Accionistas minoritários pedem "monitorização especial" da gestão da Cimpor
Os accionistas Whitebox, Berheim/Dreyfus e Estrela querem que a CMVM acompanhe “a evolução dos processos judiciais” que decorrem no Brasil contra a cimenteira nacional e o seu accionista Camargo Corrêa.
A iniciativa é justificada com a intenção de proteger os interesses dos investidores minoritários da cimenteira portuguesa dominada por capitais brasileiros.
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A iniciativa é justificada com a intenção de proteger os interesses dos investidores minoritários da cimenteira portuguesa dominada por capitais brasileiros.
No final de 2014, os três fundos accionistas da Cimpor, ligados ao hedge fund britânico Whitebox e às sociedades francesa Berheim/Dreyfus e portuguesa Estrela, do ex-presidente do BESI Manuel Serzedelo (que assina a missiva), enviaram uma nova carta à entidade de supervisão liderada por Carlos Tavares a insistir para que defenda os interesses dos accionistas minoritários, junto da administração da cimenteira e da brasileira Camargo Corrêa (que domina a Cimpor).
A acção junto da CMVM inscreve-se no braço-de-ferro que está a ser dirimido nos tribunais e que divide a Whitebox da Cimpor e do seu accionista de controlo. Na carta a que o PÚBLICO teve acesso, os três fundos solicitam agora ao regulador que, para o “exercício dos escassos direitos que lhe são atribuídos”, os esclareça sobre a razão pela qual a Cimpor permanece cotada, pois, na sua óptica, não existem “requisitos legais para a negociação em mercado regulamentado”, dado que as acções “não beneficiam de uma adequada ou ampla dispersão pelo público (que se presume ser em torno de 25%)”, como exigido. A meio da manhã desta segunda-feira, a Cimpor estava a negociar a 97 cêntimos, com um movimento de 8500 acções. O título desvalorizou ao longo de 2014 mais de 61%.
Na estratégia de defesa dos seus interesses accionistas minoritários, os fundos Whitebox, Berheim/Dreyfus e Estrela contestam, entre outras matérias, a qualidade e o grau de transparência dos dados financeiros fornecidos ao mercado pela Camargo Corrêa e pelo conselho de administração da Cimpor liderado pelo advogado Daniel Proença de Carvalho (que inclui a comissão executiva presidida pelo brasileiro Ricardo Lima).
Os minoritários avançam que a informação divulgada pela Cimpor decorre “em tom encomiástico, como se tudo estivesse a correr de feição” e deixa as questões colocadas sem resposta.
Por tudo isto, os accionistas minoritários da Cimpor pedem à CMVM que os informe sobre quais são as consequências para a empresa e os gestores, “designadamente, de natureza sancionatória, pelo facto de não terem sido divulgadas atempadamente ao mercado as transacções de dirigentes, realizadas com accionistas, a preços acima do mercado”. E perguntam a Carlos Tavares se pretende proceder a um "acompanhamento especial das renúncias dos administradores não executivos, em especial, do presidente da Comissão de Auditoria”.
A 26 de Novembro, José Neves Adelino renunciou às funções que desempenhava na empresa enquanto presidente da Comissão de Auditiria e vogal da administração da Cimpor, que exercia desde Abril de 2010.
Os três fundos querem saber ainda o que levou recentemente a Cimpor a “atribuir a uma mesma pessoa as funções de responsável pela comunicação externa e pelas relações com investidores”.
A carta assinada por Simon Waxley (Whitebox), Ami Shabi (Berheim, Dreyfus) e Manuel Serzedelo alerta a CMVM para o facto de a Cimpor “ser ré em acção judicial, relativa a responsabilidade por omissão de prestação de informação completa sobre o elevado nível de dívida (...) e cuja audiência preliminar não se encontra ainda marcada, apesar de a acção ter sido já interposta em Junho de 2013.” E notam, igualmente, que a Camargo Corrêa tem sido alvo de “notícias de processos de natureza criminal, ainda numa fase liminar que, supostamente, envolvem entidades relacionadas com o accionista de controlo da Cimpor.”
Por tudo isto, é pedido à CMVM que proceda a uma “monitorização especial da Cimpor”, motivada “pela conjugação de riscos”, que se deve estender a um acompanhamento da “evolução dos processos judiciais no Brasil, de forma a determinar se existem riscos ou impactos adicionais" para a cimenteira.
Recorde-se que o hedge fund britânico Whitebox adquiriu uma carteira de acções da Cimpor (entre um milhão e dois milhões) a seguir à OPA da Camargo Corrêa/InterCement Áustria na expectativa de valorização da sua posição. Mais tarde, avançou com uma acção judicial contra a Camargo Corrêa e a Cimpor por responsabilidade pelo prospecto de emissão da OPA, alegando omissão do montante de dívida líquida, à volta de 2000 milhões, verba transferida da Camargo Corrêa para a Cimpor.
Em Fevereiro de 2014, o PÚBLICO noticiou que as contas anuais de 2012 e as semestrais de 2013 da Cimpor revelavam um diferencial de 536.500 acções da empresa, resultante de uma transacção que nunca foi objecto de divulgação autónoma ao mercado. A Whitebox pediu à CMVM que investigasse os contornos da aquisição do bloco de acções da Cimpor (quem vendeu e a que preço), concretizada através da InterCement Áustria. O objectivo era obrigar a Camargo Corrêa a revelar o nome das entidades a quem a InterCement Áustria comprou as acções da Cimpor. Mas sobretudo apurar o preço pago pela cimenteira, para que o fundo pudesse concluir (e poder contestar) se houve tratamento preferencial.
A operação polémica, envolvendo a Camargo Corrêa e accionistas minoritários, fundos internacionais e particulares, que não acompanharam a OPA lançada à Cimpor, em Maio de 2012, está relacionada com uma transacção de cerca de 600.000 acções da cimenteira, vendidas (a 21 de Março de 2013) à Camargo Corrêa, abaixo dos 5,5 euros da OPA.