Seria "uma tragédia" entregar a Carris e o metro a privados, diz dirigente da CML
O director municipal de Transportes sublinha que "tem que se ter cuidado" quando se diz que as contas daquelas empresas estão "equilibradas".
O dirigente municipal falava numa reunião conjunta das comissões de Mobilidade e de Ambiente e Qualidade de Vida da Assembleia Municipal de Lisboa, à qual foi chamado, a pedido dos deputados do PSD, para prestar esclarecimentos sobre o “decurso das reuniões que tem estado a realizar com os representantes da secretaria de Estado dos Transportes com vista a uma possível transferência para a Câmara de Lisboa da gestão da rede da Carris e Metro de Lisboa”.
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O dirigente municipal falava numa reunião conjunta das comissões de Mobilidade e de Ambiente e Qualidade de Vida da Assembleia Municipal de Lisboa, à qual foi chamado, a pedido dos deputados do PSD, para prestar esclarecimentos sobre o “decurso das reuniões que tem estado a realizar com os representantes da secretaria de Estado dos Transportes com vista a uma possível transferência para a Câmara de Lisboa da gestão da rede da Carris e Metro de Lisboa”.
Nessa audição, Tiago Farias explicou que foi ele quem coordenou a equipa técnica designada pelo presidente do município para “avaliar e questionar os números” relativos às transportadoras divulgados pelo Governo e para se pronunciar sobre “o valor do negócio da concessão”. Segundo disse, essa equipa desenvolveu um conjunto de “estudos económicos, para períodos de sete a dez anos”, com os quais procurou determinar “qual seria o risco económico e financeiro para Lisboa de tomar posse da gestão e exploração daquelas empresas”.
O director municipal adiantou que esse trabalho, que destacou ter tido apenas “uma parte técnica e jurídica, e não política” e não ter envolvido qualquer contacto com o secretário de Estado dos Transportes, “terminou em Setembro”. “Foi um diálogo muito correcto e muito fluido”, avaliou.
Depois disso, disse Tiago Farias, os resultados a que se chegou foram transmitidos ao presidente da câmara, António Costa, que “anunciou que tem interesse em continuar as negociações e em gerir as empresas, dependendo de algumas variáveis”. Agora, rematou o director municipal de Mobilidade e Transportes, é tempo de o Governo tomar uma decisão.
“Se o Governo cumprir o que tem dito, para tristeza minha, vai lançar um concurso. E se fizer isso é uma tragédia”, afirmou o engenheiro, que antes de assumir funções na câmara era vogal do conselho de administração da Empresa Municipal de Mobilidade e Estacionamento de Lisboa.
Essa sua convicção, justificou, assenta na ideia de que o “modelo” que os privados poderão via a desenvolver é muito diferente daquele que o município se propõe concretizar, e que em seu entender é o único que permite oferecer “um produto flexível, que se molde à cidade do futuro”. De acordo com Tiago Farias, se avançar o concurso quem o ganhar ficará obrigado a cumprir “um produto pré-definido”, com determinados percursos e horários, recebendo em troca “um fee”, uma renda de concessão.
“A cidade de Lisboa disse que esse modelo não lhe interessa. Queremos ter a gestão das empresas e não estar indexados a um serviço pré-definido”, explicou. De acordo com o dirigente municipal, a proposta da autarquia implica que seja ela “a definir tarifários e redes” e “a assumir os impactos, os proveitos e os gastos operacionais”. Algo que, admitiu, tanto poderá traduzir-se, consoante os cenários traçados, “em não haver prejuízo” ou em ele existir e ser de “alguns milhões por ano”.
Durante esta reunião das comissões da Assembleia Municipal, o líder da bancada do PSD sublinhou a importância de os riscos destes processos serem “analisados com maior rigor”. Entre esses riscos, Sérgio Azevedo destacou a necessidade que haverá, tanto na Carris como no Metropolitano de Lisboa, de investir em material circulante.
“A câmara tem condições financeiras para assumir esse investimento, que necessariamente vai ter de ser feito?”, perguntou o deputado social-democrata, lembrando que nenhuma daquelas transportadoras o faz “há bastantes anos”.
“Isso eu não posso responder”, reagiu Tiago Farias, frisando que aquilo que compete a uma equipa técnica como aquela que coordenou é “mostrar a um decisor onde estão os riscos”. Seja como for, o director municipal aproveitou a deixa para dizer que “tem que se ter cuidado” quando se diz que as contas daquelas empresas estão “equilibradas”, nomeadamente devido à já mencionada questão do material circulante.
Essa ideia foi também defendida pelo líder da bancada do PS, segundo quem aquilo que existe é “um equilíbrio precário”. Conseguido, afirmou Rui Paulo Figueiredo, “à custa de uma paralisação quase total de investimento, da degradação da manutenção, da saída de funcionários, de um aumento brutal de preços e de cortes nas carreiras e nos horários”.
Já o social-democrata Sérgio Azevedo chamou a atenção para um outro factor que a câmara não pode deixar de pesar: o da massa salarial das transportadoras, até atendendo à “disparidade” entre os vencimentos dos seus trabalhadores, “especialmente os do metro”, e os dos funcionários da câmara e das empresas municipais. De novo ficou sem resposta a sua pergunta sobre se a câmara terá “condições para suportar” esses custos.
Sobre isso, Tiago Farias disse apenas que a questão dos recursos humanos é “muito, muito delicada” e que “o modelo de downsizing” que foi apresentado pelo município prevê “basicamente acompanhar as reformas e saídas naturais das pessoas”. Uma opção que em seu entender contrasta com aquela que tomaria um privado, que se apressaria a ver “quantas pessoas são precisas” e quantas poderia dispensar.
Já o PCP, através da deputada Ana Páscoa, lembrou que a Carris e o Metropolitano de Lisboa não operam exclusivamente na capital e perguntou se “será igualmente bom” para os municípios vizinhos a Câmara de Lisboa vir a assumir a sua gestão. “Essa pergunta é puxada”, respondeu Tiago Farias, que acabou depois por dizer que aquelas empresas só “tocam marginalmente, pontualmente” noutros concelhos.
Há uma semana o secretário de Estado dos Transportes disse, em entrevista ao Diário Económico, que o concurso que António Costa não deseja é mesmo para avançar. “A protecção que temos de fazer do dinheiro dos contribuintes não nos permitiria fazer o acordo directamente [com as câmaras]. Precisamos de saber qual é a melhor proposta”, afirmou Sérgio Monteiro.
Em Julho, quando o Conselho de Ministros deu luz verde ao lançamento das concessões da STCP e do Metro do Porto, o ministro da Economia adiantou que o concurso público referente a Lisboa devia ser lançado daí a dois meses.