encontro de cerca de uma hora entre o ministro do novo executivo de esquerda e o “patrão” da zona euro. Mas na conferência de imprensa que se seguiu “quase se sentia a tensão no ar”, escreveu Helena Smith, jornalista do diário britânico The Guardian.
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Jeroen Dijsselbloem e Yanis Varoufakis descreveram como “construtivo” o encontro de cerca de uma hora entre o ministro do novo executivo de esquerda e o “patrão” da zona euro. Mas na conferência de imprensa que se seguiu “quase se sentia a tensão no ar”, escreveu Helena Smith, jornalista do diário britânico The Guardian.
Varoufakis disse que a Grécia quer “dialogar” com a Europa e não com “a delegação da troika” – que deveria viajar em breve para Atenas, para verificar o grau de execução de reformas, antes da transferência dos restantes sete mil milhões de euros do actual programa de assistência financeira.
“Não temos intenção de cooperar com uma comissão de três membros, cujo objectivo é aplicar um programa cuja lógica consideramos antieuropeia”, disse. À saída, aparentemente agastado, Dijsselbloem sussurrou algo ao ouvido de Varoufakis, que não respondeu.
Noutro passo do embate, o ministro grego disse que não seria lógico “criticar o programa e pedir a sua extensão”. Já na quinta-feira, em declarações ao New York Times, declarou: “Não queremos os sete mil milhões, o que queremos é repensar todo o programa.”
Em alternativa, o Governo grego vai “tentar convencer os parceiros que é o do interesse da Europa desenhar um novo acordo”, repetiu esta sexta-feira. A hipótese de realização de uma conferência europeia para discutir a dívida foi afastada por Dijsselbloem. “Já existe o Eurogrupo”, disse, citado pelo jornal grego Kathimerini.
Varoufakis não explicou o que tenciona o Governo grego fazer, caso não seja alcançado um acordo nas próximas quatro semanas. Na falta de entendimento, no curto prazo, coloca-se a questão do acesso da banca grega ao Banco Central Europeu. Quanto à dívida, o país precisará de dez mil milhões de euros para a financiar, mas só no Verão.
Dijsselbloem insistiu que “ignorar os acordos não é o caminho certo” e que a continuação da ajuda europeia depende do cumprimento das obrigações pela Grécia – mas que cabe ao Governo de Atenas definir a sua posição. As duas partes, acrescentou, decidirão os próximos passos, antes de o actual programa de assistência financeira terminar, no final de Fevereiro.
Para Jeroen Dijsselbloem – que antes da reunião de trabalho se tinha reunido com o primeiro-ministro, Alexis Tsipras – é importante não deitar fora o que considera progressos feitos pela Grécia nos últimos anos.
Com o objectivo de sensibilizar os parceiros europeus, logo depois de, no domingo, visitar Chipre – tradicional lugar de destino dos primeiros-ministros –, Tsipras tem deslocações previstas a Roma, na terça-feira, e a Paris, na quarta. Varoufakis estará em Londres no domingo, em Paris na segunda e em Roma, na terça.
Schäuble fala em chantagem
O choque de posições desta sexta-feira confirma as divergências sobre a forma de lidar com a crise entre o novo Governo e as instituições europeias, apesar de, na quinta-feira, Martin Schulz, presidente do Parlamento Europeu, ter saído bem impressionado de um encontro com Tsipras. A Grécia procura “soluções numa base comum” com os parceiros europeus, disse.
Várias medidas anunciadas pelo novo Governo contrariam as políticas de rigor orçamental impostas pela troika de credores nos últimos anos – caso de privatizações de infra-estruturas, aumento do salário mínimo ou a reintegração de funcionários públicos. O mais recente anúncio foi o cancelamento da venda da empresa pública de gás natural, confirmado à Reuters pelo ministro da Energia, Panagiotis Lafazanis. O governante manifestou também oposição a um dos maiores investimentos do país, um projecto canadiano de exploração de ouro da empresa Eldorado Golden.
Os dirigentes das instituições europeias e vários responsáveis governamentais não têm escondido o seu desagrado. O ministro das Finanças alemão, Wolfgang Schäuble, foi um dos últimos a reforçar o coro dos que afastam o cenário de reestruturação da dívida grega. “Sobre esse ponto não há grande coisa a discutir; além disso, é difícil chantagear-nos”, disse.
“[Em contrapartida, se as decisões anteriores forem respeitadas,] estamos dispostos a toda a colaboração e a ser solidários nesse contexto e não em qualquer outro”, acrescentou Schäuble
O vice-presidente da Comissão Europeia, Jyrki Katainen, apelou também à Grécia para se manter no caminho das reformas acordadas com os credores, embora não tivesse excluído a possibilidade de o Governo de Atenas vir a ter mais tempo para fazer algumas reformas.
“Esperamos que cumpram todos os compromissos assumidos”, disse, sublinhando que a Comissão deve garantir que todos os Estados tenham igual tratamento. “Eu não disse que os prazos não devem ser alargados. Eu simplesmente disse que quanto mais cedo a Grécia fizer reformas, mais cedo serão criados novos empregos.”
Alexandre Delaigue, professor de Economia da Academia Militar de Saint-Cyr, disse à AFP que “a probabilidade de um Grexit [uma saída da Grécia do euro] subiu alguns pontos”. “Uma solução onde todos salvem a face está mais distante.”