Luís Patrão: o homem de quase todos os primeiros-ministros do PS

Em 1981, perdeu a possibilidade de ser secretário-geral da JS. Uma derrota que sinalizaria o seu percurso político. “Mais low-profile, mais capaz de gerir os corredores do poder, que o haveriam de transformar no chefe de gabinete de algumas das mais influentes figuras do PS.

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Aos 60 anos, o currículo é já extenso. Foi chefe de gabinete de um líder parlamentar (Jaime Gama) e de dois primeiros-ministros - António Guterres e José Sócrates -, director-geral do PS do segundo e secretário de Estado da Administração Interna do primeiro.

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Aos 60 anos, o currículo é já extenso. Foi chefe de gabinete de um líder parlamentar (Jaime Gama) e de dois primeiros-ministros - António Guterres e José Sócrates -, director-geral do PS do segundo e secretário de Estado da Administração Interna do primeiro.

Oito anos depois, regressa aos gabinetes do poder. O novo líder socialista, António Costa, fê-lo regressar aos corredores que tão bem conhece da sede do PS, no Largo do Rato. Que, na opinião, de um dos grandes “homens do aparelho” socialista, Jorge Coelho, ajudou a modernizar.

De todas as escolhas para o novo secretariado nacional - a direcção do principal partido da oposição - Patrão é, por isso, o único que verdadeiramente não pode ser incluído no esforço de renovação que Costa imprimiu após o último Congresso do PS. Com José Sócrates, foi director-geral. Com António Guterres foi quase tudo.  

Jorge Coelho, o combativo apoio desse líder socialista, encara-o como a “pessoa certa” para o pelouro da administração do PS. “Conheço-o desde os tempos em que nos metemos na disputa da liderança do PS com António Guterres [contra Jorge Sampaio]”, recorda.

O ex-ministro das Obras Públicas não hesita em coroá-lo, curiosamente, com o epíteto que durante muitos anos se colou à sua própria pele: “Foi o braço direito [de Guterres] em tudo o que era preciso organizar”. A memória de Coelho só tem elogios para Patrão. “Foi ele que modernizou o PS, que transformou a imagem do PS, que o fez um partido moderno.” Isto nos tempos em que Guterres derrubou o cavaquismo com o lema “Razão e Coração”, depois da Convenção dos “Estados Gerais”.

 A “forte ligação” a Guterres vinha de uma vizinhança beirã que aproximou os dois. Patrão chegou da Covilhã, o ex-primeiro-ministro do Fundão. A proximidade com António Costa firmou-se, no entanto, noutras coordenadas, mais políticas.

Partilharam ambos um secretariado nacional da JS, eleito em Dezembro de 1978. Patrão tinha a pasta do Associativismo. Costa tinha a seu cargo o Ensino Secundário. E para confirmar a regra, Carlos César – eleito agora presidente do PS no Congresso que consagrou o edil de Lisboa – tinha a pasta do Ensino Superior na mesma direcção jota.

Uns anos depois, viria o primeiro sinal do que seria o perfil político de Patrão. Não um líder, mas antes um homem do poder, controlando a rectaguarda e os labirintos dos gabinetes. Em 1981, perdeu a liderança para Margarida Marques, que com Carlos César derrotou uma lista concorrente em que António Costa e Armando Vara apoiavam Patrão.

Desses tempos, Margarida Marques já lhe antevia essa característica. “Era mais low-profile”, afirma a ex-secretária-geral da JS. “No debate político, eu tinha uma atitude mais aguerrida”, lembra desses anos em que a divisão interna no PS se fazia entre o “ex-secretariado e os soaristas”. Patrão foi candidato a secretário-geral, mas Marques nunca acreditou nesse protagonismo: “Ele foi de facto o cabeça de lista, mas a liderança era de António Costa.” 

Esse perfil é, de certa forma, assumido pelo próprio. Ao PÚBLICO, assumiu-se como um servidor da causa pública. “A minha profissão é funcionário público”. Apenas um “técnico superior”, “ligado à Defesa do Consumidor”.

Jorge Coelho diz que ele é mais que isso. “É um trabalhador extraordinário, de grande seriedade e rigor”. Dos tempos guterristas recorda a sua capacidade de “passar os dias todos ali dentro [sede do PS]”.

Margarida Marques destaca ainda a sua “enorme sensibilidade política”. “Não se chega a chefe de gabinete de um primeiro-ministro sem a ter”. Cruzou-se com ele nos primeiros tempos do Governo de Sócrates, quando tinha responsabilidades na REPER, em Lisboa. Viu-lhe a “capacidade de resolver problemas sem criar outros”.

O passar dos anos parece não ter retirado essa ideia de Patrão na nova liderança. Assim que Costa ganhou, Patrão instalou-se no Largo do Rato. Diz quem fez parte da equipa que organizou o último Congresso que se notou o seu dedo no conclave. “Chegaram-lhe os valores dos gastos e, em 10 minutos, matou os gastos”, reconhecia há uns dias uma dirigente do PS.

A gestão das contas socialistas será uma das dores de cabeça de Patrão nos próximos tempos. Pouco tempo depois da vitória de Costa surgiram notícias de uma situação preocupante. São cerca de 10 milhões de euros de passivo. Em 2011, a direcção de Seguro deparou-se com um problema semelhante. Sete milhões de passivo, depois das legislativas que derrotaram Sócrates.

Patrão encara o seu regresso ao PS como uma missão. “O partido não é apenas uma instituição. É uma máquina de disputa eleitoral e o desafio é transformar e melhorar a eficiência da máquina”. 

Cicatrizes do combate político
Como todos os que circulam pelos corredores do poder, o seu currículo dissimula as cicatrizes de longos anos de combate político. Mais uma vez, marcas que resultaram mais da sua proximidade com figuras mais chamativas. Em 2011, foi afastado da presidência do Turismo de Portugal, para onde José Sócrates o tinha nomeado depois de ter sido o seu chefe de gabinete.

Por essa altura, a direita procurava os mínimos sinais de vizinhança com o chamado socratismo para estabelecer exemplos. Tendo sido chefe de gabinete de Sócrates, ainda que apenas durante um ano, era um alvo facilmente identificável. No final desse ano, assumia com estoicismo o seu papel de funcionário público. Quando já muitos jornais anunciavam a sua saída. "Não depende de mim, o que depende é cumprir o meu trabalho a 110% e com muito gosto e com muito sacrifício pessoal às vezes, mas entregando-me a um espírito de missão".

A relação difícil com a direita já vinha de trás. PSD e CDS não lhe deram tréguas durante meses à conta da criação da Fundação para a Prevenção e Segurança. O papel principal na trama foi de Armando Vara. Devido à proximidade com este, foi cozido em lume brando em audições parlamentares até que ambos optaram por apresentar a demissão de secretários de Estado do Governo de António Guterres.

Margarida Marques não tem dúvidas, no entanto, em destacar a sua “enorme dignidade” e comportamento “correctíssimo”. “O que, na política, são qualidades muito importantes”.

Foram feridas políticas que, entretanto, cicatrizaram. A ponto de António Costa chamar Luís Patrão para coordenar a gestão dos funcionários e dos dinheiros socialistas no Largo do Rato. Afinal, Patrão é uma espécie de talismã para os dois líderes socialistas que garantiram as maiores vitórias legislativas ao actual principal partido da oposição. Estava ao lado de Guterres quando este enterrou o cavaquismo. Acompanhava José Sócrates quando este atingiu a única maioria absoluta do PS. Jorge Coelho resume-o numa frase: “António Costa tem a segurança de saber que tem ali alguém a tratar do backoffice com a certeza de que tudo corre bem.”