Alfred Wertheimer não fazia ideia quem era Elvis, mas apanhou-o melhor do que ninguém
O fotógrafo Alfred Wertheimer registou algumas das imagens mais icónicas do rei do rock. Morreu na semana passada mas só depois foi anunciado.
“Não houve nenhum fotógrafo que Elvis tivesse deixado chegar tão perto da sua vida e da sua intimidade como o fez Alfred”, disse Priscilla Presley, mulher de Elvis.
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“Não houve nenhum fotógrafo que Elvis tivesse deixado chegar tão perto da sua vida e da sua intimidade como o fez Alfred”, disse Priscilla Presley, mulher de Elvis.
As fotografias captadas durante as sessões de 1956 seriam usadas nas contra-capas de discos e algumas seriam distribuídas pelos jornais. A ideia era passar facilmente a imagem de Elvis em acção nos concertos, nos bastidores e em alguns aspectos da sua vida privada. O dinheiro que Wertheimer receberia em troca deste trabalho daria para pagar os rolos a preto e branco, as provas de contacto e as deslocações e, de vez em quando, uma ou outra refeição. Quando quis retratar Elvis a cores, a RCA achou que não era boa ideia e o fotógrafo teve de pagar os rolos do seu bolso. Em contrapartida, ficou com os direitos sobre os negativos e com o dinheiro da venda destas imagens para outras publicações. Um negócio que veio a revelar-se bem mais lucrativo para o homem da máquina fotográfica do que as duas partes alguma vez podiam imaginar.
Com acesso privilegiado a locais onde o comum dos fotógrafos nunca poderia estar, Wertheimer acompanhou Elvis durante apenas dez dias, em diferentes ocasiões. Durante essas sessões captou cerca de 450 fotografias. Essas imagens são talvez as que melhor transmitem todo o caldeirão de sentimentos e situações que envolveram o cantor no ano em que foi definitivamente catapultado para a fama. O ano em que gravou Hound Dog e Don’t Be Cruel, o 45 rotações mais vendido da década. O ano em que Elvis se tornou um ídolo para os adolescentes americanos. O ano em que deu os primeiros passos rumo ao estatuto de celebridade. Um tempo em que se entregava sem receios à objectiva. Uma proximidade que ficou demonstrada enquanto Elvis gravava Hound Dog e Don’t Be Cruel, enquanto lia correspondência de admiradoras, enquanto comia sozinho ou olhava pela janela do comboio. Uma proximidade que chegou à intimidade com The Kiss, a imagem mais conhecida de Wertheimer que mostra Elvis de língua colada a uma rapariga nos bastidores.
Pouco depois de uma grande exposição dedicada ao trabalho de Wertheimer sobre Elvis no Smithsonian Institution’s National Portrait Gallery, em 2010, a rapariga do beijo haveria de se revelar através de uma reportagem publicada na revista Vanity Fair. Na altura, Junho de 1956, Alfred Wertheimer não perguntou quem era aquela mulher que enfeitiçou Elvis e garante que ninguém do círculo restrito do rei sabia. Nem ele. A incógnita durou muito tempo, mas não foi por causa das feições da rapariga se esconderem na perspectiva. Entre as fotografias onde aparece a mulher que encantou Elvis na noite em que estava prestes a actuar para milhares de pessoas no Mosque Theatre, em Richmond, há muitas em que esta enfrenta a câmara sem rodeios. Apenas três meses depois do beijo na ponta da língua, The Kiss foi parar às páginas de uma publicação especial chamada The Amazing Elvis Presley (tiragem de 100 mil exemplares a 35 cêntimos cada). E daqui foi estampada na Life e depois em centenas de outros títulos mais.
A família da mulher escultural, reformada de um negócio de imobiliário, sabia da namoriscadela com Elvis. E sabia das fotografias. Mas sempre respeitaram o seu desejo de não dar a cara pela fotografia que está em quase todo lado onde o nome de Elvis aparece. The Kiss foi escolhida para os materiais de promoção da exposição Elvis at 21: New York to Memphis, no Smithsonian, que reuniu dezenas de fotografias da lendária série de Wertheimer. O certo é que o poder da imagem parece ter vencido o do silêncio. E, mais de cinco décadas depois, a mulher do beijo decidiu mostrar o rosto e dar o nome. Chama-se Barbara Gray.
“Elvis permitiu-me proximidade. Sem ela não teria conseguido as imagens de intimidade que consegui”, afirmou Wertheimer numa entrevista, em 2010. “Ele fazia dele próprio. Era o melhor realizador da sua própria vida e eu não teria feito melhor se o tivesse tentado”, acrescentou.
Segundo o New York Times, esta série de Alfred Wertheimer esteve esquecida durante muito tempo, apesar de um ligeiro ressurgimento logo depois da morte de Elvis, em 1977. A segunda vida destas imagens aconteceu nos anos 1990 por iniciativa de Chris Murray, dono da Govinda Gallery, sediada em Washington e especializada em arte relacionada com o mundo do rock. Durante as duas décadas, Wertheimer organizou inúmeras exposições em todo o mundo e publicou vários livros, entre os quais um com a chancela da Taschen.
Alfred Wertheimer nasceu em 16 de Novembro de 1929, em Coburg, na Alemanha. Chegou a Nova Iorque com os pais em 1936, em fuga da perseguição nazi aos judeus. Licenciou-se em Design em Publicidade, em 1947, e começou a tirar fotografias para o jornal Cooper Union com uma câmara oferecida pelo irmão mais velho, Henry. Regressou à Alemanha em 1952 integrado no Exército americano como fotógrafo. De regresso aos EUA, trabalhou com o fotógrafo de moda Tom Palumbo enquanto fazia biscates para outros clientes como a RCA, através da qual fotografou artistas como Perry Como, Arthur Rubinstein, Lena Horne e Nelson Eddy. De acordo com o obituário publicado pelo New York Times, nos anos 60 Wertheimer dedicou-se ao cinema (foi um dos autores do documentário Woodstock), onde experimentou a montagem. Nos últimos anos dedicou-se em exclusivo à promoção do seu trabalho fotográfico, aparecendo em exposições e conferências sobre Elvis Presley.