GNR multou condutor de ambulância que parou para reanimação de idosa
Comandante dos Bombeiros de Óbidos frisa que foi a própria equipa que chamou a GNR de Torres Vedras e considera a situação "caricata" e "revoltante". Multa foi entretanto arquivada.
Segundo Carlos Silva, “depois de verificado o óbito da senhora, e nos termos da lei, um dos elementos da equipa chamou a GNR ao local para que se cumprissem as formalidades necessárias ao transporte do cadáver, mas os agentes preferiram identificar todos os elementos da equipa e multar em 120 euros o condutor da ambulância, uma pessoa que estava a fazer serviço voluntário e que agora corre o risco de perder a carta de condução”.
A verdade faz-nos mais fortes
Das guerras aos desastres ambientais, da economia às ameaças epidémicas, quando os dias são de incerteza, o jornalismo do Público torna-se o porto de abrigo para os portugueses que querem pensar melhor. Juntos vemos melhor. Dê força à informação responsável que o ajuda entender o mundo, a pensar e decidir.
Segundo Carlos Silva, “depois de verificado o óbito da senhora, e nos termos da lei, um dos elementos da equipa chamou a GNR ao local para que se cumprissem as formalidades necessárias ao transporte do cadáver, mas os agentes preferiram identificar todos os elementos da equipa e multar em 120 euros o condutor da ambulância, uma pessoa que estava a fazer serviço voluntário e que agora corre o risco de perder a carta de condução”.
“Quando me acordaram, cerca das 4h da manhã, pensei que era um pesadelo. E ainda agora me custa a acreditar que isto tenha acontecido”, comentou esta quarta-feira o comandante dos Bombeiros de Óbidos ao PÚBLICO. Carlos Silva frisou que tanto a direcção da corporação como o próprio Instituto Nacional de Emergência Médica (INEM) “estão já a tomar medidas para que o bombeiro que conduzia a ambulância não seja prejudicado por fazer serviço voluntário e por cumprir a lei”.
Isso mesmo aconteceu já nesta quarta-feira, com a GNR a esclarecer num comunicado enviado às redacções que a multa foi entretanto arquivada “por se ter verificado não existir infracção”. “Depois de terem sido realizadas averiguações internas e ponderada toda a informação disponível sobre as circunstâncias que levaram ao levantamento de um auto de contra-ordenação, a Guarda Nacional Republicana informa que o expediente em apreço vai ser arquivado, por se ter verificado não existir infracção”, lê-se na curta nota enviada já ao final da tarde.
O comandante da corporação de Óbidos confirmou ao PÚBLICO que, tal como é relatado na edição desta quarta-feira do Correio da Manhã, os bombeiros foram accionados às 2h06 para transportar uma doente, com um enfarte agudo do miocárdio, do Hospital de Caldas da Rainha para o de Santa Maria, em Lisboa. Foi durante o trajecto, pouco antes de Torres Vedras, que face ao agravamento do estado de saúde da idosa, a equipa decidiu sair da faixa de rodagem e parar o carro na berma da auto-estrada, para que o médico e a enfermeira que faziam parte da tripulação procedessem a manobras de reanimação.
“A lei determina que os veículos prioritários podem não cumprir as regras quando tal se justifica. E não consigo imaginar melhor fundamentação do que a tentativa de salvar a vida de uma pessoa”, frisou o comandante. Assegura que a presença da ambulância estava devidamente garantida pelos sinais luminosos e que a segurança foi de imediato reforçada por uma viatura da concessionária da auto-estrada, que reforçou a sinalização”.
Multa justificada com infracção ao Código da Estrada
Em situações em que um médico não acompanha os doentes, os bombeiros não têm capacidade para declarar o óbito e são obrigados a manter as manobras de reanimação até chegar a um hospital. Não foi o caso, disse Carlos Silva. “Estava lá um médico e a partir do momento em que aquele atesta a morte, o cadáver não pode ser removido sem autorização do Ministério Público”, explicou. Assim, um elemento da própria tripulação da ambulância chamou a GNR, para proceder aos formalismos necessários.
O comandante dos bombeiros diz que “o bom senso ditaria que se fizesse aquilo que a GNR veio a fazer, mais de uma hora depois e de toda a confusão”: "Verificar o local preciso em que ocorreu a morte e acompanhar a ambulância até à saída mais próxima da auto-estrada". O corpo só poderia sair dali, indicou, num veículo próprio para o transporte de cadáveres, para o Instituto de Medicina Legal.
“Acontece que o que se verificou de início foi muito diferente e, que eu saiba, nunca visto. Quando chegaram, os agentes da autoridade nem sequer quiseram saber do cadáver. Puseram-se a identificar todos os elementos e multaram o motorista com o argumento de que tinha cometido uma infracção ao parar na auto-estrada”, conta o comandante dos Bombeiros de Óbidos.
Em declarações ao Correio da Manhã, o comandante da GNR de Torres Vedras afirmou que a multa foi aplicada porque "foi infringido o Código da Estrada por paragem na berma da auto-estrada sem motivos justificativos". Terá ainda comentado que durante as manobras de reanimação "percebia-se a situação", mas depois de a vítima falecer, "a ambulância já não devia estar parada na berma, onde era proibido. Devia ter saído num ramal de acesso", porque ali poderia causar acidentes, indicou ao mesmo jornal.
Segundo Carlos Silva, tanto a direcção daquela corporação de bombeiros como responsáveis do INEM enviaram já uma exposição aos ministérios da Saúde e da Administração Interna, pedindo a sua intervenção e a anulação da multa e do registo da infracção de trânsito que, na sua perspectiva, não foi cometida.
Notícia actualizada às 19h11: acrescenta comunicado da GNR sobre a decisão de arquivar a multa.