As cidades e as trocas

Entre estreias nacionais e filmes repescados, a edição inaugural do Porto/Post/Doc propõe uma programação inteligentíssima que funciona num espírito de intercâmbio.

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Obviamente, há um factor geográfico importante – levar ao Porto os filmes que, até aqui, só Lisboa via – mas também é verdade que há muitos filmes na programação do Porto/Post/Doc que Lisboa não viu. É o caso da abertura oficial com Concerning Violence, do sueco Goran Hugo Olsson (sábado, 6, no Rivoli), que sucede à sua muito falada Black Power Mixtape com uma nova exploração de imagens de arquivo da televisão sueca. O alvo, aqui, são os movimentos da independência na África pós-colonial dos anos 1970 (Angola e Moçambique incluídos), justapostos aos escritos de Frantz Fanon, com Lauryn Hill como narradora – constitui um dos filmes da secção paralela Persona, sobre temas quentes tratados de modo não-televisivo, que marca o Dia Internacional dos Direitos Humanos, 10 de Dezembro, com a estreia de Dreamocracy, documentário a quatro mãos assinado pela portuguesa Raquel Freire e pela francesa Valérie Mitteaux, à volta do novo activismo engajado que a crise económica veio impulsionar (4.ª, 10, no Rivoli). Também João Pedro Rodrigues e João Rui Guerra da Mata escolheram o novo festival para estrear a curta documental com que sucedem ao díptico Alvorada Vermelha/A Última Vez que Vi Macau, IEC Long (5.ª, 11, no Rivoli).

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Obviamente, há um factor geográfico importante – levar ao Porto os filmes que, até aqui, só Lisboa via – mas também é verdade que há muitos filmes na programação do Porto/Post/Doc que Lisboa não viu. É o caso da abertura oficial com Concerning Violence, do sueco Goran Hugo Olsson (sábado, 6, no Rivoli), que sucede à sua muito falada Black Power Mixtape com uma nova exploração de imagens de arquivo da televisão sueca. O alvo, aqui, são os movimentos da independência na África pós-colonial dos anos 1970 (Angola e Moçambique incluídos), justapostos aos escritos de Frantz Fanon, com Lauryn Hill como narradora – constitui um dos filmes da secção paralela Persona, sobre temas quentes tratados de modo não-televisivo, que marca o Dia Internacional dos Direitos Humanos, 10 de Dezembro, com a estreia de Dreamocracy, documentário a quatro mãos assinado pela portuguesa Raquel Freire e pela francesa Valérie Mitteaux, à volta do novo activismo engajado que a crise económica veio impulsionar (4.ª, 10, no Rivoli). Também João Pedro Rodrigues e João Rui Guerra da Mata escolheram o novo festival para estrear a curta documental com que sucedem ao díptico Alvorada Vermelha/A Última Vez que Vi Macau, IEC Long (5.ª, 11, no Rivoli).

Talvez o mais incontornável de todos os “exclusivos” do Porto/Post/Doc seja L'Abri (domingo, 7, e 4.ª, 10, sempre no Rivoli), a mais recente visita de Fernand Melgar ao modo como os mecanismos institucionais suíços lidam com a emigração ilegal, depois de La Forteresse e Vol Spécial. Como o título diz, L'Abri gira à volta de um abrigo de Lausanne. E retrata-o como espelho de um sistema à beira da ruptura, onde a ideia de “liberdade, igualdade e fraternidade” esbarra numa burocracia cega que não é capaz de entender esses conceitos como questões práticas, embora os invoque constantemente para justificar as suas leis.

L'Abri é um dos 12 títulos a concurso na selecção oficial, entre os quais um outro “exclusivo” a merecer atenção: Storm Children – Book One, do filipino Lav Diaz (sábado, 6, e 6.ª, sempre no Rivoli), vencedor do Leopardo de Ouro em Locarno este ano (onde L'Abri teve a sua estreia mundial) com From What Is Before. Aqui se revela um dos “diálogos” possíveis abertos pelo Porto/Post/Doc, que tem à frente do júri o crítico canadiano Mark Peranson, um dos programadores de Locarno, onde Songs from the North, o olhar “de dentro” visto de fora sobre a Coreia do Norte por Soon-mi Yoo, ganhou melhor Primeira Obra. Outros diálogos mostram-se na “carta branca” dada a festivais de espírito semelhante – na edição inaugural, o Porto dialoga com Copenhaga e Marselha, cujos CPH:DOX e FIDMarseille, dois dos pontos de paragem obrigatórios no actual circuito dos cinemas do real, propõem uma escolha de filmes. Uma terceira carta branca faz a ponte com Nova Iorque e com o crítico Dennis Lim, um dos programadores do New York Film Festival e do Lincoln Film Center.

E, sem que esse diálogo seja explícito, há um vaivém com o DocLisboa, da qual cerca de uma dezena de títulos é repescada para múltiplas secções do Porto/Post/Doc. A secção competitiva inclui o vencedor da competição nacional (Volta à Terra, de João Pedro Plácido) e o Grande Prémio do Júri (Letters to Max, de Éric Baudelaire), mas também Our Terrible Country, de Mohammad Ali e Ziad Homsi, uma perturbante viagem à Síria contemporânea que o Doc mostrou numa das secções paralelas. Por onde se quiser ver, portanto, o Porto/Post/Doc não existe isolado do que o rodeia – e está aberto ao mundo à sua volta.