Intervenção das autoridades russas abranda, mas não pára queda do rublo
Utilização das reservas para defender o rublo é ainda vista como insuficiente para impedir o medo dos russos de perda repentina do seu poder de compra.
Depois de uma depreciação de mais de 20% face ao dólar na segunda e terça-feira que colocou as perdas desde o início do ano acima de 50%, a divisa russa registou esta quarta-feira uma recuperação temporária no começo do dia que acabou por se transformar ao início da tarde numa nova, mas ligeira, descida. Face ao dólar, de acordo com os dados da Reuters, o rublo caía 1,6% relativamente ao dia anterior (um dólar era trocado por 68,58 rublos). Face ao euro, a descida era de 0,3% (um euro por 85,4 rublos).
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Depois de uma depreciação de mais de 20% face ao dólar na segunda e terça-feira que colocou as perdas desde o início do ano acima de 50%, a divisa russa registou esta quarta-feira uma recuperação temporária no começo do dia que acabou por se transformar ao início da tarde numa nova, mas ligeira, descida. Face ao dólar, de acordo com os dados da Reuters, o rublo caía 1,6% relativamente ao dia anterior (um dólar era trocado por 68,58 rublos). Face ao euro, a descida era de 0,3% (um euro por 85,4 rublos).
A recuperação inicial foi vista pelos analistas como uma resposta às decisões entretanto tomadas pelas autoridades. No dia anterior, o banco central tinha subida a sua taxa de juro de referência de 10,5% para 17%, ao passo que o Ministério das Finanças tinha indicado que iria utilizar as suas reservas de divisas estrangeiras para comprar rublos no mercado.
Estas duas acções têm como intenção convencer empresas e particulares russos a não trocarem os seus rublos por divisas estrangeiras, um movimento que tem sido muito evidente nos últimos dias, à medida que aumenta o receio na população de que se venha a assistir a uma situação idêntica à vivida na Rússia em 1998.
Nessa altura, o rublo depreciou-se fortemente, os preços (especialmente dos produtos importados) dispararam e os russos que tinham a sua própria divisa nas mãos perderam o seu poder de compra a um ritmo assustador.
Atingida por uma tempestade perfeita de queda dos preços do petróleo, quebra de confiança nas empresas e sanções dos Estados Unidos e da UE, a economia russa vive agora uma situação semelhante. A queda de mais de 50% do rublo face ao dólar já levou várias empresas estrangeiras, com a Apple, a McDonalds ou a Samsung, a subir durante o último mês os preços dos seus produtos em rublos. De acordo com a Bloomberg, um iPhone 6 passou de 31.990 rublos em Novembro para 39.990 rublos agora, um acréscimo de 25%. O Big Mac subiu de 92 para 94 rublos e o Galaxy Note 4 ficou 14% mais caro. A expectativa é que estas sejam apenas as primeiras actualizações num cenário generalizado de escalada dos preços.
Para além disso, com a subida das taxas de juro, torna-se cada vez mais provável a queda da economia numa recessão profunda, com mais empresas em falência, descida dos salários reais e aumento do desemprego. Tudo num cenário em que as contas públicas sofrem com a perda de receitas de petróleo.
Banco central criticado
Depois da crise de 1998, as autoridades russas tiveram como prioridade a criação de mecanismos de segurança que impedissem situações idênticas no futuro, nomeadamente com a acumulação de reservas cambiais e de ouro muito significativas. De momento, contudo, parece não haver uma grande capacidade para travar os movimentos dos mercados.
Este ano, o banco central russo utilizou, de acordo com os últimos dados disponíveis, 87 mil milhões das suas reservas de divisas estrangeiras para comprar rublos nos mercados e assim travar a depreciação da moeda. No total, o banco dispunha antes destas vendas de reservas estimadas 416 mil milhões de euros.
Até Setembro, estavam em vigor intervalos para a variação diária do rublo que forçavam o banco central a actuar no mercado. No entanto, a autoridade monetária decidiu eliminar esses intervalos, deixando o rublo flutuar livremente de acordo com a vontade do mercado. Agora parece sentir dificuldade em travar a queda da divisa.
No último mês terá usado dez mil milhões de dólares de reservas, mas são cada vez mais as críticas à actuação do banco central. Os analistas do banco russo Zenit publicaram uma nota em que defendem que, “em contraste com a situação em 2008-2009, o mercado não tem a certeza de que o banco central sairá em defesa do rublo a um preço firme”.
Do lado do Governo, na manhã desta quarta-feira, houve o anúncio de utilização das suas próprias reservas. No entanto, o seu valor total é estimado em apenas sete mil milhões de euros.
Nos mercados adivinha-se que, em caso de nova deterioração da situação, o banco central será forçado a intervir e a possivelmente vender as suas reservas de ouro, que nos últimos nove anos triplicaram.
Efeitos de contágio
A crise russa está a ter um impacto significativo nos mercados internacionais, especialmente nas outras economias emergentes.
Os investidores temem que estejamos perante uma situação semelhante à registada em 1998, quando a crise financeira russa acabou por ter um impacto negativo severo na generalidade das economias emergentes, com os efeitos a serem também sentidos nos países mais desenvolvidos. A situação actual agrava-se ainda pelo facto de, em simultâneo, se assistir a uma queda acentuada dos preços do petróleo que, para além da Rússia, afectam outras economias emergentes produtoras de crude.
Outro factor de incerteza nos mercados é o final da última reunião do ano da Reserva Federal, esperando-se que a autoridade monetária norte-americana dê mais um passo na retirada das medidas expansionistas que tem vindo a pôr em prática desde o início da crise financeira internacional em 2008. Nos mercados existe a expectativa que, apesar da situação de incerteza que se vive actualmente nos mercados, a Fed vai dar sinais de que já está a começar a preparar uma futura subida de taxas de juro. Mais uma vez, os mercados temem que esse cenário possa afectar as economias emergentes.
Por último, esta quarta-feira realiza-se a primeira votação no Parlamento grego para a eleição de um presidente. O mais provável é que não seja possível chegar à maioria exigida pela lei, adiando para próximas votações uma decisão final. Se depois de mais duas tentativas o Parlamento não conseguir chegar a acordo para a eleição de um presidente, terão de ser marcadas eleições legislativas antecipadas, algo que tem vindo a constituir uma preocupação para os investidores internacionais.