Memórias de uma cidade-símbolo

Na sua brevidade, os 13 segmentos de Pontes de Sarajevo nunca deixam de parecer apenas o prólogo de um filme que nunca chega a acontecer.

i-video

O filme colectivo, o filme de sketches, já foi uma prática muito popular — sobretudo no cinema europeu, nos anos 50 e 60 — e entretanto caiu em desuso, provavelmente por boas razões. A unidade temática raramente é suficiente para cobrir as derivas estilísticas e, forçosamente, qualitativas, que deixam sempre a sensação de desequilíbrio e fazem com que os filmes funcionem, a cada entrada de novo sketch, numa espécie de pára-arranca sucessivo. 

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O filme colectivo, o filme de sketches, já foi uma prática muito popular — sobretudo no cinema europeu, nos anos 50 e 60 — e entretanto caiu em desuso, provavelmente por boas razões. A unidade temática raramente é suficiente para cobrir as derivas estilísticas e, forçosamente, qualitativas, que deixam sempre a sensação de desequilíbrio e fazem com que os filmes funcionem, a cada entrada de novo sketch, numa espécie de pára-arranca sucessivo. 

Pontes de Sarajevo

 não evita isto, e mesmo os melhores filmes do conjunto deixam um travo de insatisfação, como se a sua brevidade os impedisse de serem mais do que o prólogo para qualquer coisa que nunca chega a acontecer. Entre os 13 convocados há um gigante absoluto, Jean-Luc Godard, que para mais desde os anos 90 (

Je Vous Salue Sarajevo

, uma curta-metragem feita ainda em plena guerra) elegeu o simbolismo de Sarajevo como um tema recorrente em muito do que realizou desde então. O seu contributo é uma espécie de 

pot-pourri 

de elementos já vistos na sua obra recente, montagem ou remontagem feita com o brilhantismo poético e teórico habitual nele, mas que francamente pouco ou nada acrescenta a tudo o que já disse (e, repete-se, foi muito) sobre o “assunto Sarajevo”. Assunto que, com excepção dos primeiros 

sketches 

(algo penosas evocações da Primeira Guerra Mundial), é para a maioria dos episódios a questão da guerra da Jugoslávia, nos anos 90.

O mais simples e mais eficaz é o episódio do ucraniano Sergei Loznitsa: fotografias do tempo do cerco sobrepostas a planos das ruas de Sarajevo, presumivelmente filmados agora, sempre a preto e branco. O mais irónico e ambíguo é o segmento de Cristi Puiu, um só longo plano de um casal na cama a discutir casualmente a Primeira Guerra Mundial, os Balcãs, os húngaros, os judeus, a Sérvia, a Roménia, e que depois apaga a luz e vai dormir — sabe a pouco, mas é bem Puiu, é bem “nova vaga romena”. Há dois contributos portugueses: o de Luís da Matta Almeida, que assina com o belga François Schuiten as pequenas animações que “ligam” os episódios uns aos outros, e o de Teresa Villaverde, que transpõe alguns elementos do seu universo (uma história de mãe e filha) para uma Sarajevo nocturna, captada em planos bonitos e elegantes.