Atenas prepara-se para um jogo de póquer que pode decidir o futuro do euro

Mercados assustados com cenário de chegada ao poder na Grécia de um governo que diga aos credores que não consegue pagar toda a dívida.

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Banco Central Europeu, liderado por Mario Draghi, reúne-se cinco dias antes das eleições antecipadas na Grécia Kai Pfaffenbach/Reuters

Uma coisa é certa para já: os mercados estão com medo. A prova disso é a subida das taxas de juro da dívida a dez anos da Grécia. Em Julho de 2014 estavam próximas de 6% e agora estão quase a ultrapassar de novo a barreira dos 10%. A que se deve este receio? A explicação está no facto de, quem tem obrigações ou acções gregas, temer que venha a ocorrer com o Syriza uma reestruturação da dívida ou mesmo uma saída da Grécia do euro.

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Uma coisa é certa para já: os mercados estão com medo. A prova disso é a subida das taxas de juro da dívida a dez anos da Grécia. Em Julho de 2014 estavam próximas de 6% e agora estão quase a ultrapassar de novo a barreira dos 10%. A que se deve este receio? A explicação está no facto de, quem tem obrigações ou acções gregas, temer que venha a ocorrer com o Syriza uma reestruturação da dívida ou mesmo uma saída da Grécia do euro.

Nas propostas que tem vindo a apresentar para um futuro Governo, o Syriza elege duas grandes linhas de actuação. A primeira é não aprovar mais medidas de austeridade, recusando por isso aquilo que têm sido as exigências da troika para fechar o actual programa. Pelo contrário, o partido liderado por Alexis Tsipras quer mesmo recuar em algumas das medidas dos últimos anos. Por exemplo, diz que irá repor o valor antigo do salário mínimo nos 750 euros.

A segunda é reestruturar grande parte da dívida pública grega, actualmente situada em 177% do PIB. Os responsáveis do Syriza dizem que reduzir a metade a dívida é o mínimo que é preciso fazer para libertar a economia de uma sobrecarga que não lhe permite crescer. E garantem que será possível fazer isso sem sair do euro.

A estratégia é, com uma negociação agressiva e coordenada com outras forças políticas europeias, convencer os líderes europeus que a única solução viável é começarem a aceitar que não vão poder receber de volta todo o dinheiro que emprestaram à Grécia nos últimos anos.

Para essa negociação, o Syriza planeia apresentar um trunfo de peso: os 240 mil milhões de euros que, nos últimos cinco anos e em dois programas acordados com Atenas, os países da UE e o FMI aceitaram emprestar à Grécia. O que uma Grécia liderada pelo Syriza irá dizer é que, se não for aceite uma reestruturação da dívida e continuarem a serem impostas medidas de austeridade, o que estarão a fazer é a empurrar o país para fora do euro e para a falência descontrolada, em que a troika (incluindo o BCE) se arriscaria a não receber nada de volta. Perante este cenário, para os cofres dos países do euro que emprestaram dinheiro à Grécia, a alternativa de aceitar uma reestruturação de dívida parcial poderia não parecer assim tão pouco atractiva.

O bluff pode falhar
Este é contudo um jogo de póquer bastante arriscado para todos os intervenientes. Um Governo Syriza também teria muito a perder se o jogo lhe corresse mal. Se os líderes europeus não cedessem, continuassem a exigir a Atenas mais austeridade e recusassem qualquer tipo de perdão de dívida, o novo governo grego teria de decidir muito rapidamente se seguiria o caminho cheio de incertezas de uma declaração unilateral de falência.

O problema começaria logo por surgir caso não se chegasse até ao final de Fevereiro a acordo para fechar ou adiar o fim do segundo programa da troika. O Governo liderado por Antonis Samaras não conseguiu concluir a tempo as negociações para o recebimento da última tranche no final deste ano, obtendo apenas um alargamento de dois meses da duração do programa. A Nova Democracia não quis, com o espectro de novas eleições à vista, tomar as novas medidas de austeridade que a troika pedia.

Agora, chegar a um acordo de forma rápida com a troika, que permita avançar depois com um terceiro pacote de financiamento (talvez um programa cautelar), parece um cenário improvável para o próximo Governo. E assim a Grécia arrisca-se, não só a ficar sem a última tranche do empréstimo e sem uma nova linha de crédito, como principalmente a ver os bancos perderem imediatamente o acesso ao financiamento do BCE, que já garantiu que apenas concede empréstimos caso o país esteja sujeito a um programa da troika.

Nas principais capitais europeias, por seu lado, fazem-se as contas ao impacto sobre o resto da zona euro de uma saída forçada da Grécia. Há quem defenda que, ao contrário do que acontecia nos primeiros anos da crise, o efeito de contágio seria agora menor, principalmente porque o sector privado dos diversos países está menos exposto à Grécia. No entanto, seria preciso que o BCE (que se reúne cinco dias antes das eleições) mostrasse sinais de estar pronto a ajudar e os Estados estivessem dispostos a suportar nas suas contas as perdas relacionadas com o default grego. Em todos os casos, é difícil de prever como é que os mercados passariam, depois de um default traumático, a olhar para países com grandes dívidas como a Itália e Espanha.

Com tanto a perder de ambos os lados, permanece a dúvida sobre quem poderá vir a ceder primeiro e a desistir de fazer bluff neste jogo de póquer: se os líderes europeus, se um eventual futuro Governo formado pelo Syriza.