Afinal, parece que a maioria das nossas fantasias sexuais é banal

Muitas fantasias sexuais consideradas atípicas ou invulgares são na realidade frequentes – e, por isso, não devem ser logo consideradas desviantes ou patológicas, conclui estudo canadiano.

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Mesmo as fantasias mais invulgares não são necessariamente patológicas Nuno Ferreira Santos

Mas então, o que é ao certo uma fantasia sexual atípica ou invulgar? Para tentar responder cientificamente a esta pergunta, Christian Joyal, da Universidade de Montreal (Canadá), e colegas realizaram um estudo – um dos primeiros do género a ser feitos junto da população geral (e não, por exemplo, de estudantes universitários). Os seus resultados foram publicados online, na passada sexta-feira, na revista Journal of Sexual Medicine.

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Mas então, o que é ao certo uma fantasia sexual atípica ou invulgar? Para tentar responder cientificamente a esta pergunta, Christian Joyal, da Universidade de Montreal (Canadá), e colegas realizaram um estudo – um dos primeiros do género a ser feitos junto da população geral (e não, por exemplo, de estudantes universitários). Os seus resultados foram publicados online, na passada sexta-feira, na revista Journal of Sexual Medicine.

Diga-se antes de mais que, para definir as chamadas parafilias – ou desvios do desejo sexual –, o Manual de Diagnóstico e Estatística das Perturbações Mentais (DSM, a “bíblia” norte-americana das doenças psiquiátricas) e a Organização Mundial da Saúde falam em desejos sexuais “atípicos” e “invulgares”.

Porém, segundo os autores do estudo, nunca é dito claramente o que são ao certo esses desejos. E de facto, argumentam, a fronteira entre o “normal” e o patológico nunca foi devidamente delineada.

“As fantasias sexuais são geralmente definidas como sendo quaisquer imagens mentais que excitem sexualmente ou que sejam eróticas para a pessoa”, escrevem os cientistas.

“Do ponto de vista clínico, determinar se uma fantasia sexual – invulgar ou não – constitui uma perturbação mental é bastante simples: tem de ser obrigatória, compulsiva e/ou resultar numa disfunção sexual ou numa perturbação da pessoa”, escrevem ainda. “Do ponto de vista legal, um interesse sexual de ordem criminal implica claramente o facto de o parceiro sexual não consentir ou ser menor de idade. Mas para além disso, o que é exactamente uma fantasia sexual invulgar?”

Daí que o objectivo principal do estudo tenha sido “conseguir especificar normas em termos de fantasias sexuais, uma etapa essencial na definição das patologias”, diz Christian Joyal em comunicado da sua universidade.

O estudo consistiu em pedir a 1517 adultos residentes no Quebeque – 799 homens e 718 mulheres (média de idade 30 anos) para responder a um questionário sobre as suas fantasias sexuais. Em particular, os participantes tinham de atribuir uma nota de 1 a 7 – nada interessado(a) a fortemente interessado(a) – a 55 fantasias sexuais diferentes. “Como suspeitávamos”, diz Joyal, “existem muito mais fantasias sexuais comuns do que fantasias atípicas”. 

Os resultados revelaram que apenas duas fantasias sexuais eram estatisticamente raras (obtiveram menos de 2,3% de adesão dos participantes): sexo com crianças com menos de 12 anos e sexo com animais. Nove outras fantasias eram estatisticamente invulgares (menos de 16% dos participantes interessados): para as mulheres, consistiam em urinar sobre o parceiro ou vice-versa (a chamada “chuva dourada”), vestir roupa do sexo oposto, obrigar alguém a ter sexo, abusar de uma pessoa bêbeda, adormecida ou inconsciente, fazer sexo com uma prostituta ou com mulheres com seios muito pequenos; e para os homens, em urinar sobre o parceiro ou vice-versa, ter sexo com dois, três ou mais homens.”

De uma maneira geral, os resultados mostram, lê-se no comunicado, que poucas fantasias sexuais podem ser consideradas estatisticamente raras ou invulgares.

O estudo confirma ainda que os homens têm mais fantasias do que as mulheres, mas por outro lado mostra que até dois terços das mulheres evocam temas associados com a submissão (ser amarrada, espancada ou obrigada a ter sexo).

Porém, as mulheres distinguem muito bem entre fantasia e desejo, algo que não acontece no caso dos homens. “Muitas das mulheres que exprimem fantasias extremas de submissão (dominação por um desconhecido, por exemplo) especificam que não querem de todo que elas se tornem realidade. Pelo contrário, a maioria dos homens gostaria muito de ver as suas fantasias realizarem-se”, lê-se ainda no comunicado.

Globalmente, escrevem os autores, muitas fantasias sexuais são típicas ou comuns. Diga-se já agora que as fantasias típicas (que suscitaram o interesse de mais de 84% dos participantes) tinham a ver com sentimentos amorosos durante a relação sexual, atmosferas ou locais românticos, sexo oral ou, para os homens, relações com duas mulheres ao mesmo tempo.

Por isso, concluem os autores, os médicos e os especialistas em geral não deveriam basear-se apenas no tema de uma fantasia sexual para determinar se ela é patológica ou invulgar. “É preciso ser prudente antes de classificar uma fantasia sexual como invulgar, já para não falar em desviante”, concluem no seu artigo. E sugerem que “o diagnóstico deve focar-se no efeito de uma fantasia sexual e não no seu conteúdo”.