Uma casa com muita política e muitas clientelas
Entre os cerca de 5000 funcionários da Santa Casa, e principalmente entre os seus quadros superiores, muitos são os que, trazidos pelas sucessivas administrações, foram deixados como herança para a administração seguinte.
A contabilidade, porém, não é fácil de fazer. E não faltam nomes e casos recordados pelos que apontam o dedo aos anteriores provedores, desde Maria José Nogueira Pinto, para não ir mais longe, até ao socialista Rui Cunha, que deixou a casa em 2011.
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A contabilidade, porém, não é fácil de fazer. E não faltam nomes e casos recordados pelos que apontam o dedo aos anteriores provedores, desde Maria José Nogueira Pinto, para não ir mais longe, até ao socialista Rui Cunha, que deixou a casa em 2011.
Há sempre maridos e mulheres, filhos, sobrinhos, correlegionários políticos, normalmente gente que entra a prazo e acaba por ficar nos quadros. E sempre engrossando as hostes de uns e de outros, e por vezes as prateleiras onde parte deles fica à espera que o Governo mude.
No mandato actual destacam-se as equipas trazidas pelo próprio provedor e por Helena Lopes da Costa. Nenhum deles nega o facto de se ter rodeado de pessoas da sua confiança pessoal, coisa que consideram normal e necessário. Mas ambos apontam também nomes de responsáveis por si nomeados, ou reconduzidos, com os quais nada têm a ver em termos políticos ou pessoais.
No caso de Santana Lopes, sobre cujas contratações o PÚBLICO já se debruçou anteriormente, avultam os seus antigos colaboradores nas Câmaras da Figueira da Foz e de Lisboa. Quanto à primeira, um dos casos mais notado é o do ex-líder local do PSD, Lídio Lopes, que o provedor trouxe para a Santa Casa para se ocupar da área da segurança.
Na verdade, o antigo vereador da Figueira — que também tem um caso na Justiça por causa de uma licenciatura cuja autenticidade oferece dúvidas — veio tomar conta dos transportes e da logística e é hoje sub-director da qualidade e inovação.
Uma das suas iniciativas foi o aluguer, que Santana Lopes garante não ter qualquer irregularidade do ponto de vista processual, a uma empresa da Figueira da Foz, a Gesfrota, de um sistema de localização por GPS para 140 viaturas da Misericórdia (63.304 euros).
O principal dono da empresa aparece em vários documentos públicos como sendo um dos seis accionistas de uma outra sociedade anónima da Figueira da Foz, que se dedica a um outro ramo de negócio, e cuja assembleia geral é presidida por Santana Lopes. O actual provedor assegurou porém ao PÚBLICO que nunca conheceu o empresário em questão e que, segundo lhe foi dito pelos actuais accionistas, o mesmo teve em tempos uma pequena participação na sociedade, mas já a vendeu há muitos anos.
Um outra área onde o provedor foi também recrutar alguns dos seus colaboradores é a das suas relações profissionais e partidárias. O nome mais próximo é o de Paulo Calado, ex-vereador do PSD em Setúbal, que é sócio da sociedade de advogados Global Lawyers, criada por Santana Lopes.
Na Direcção de Aprovisionamento, logo abaixo de Irene Nunes Barata, seu antigo braço direito na Câmara de Lisboa, foi também colocada uma jovem jurista irmã de uma sócia de Santana Lopes em duas empresas de consultoria por ele criadas, uma delas com sede em Moçambique.
Trata-se de Carla Neto, cuja irmã, Vânia Neto, casada com Ricardo Gonçalves, presidente da Câmara de Santarém (PSD), é sócia de Santana na Link Think e na Link Think Moçambique.
No caso de Helena Lopes da Costa, vários dos seus colaboradores têm ligações ao PSD de Oeiras, cuja assembleia de secção é presidida por ela própria. Sara Santos, uma jurista que já foi vereadora do PSD na Câmara de Lisboa (na oposição), é casada com Ângelo Pereira, o presidente da Comissão Política dos social-democratas de Oeiras.
Nuno Custódio, vogal do mesmo órgão e ex-assessor da Câmara de Oeiras, é o director da unidade de aprovisionamento do Hospital Ortopédico de Santana. Sónia Oliveira, também vogal da comissão política de Oeiras, foi nomeada assessora da direcção da Escola de Saúde do Alcoitão. Igualmente colocada no Hospital de Santana, como directora financeira, foi Dora Ramos, uma economista casada com João Montenegro, assessor de Passos Coelho.
Helena Lopes da Costa, no entanto, garantiu ao PÚBLICO que não convidou ninguém para a Misericórdia por razões políticas. “Naturalmente que são pessoas da minha confiança. Mas eu não faço qualquer diferenciação das pessoas em função dos partidos e mantive nos seus lugares todos aqueles que estão ligados a outros partidos”, diz a administradora com o pelouro da saúde.
A antiga deputada insiste em que foram “apenas razões profissionais” que determinaram a entrada na SCML de todos os que convidou. E garante que se trata de um número ínfimo de pessoas, face ao número de funcionários do sector da Saúde. No total a Misericórdia emprega cerca de cinco mil pessoas.