Combater o ódio, defender a liberdade
É preciso não ceder à repugnante chantagem do terror. E transformar o seu ódio na sua derrota.
Pronunciar o nome Charlie Hebdo era, até aqui, razão para sorrir. Pela inteligência e pela coragem das suas sátiras, pela irreverência das suas críticas, pela iconoclastia da sua política editorial que, não poupando ninguém, ajudava os seus leitores a entenderem melhor as falhas do mundo, incentivando-os a corrigi-las. A partir de 7 de Janeiro, falar em Charlie Hebdo é, para além disso, falar também em vingança, assassínio cobarde, crime premeditado não só contra pessoas, mas também contra o espírito de liberdade que elas personificavam e, apesar de muitas terem sido assassinadas, ainda personificam. O luto que agora se abateu sobre o Charlie Hedbo é um luto generalizado que envolve não só os jornalistas, mas também todos aqueles que prezam a liberdade de expressão acima de todas as ameaças e crimes dos que procuram silenciá-la, seja em que nome for.
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Pronunciar o nome Charlie Hebdo era, até aqui, razão para sorrir. Pela inteligência e pela coragem das suas sátiras, pela irreverência das suas críticas, pela iconoclastia da sua política editorial que, não poupando ninguém, ajudava os seus leitores a entenderem melhor as falhas do mundo, incentivando-os a corrigi-las. A partir de 7 de Janeiro, falar em Charlie Hebdo é, para além disso, falar também em vingança, assassínio cobarde, crime premeditado não só contra pessoas, mas também contra o espírito de liberdade que elas personificavam e, apesar de muitas terem sido assassinadas, ainda personificam. O luto que agora se abateu sobre o Charlie Hedbo é um luto generalizado que envolve não só os jornalistas, mas também todos aqueles que prezam a liberdade de expressão acima de todas as ameaças e crimes dos que procuram silenciá-la, seja em que nome for.
“Acto de barbárie excepcional”, como lhe chamou François Hollande, ou “ataque à democracia”, como foi classificado pelo Parlamento português, o mortífero atentado na sede do Charlie Hebdo choca ainda mais por ter ocorrido em pleno coração de Paris, com homens vestidos de negro a disparar Kalashnikov, como num vulgar filme de acção. Christophe Deloire, presidente dos Repórteres Sem Fronteiras, exprimiu da melhor forma esse espanto e choque: “É o tipo de coisas que se vêem no Paquistão ou na Somália, mas em França... É um ataque contra a liberdade de expressão, contra as nossas liberdades.” É verdade, as “nossas liberdades”. No mesmo dia, no Iémen, um atentado com um carro-bomba matou mais de 30 pessoas, ferindo meia centena. Um atentado com marca da Al-Qaeda. O mesmo terror, mas longínquo, com vítimas que não conhecemos e pelas quais o mundo proferirá apenas um ligeiro lamento. Mas o atentado de Paris obriga-nos a parar mais uma vez, como parámos no 11 de Setembro, ou nos atentados terroristas de Madrid ou Londres, porque as vítimas nos são próximas, e sobretudo porque nelas vemos símbolos do que está aqui em causa: a liberdade. Não a “nossa”, mas a dos muitos milhões que a prezam, sem olhar a credos ou fronteiras.
Para os manifestantes xenófobos de Dresden, o miserável atentado de Paris há-de ser visto como um incentivo. Tal como será visto como uma debilidade para os que se lhes opõem. Mas, tal como sucedeu após o 11 de Setembro, é importante não desviar o foco do essencial. E o essencial é a defesa incondicional da liberdade contra o terror, o medo e a violência de toda a espécie de tiranos, islâmicos ou não. Para isso, é fundamental que a condenação de crimes como este seja generalizada e veemente entre todas as comunidades, incluindo as muçulmanas. É preciso mais do que palavras para que a intrusão dos inimigos da liberdade no quotidiano das sociedades actuais, seja em Paris ou no Iémen, esteja definitivamente condenada ao fracasso. É preciso compromissos que não lhes deixem margem para se imporem ao mundo, amordaçando-o. É preciso não ceder à repugnante chantagem do terror. E transformar o seu ódio na sua derrota.