Novo partido espanhol ameaça acabar com o bipartidarismo e até ganhar eleições

Os analistas sublinham os factores conjunturais, como os casos de corrupção no PP. Mais cuidadosos ainda são os membros do Podemos, quase todos professores de Política. Estes potenciais eleitores ainda podem fugir, mas 20% deles não votaram em 2011.

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Os jornais espanhóis descrevem o “choque” que se vive por estes dias no interior do Governo. À sondagem divulgada neste domingo, e realizada pela empresa Metroscopia para o El País, somam-se as informações que têm escapado sobre o grande inquérito do Centro de Investigações Sociológicas (CIS), aguardado para daqui a uns dias, e que deverão apontar no mesmo sentido.

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Os jornais espanhóis descrevem o “choque” que se vive por estes dias no interior do Governo. À sondagem divulgada neste domingo, e realizada pela empresa Metroscopia para o El País, somam-se as informações que têm escapado sobre o grande inquérito do Centro de Investigações Sociológicas (CIS), aguardado para daqui a uns dias, e que deverão apontar no mesmo sentido.

Não é só o partido Podemos que aparece à frente dos dois partidos da alternância – Pablo Iglesias é o líder mais valorizado, o único dos sete dirigentes de partidos políticos que integram a sondagem a conseguir nota positiva (mais aprovações do que desaprovações). O pior avaliado é naturalmente Rajoy (com -63) e o segundo melhor o recém-eleito líder socialista, Pedro Sánchez.

Apesar de não conseguirem manter os 28,7% de votos que tiveram nas últimas eleições nacionais, em 2011, e de serem arrastados pelo afundamento do bipartidarismo, os socialistas aguentam muito melhor o embate com o Podemos do que o PP. Uma das razões é precisamente Sánchez, que obtém muito bons resultados entre os eleitores socialistas: 75% acredita que vai ser capaz de mudar o partido e 72% que poderá recuperar antigos votantes.

Os analistas avisam que é preciso ter cuidado com estes resultados e sublinham os factores conjunturais, nomeadamente a série de casos de corrupção que têm afectado o PP. Alguns já tinham explodido quando esta sondagem foi realizada, como o dos cartões de crédito “negros” da Caja Madrid, onde 80 pessoas são acusadas de gastos pessoais irregulares e luxuosos. Os nomes mais conhecidos são Rodrigo Rato, vice-presidente nos governos de José María Aznar, e o ex-secretário-geral do PP Ángel Acebes. No entanto, o processo envolve todos os partidos, incluindo a Esquerda Unida (IU).

Partido de politólogos
A sondagem não deixa, aliás, quaisquer dúvidas sobre o estado actual do PP: 20% dos seus eleitores diz que conta abster-se, enquanto 8% de eleitores habituais do partido de direita admite votar no Podemos, que tem apostado em evitar rótulos ideológicos. O seu líder disse, na abertura da assembleia constitutiva do partido, há duas semanas, querer “assaltar o céu”, ocupando a “centralidade do tabuleiro” político.

Mais cuidadosos do que os analistas são os próprios membros do partido, quase todos professores de Política ou especialistas em Ciências Sociais. Este inquérito tem de ser lido com “muito cuidado”, diz Íñigo Errejón, promotor do movimento e membro da equipa de Iglesias. Se é verdade que a sondagem confirma inquéritos anteriores, com o partido a subir, atendência explica-se por Espanha estar “num tempo político de decomposição”, Errejón também nota que tudo se acelerou e que “os números envelhecem depressa”.

“Estamos num momento tão grave que cada vez nos perguntamos em que novo capítulo de podridão nos encontramos”, defende o investigador da Universidade Complutense de Madrid. Os espanhóis parecem concordar e nove em cada dez acredita que a situação política é má ou muito má.

O Podemos alimenta-se dos erros dos outros mais do que das suas próprias propostas, que uma maioria dos inquiridos não considera realistas, ao mesmo tempo que afirma que os seus membros não têm ideias claras sobre o que pretendem fazer no país. Para 42%, o êxito do partido de Iglesias deve-se à decepção e ao desencanto que os espanhóis têm com os outros partidos. Certo é que o efeito de desilusão com o PP e o PSOE beneficia o Podemos e não forças como a UPyD (União, Progresso e Democracia), e a Esquerda Unida, que perdem parte do chamado voto indignado.

O consultor político Antoni Gutiérrez-Rubí acredita que o Podemos não é um fenómeno que vá ter vida curta e aponta a tese de doutoramento de Íñigo Errejón (“A Luta pela hegemonia durante o primeiro governo do MAS na Bolívia – 2006-2009 – uma análise discursiva) como prova de que os membros do partido sabem no que se meteram e estudaram as mudanças aceleradas dos últimos anos e os grupos de eleitores que poderiam conquistar.

Estes potenciais eleitores ainda podem fugir, mas é preciso ter em conta que 20% deles são pessoas que não votaram em 2011. Entretanto, em Maio, haverá eleições municipais e autonómicas, algumas importantes, onde o Podemos se irá apresentar coligado – ainda não se sabe se com a Esquerda Unida, que já propôs essas alianças.

Os sociólogos José Juan Toharia e José Pablo Ferrándiz escrevem que os partidos da governação ainda podem inverter a situação actual. Mas também avisam que “seria errado desvalorizar o que este movimento parece estar em condições de conseguir”. Nada mais nada menos do que “originar uma restruturação do tabuleiro político nacional, com consequências imprevisíveis”.