Javi Poves, o futebolista anti-sistema, está de volta aos relvados
Em três anos deu a volta ao mundo, adoeceu com malária, dormiu ao relento. Agora vai jogar na III Divisão do futebol espanhol
A decisão de Javier Poves Gómez apanhou muita gente de surpresa. “É bom rapaz mas tem uma grande pancada”, disse o então treinador do Sporting de Gijón, Manolo Preciado. A família tentou dissuadi-lo: “Para o meu pai foi difícil, porque gosta muito de futebol e sacrificou-se muito para andar comigo de campo em campo. A minha mãe e a minha irmã choraram, a minha avó pede-me para ficar.”
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A decisão de Javier Poves Gómez apanhou muita gente de surpresa. “É bom rapaz mas tem uma grande pancada”, disse o então treinador do Sporting de Gijón, Manolo Preciado. A família tentou dissuadi-lo: “Para o meu pai foi difícil, porque gosta muito de futebol e sacrificou-se muito para andar comigo de campo em campo. A minha mãe e a minha irmã choraram, a minha avó pede-me para ficar.”
Durante três anos, o defesa que nasceu para o futebol nos escalões de formação do Atlético de Madrid deu a volta ao mundo. Passou por 35 países, contactou com culturas diferentes e viveu experiências: adoeceu com malária no Senegal, dormiu ao relento durante uma tempestade no Camboja, ou na praia quando esteve no Brasil. “Foi a melhor decisão que tomei na minha vida. Estive em alguns dos países mais pobres, conheci a crueza da realidade e tornei-me mais humano. Curei-me da malária sem medicação e também da estupidez em que vivemos instalados. O dinheiro que ganhava na Liga era corrupto. O mundo do futebol idiotiza-te”, sublinhou.
Três anos depois, Javi Poves voltou a casa e ao futebol – agora na III Divisão, ao serviço da Unión Deportiva San Sebastián de los Reyes, emblema dos arredores de Madrid. “Regresso porque me apetece, porque sinto que tenho de voltar. O futebol da III Divisão será uma forma de reencontrar o futebol da minha infância”, disse Javi Poves, confessando: “Sempre gostei do futebol como jogo. Só odeio aquilo que o rodeia. Dá nojo ver tanta corrupção. A FIFA deixa que morra gente na construção de estádios no Qatar. Quando estive no Brasil fiquei impressionado, nunca tinha visto tamanha desigualdade.”
Agora com 28 anos, Javi Poves é um homem diferente. Vai ser pai e faz planos: “Entre as coisas que encontrei pelo mundo está a minha futura mulher. Precisamos de estabilidade, porque ela está grávida. Madrid parece-me um sítio maravilhoso para formar família. Temos o projecto de abrir um café. Tenho de assentar”, reconheceu aquele que foi descrito como “futebolista anti-sistema”. Após três anos a conhecer o mundo, voltou ao ponto de partida. Quando estava no Sporting de Gijón devolveu ao clube o carro que lhe tinha sido atribuído por um patrocinador e pediu que não lhe pagassem o salário por transferência bancária, para que o seu dinheiro não fosse combustível da especulação bancária. Agora vai para os treinos de bicicleta e desfruta da simplicidade do futebol mais genuíno.
* Planisférico é uma rubrica semanal sobre histórias de futebol e campeonatos periféricos