“É um erro que responsáveis da coligação esclareçam discussão interna sobre Orçamento”

Em entrevista ao PÚBLICO a propósito das jornadas parlamentares conjuntas que se realizam esta sexta-feira e sábado, o líder parlamentar do PSD, Luís Montenegro, considera que o PS é hoje "um partido muito interesseiro”.

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Luís Montenegro Daniel Rocha

O CDS diz que neste Orçamento há moderação fiscal, a ministra admite haver aumento da carga fiscal. Em que é que ficamos?
Este é um orçamento que revela uma recuperação do rendimento das famílias e que simultaneamente continua a concretizar uma reforma de competitividade na economia. É um orçamento que comporta o aumento do salário mínimo, que faz recuperar 20% da diminuição salarial dos funcionários públicos com rendimentos acima dos 1500 euros [os que tinham tido cortes] e que não onera as pensões que tinham complemento extraordinário de solidariedade (CES). É um Orçamento que revela uma inversão da tendência que, nos últimos anos, infelizmente, o país teve de assumir de sobrecarga fiscal sobre os contribuintes e as empresas.

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O CDS diz que neste Orçamento há moderação fiscal, a ministra admite haver aumento da carga fiscal. Em que é que ficamos?
Este é um orçamento que revela uma recuperação do rendimento das famílias e que simultaneamente continua a concretizar uma reforma de competitividade na economia. É um orçamento que comporta o aumento do salário mínimo, que faz recuperar 20% da diminuição salarial dos funcionários públicos com rendimentos acima dos 1500 euros [os que tinham tido cortes] e que não onera as pensões que tinham complemento extraordinário de solidariedade (CES). É um Orçamento que revela uma inversão da tendência que, nos últimos anos, infelizmente, o país teve de assumir de sobrecarga fiscal sobre os contribuintes e as empresas.

Há medidas que podem reduzir o IRS como o quociente familiar, mas que são absorvidas por outras taxas como as da fiscalidade verde. Não há aqui um aumento da carga fiscal?
A questão da fiscalidade verde/IRS, como sabemos, tem um efeito neutral. Mas o que há é uma recuperação do rendimento que não pode deixar de ser colocada como a grande referência deste Orçamento. Não podemos esquecer que, há três anos, estávamos a discutir um Orçamento do Estado que cortava os dois subsídios na administração pública e um no sector privado. E há dois anos cortava um subsídio na administração pública. E a tudo isso acrescia um congelamento de progressões e a CES.

Há margem para a maioria parlamentar fazer alterações substanciais à proposta de OE?
Faremos um trabalho de especialidade que é apanágio destes processos orçamentais. Certo é que, não sendo este OE constituído por medidas de natureza mais restritiva, como em anos anteriores, não temos essa margem, mas é por boa razão. Não há um nível de restrição de rendimento que possamos modelar. Isto não significa que não haja medidas que não possam ser aprimoradas em sede de especialidade.

No IMI, por exemplo, o primeiro-ministro deu sinais de que poderia estudar alterações…
É uma das matérias que ainda estamos a estudar em detalhe, não temos ainda uma proposta que possa consubstanciar uma alteração.

O PSD mostrou vontade em negociar com o PS, designadamente na reforma do IRS e na fiscalidade verde. O que é que a maioria pretende negociar?
Em primeiro lugar, é preciso dizer que a reforma do IRS não é apenas uma reforma de taxas, é mais do que isso. São as regras de aplicação, há aspectos de simplificação que estão hoje já muito desenvolvidos, estamos a falar de aspectos de mobilidade geográfica e portanto são aspectos que não são da política do dia seguinte, mas sim da relação que o Estado tem com os contribuintes nas próximas décadas. Desse ponto de vista, é inacreditável que o maior partido da oposição, que foi governo e que ambiciona tornar a ser, não possa estar disponível para…não é estar de acordo com tudo, mas para alicerçar estruturas sólidas dos principais sistemas que temos.

O mesmo se diga em relação à natalidade. Não haver uma disponibilidade para isso, é a meu ver, sinal de fraqueza política enorme do PS e do seu líder, quer aquele que esteve nos últimos três anos, quer aquele que foi agora eleito candidato a primeiro-ministro. Só uma liderança fraca é que tem medo de fazer uma aproximação ao Governo. Os 40 anos de democracia mostram-nos que o PS nunca esteve disponível para fazer grandes compromissos para o futuro. Só quando estava no Governo. Porquê? Porque o PS na oposição teve sempre uma liderança fraca.

A liderança mudou…
A liderança mudou mas a política continuou. É a mesma, com caras que, de resto, estão muito comprometidas com aquele que tem sido o discurso do PS. O PS apresenta-se hoje como um partido muito interesseiro, que só está a tentar aproveitar e potenciar focos de descontentamento. Só está a querer juntar-se às vozes mais radicais da esquerda, do BE e PCP, que pura e simplesmente criticam a situação mas não contribuem para debelar as dificuldades. É um PS que tem um novo líder que se tem escondido e que tem escondido as suas políticas. Isso não é bom para a democracia nem para o PS, mas isso é um problema do PS. Há uma certa arrogância na forma como o PS se apresenta, quer achando que já ganhou as eleições, quer achando que pode mobilizar o país só com ideias genéricas. Creio que os portugueses vão penalizar essa arrogância.

Mas o que é que o PSD gostava de levar para uma mesa de conversações com o PS na reforma fiscal?
Temos uma boa base: uma proposta de reforma do IRS e da fiscalidade verde e das políticas de natalidade, que podem ser mais aprofundadas no Parlamento, e nos limites dos tectos máximos da despesa pública. Sem um compromisso de longo prazo de contenção da despesa pública, não é possível ter estabilidade financeira, nem é possível criar condições para baixar impostos.

Se diz que a maioria não tem margem para fazer alterações substanciais, como é que pode estar disponível para negociar?
Falei do exercício orçamental de 2015. Isso é uma coisa. Agora, a reforma do IRS e da fiscalidade verde a médio e longo prazo, essa está aberta  - como de resto está o Orçamento - à discussão e à participação do PS, como aconteceu com a proposta de IRC. O Governo toma a iniciativa e agora cabe ao PS apreciar os termos em que as propostas chegam ao Parlamento, dar o seu contributo, e se possível, chegarmos aqui a uma aproximação.

E se o PS estivesse disposto a negociar a redução de 1% da sobretaxa de IRS com uma compensação?
Uma coisa é a proposta de Orçamento do Estado, outra é a reforma do IRS. São coisas que não podem estar associadas dessa maneira. Se assim fosse, estávamos a circunscrever a reforma a um ano. Relativamente à sobretaxa, ninguém tem mais desejo de baixar os impostos e todos eles, de resto, mas sobretudo os do rendimento do trabalho, do que nós no PSD ou no CDS-PP. A vontade é a mesma. O que não podemos é fazer isso a qualquer custo. A última experiência de baixa de impostos numa situação de vulnerabilidade financeira foi em 2009, ano de eleições. O PS subiu salários e baixou impostos e no ano seguinte cobrou aos portugueses a triplicar aquilo que tinha oferecido em ano eleitoral.

Mas há um partido no Governo, que é o CDS, que tem acesso à mesma informação financeira do Estado e acha que era possível baixar 1% na sobretaxa do IRS…
Há um só Governo. A solução sobre a sobretaxa é engenhosa, mas é muito positiva. Ela faz reflectir no contribuinte a vantagem de termos uma boa execução orçamental. Se isso tivesse sido aplicado este ano, não havia sobretaxa. Esse foi o sentido da proposta que foi construído por todo o Governo. Se no início nem todos tivessem a mesma opinião, é natural. No PSD também não estamos de acordo no início das discussões ou da coligação.

Mas há um partido que acha que é possível e o primeiro-ministro acha que não.
Não vale a pena insistir. É um erro que haja responsáveis da coligação a querer esclarecer a opinião pública sobre o que foi uma discussão interna de posições que podiam ser diferentes no princípio. O que interessa é que esta solução é a do Governo, é a do PSD e do CDS-PP. Aquilo que gostava, aquilo que tento fazer é que todos os dirigentes da coligação, seja do Parlamento, do Governo, seja dos respectivos partidos, possam afirmar aos portugueses os méritos da solução que é de todos. Essa discussão, se teve lugar, é interna do Governo.

Mas que foi tornada pública pelos próprios…
Repito o que disse. O que eu desejo é que na coligação todos se concentrem em afirmar com convicção as ideias e as políticas.

E acha que as bases dos partidos estão convencidas?
É importante para que o Governo cumpra a sua missão e para que os partidos tenham uma relação de confiança com os eleitores que possa dar azo ao seu objectivo: renovar a maioria absoluta no Parlamento.

Acha que é atingível?
Acho que sim. A questão essencial é esta: perguntar aos portugueses qual é o melhor Governo. Se é aquele que foi protagonizado pelo PS, pelo engenheiro Sócrates, por António Costa, Ferro Rodrigues, Vieira da Silva, ou se é o Governo de Passos Coelho, Paulo Portas, Maria Luís Albuquerque e Pires de Lima, que têm estes resultados económicos e financeiros. Se na coligação quiserem distrair a opinião pública com questões que estão ultrapassadas, independentemente de cada um ter direito à sua opinião, é evidente que esse trabalho será dificultado. E creio que todos nesta maioria devem estar concentrados no essencial. Devo dizer que os membros do Governo, e os ministros em particular, devem aproveitar cada vez mais o seu espaço de intervenção pública para afirmar estas ideias. Nós precisamos que os membros do Governo comuniquem mais com o país, que estejam mais perto do terreno, e que possam ser eles próprios veículos da nossa capacidade de motivação e de mobilização. Não é crime os membros do Governo fazerem combate político.

Têm feito pouco?
Acho que podem fazer mais e devem fazer mais. O país precisa que eles façam mais e os partidos que suportam o Governo também.

Não acha que esta solução do crédito fiscal vai ter custos eleitorais?
Eu creio que a solução é responsável. É uma relação de transparência, de responsabilidade, que o Governo encontrou e que é feliz, e em que pessoalmente me revejo muito. O importante, nesta fase, é que não haja opiniões nem pessoais nem partidárias, seja do PSD ou do CDS, sobre esta matéria. Esta matéria é crucial para afirmação do nosso projecto político.

Acha que o CDS não está a ajudar na renovação da maioria absoluta?
Acho que na coligação, nos dois partidos e nos membros do Governo, todos devem concentrar-se na mensagem essencial desta maioria. As opiniões parcelares ou pessoais são secundárias quando queremos afirmar um projecto político para o país. Isto deve ser entendido com tranquilidade e não deve ser uma forma de ignorar que, nos pontos de partida, podemos ter opiniões diferentes. Agora, se vamos andar toda a vida a querer afirmar essas opiniões, vamos contribuir para que as pessoas não tenham confiança neste projecto.

Acha que essa linha do combate político é compatível com a estratégia do “que se lixem as eleições”?
Chegados ao momento eleitoral, temos de fazer duas coisas. Temos de prestar contas do que fizemos. Temos que explicar bem que este Governo, comparativamente a qualquer outro desde o 25 de Abril, tem argumentos para demonstrar o seu sentido social, o sentido de justiça, na distribuição de rendimentos e de sacrifícios. Não temos conseguido fazer isso aproveitando todos os argumentos que temos. As pessoas na rua não têm consciência plena do esforço de justiça social que o Governo fez. Não é criticar nenhum aspecto nem ninguém em concreto. Nós na maioria ainda não fomos capazes de mostrar às pessoas coisas tão importantes como isto: não ficou ninguém para trás nos últimos três anos e meio, há muita gente a passar por dificuldades e a sofrer, mas o Estado garantiu a esses o apoio social.

Mas tivemos muito desemprego que afectou milhares de famílias…
Já temos menos desemprego que tínhamos e estávamos numa circunstância delicadíssima. Numa situação que era a pior de todas, o Estado social respondeu às pessoas, mas nós na maioria nem sempre conseguimos demonstrar que assim foi. Temos de prestar contas e mobilizar o país para os próximos quatro anos.

Acha que vão conseguir apagar a imagem colada ao Governo de que aplicou uma receita excessiva de austeridade?
Nós tivemos uma austeridade de emergência, que não foi tão intensa como noutros países que tiveram programa. Mas foi a solução devida para que Portugal pudesse ter taxas de juro que são as mais baixas para se financiar e ter a tendência do desemprego a diminuir, e para que Portugal tivesse crescimento económico, que é superior à média da zona euro. Falhou quem previa que não sairíamos da espiral recessiva. Temos hoje um candidato a primeiro-ministro do PS que tem andado escondido e quer ser uma espécie de François Hollande à portuguesa capaz de mudar, não o país, mas a Europa de um dia para o outro. Entre os “Hollandes”, mais vale o original do que uma cópia e mesmo o original fracassou.

Acha que deve haver coligação pré-eleitoral com o CDS?
Acho que há condições para que os dois partidos se apresentem às eleições com a ambição realista de obter a maioria absoluta de mandatos no Parlamento. Chegará o tempo em que os partidos terão de tomar essa decisão, cada um tem os seus estatutos e formas de decisão, mas independentemente dessa decisão, o objectivo deve ser o mesmo: obter a maioria.

Mas é mais atingível indo juntos ou não? Há quem defenda que PSD e CDS não somam nas urnas…
Do ponto de vista eleitoral, é prematuro tirar conclusões. Do ponto de vista político, o mais importante  não é antecipar a decisão, mas que essa discussão não prejudique a performance do Governo e da maioria até ao último dia da legislatura. Os partidos têm que gerir esse assunto com responsabilidade, sem nenhum tabu, porque as duas opções terão vantagens e inconvenientes. Mas o importante é que os dois partidos fixem um objectivo comum e sobretudo que não prejudiquem a imagem colectiva que temos junto dos eleitores.

Está a dizer que, se não houver acordo, isso deve ser gerido com cuidado?
É seguramente prudente que, se a opção for pelas listas separadas, isso não sirva nem desenvolva um processo de ruptura ou de conflitualidade.

Que não ponha em causa a governabilidade?
Não é só a governabilidade. É a confiança. Os eleitores, os portugueses, mesmo se formos separados, confiarão sempre mais em qualquer um dos dois partidos se nós não prejudicarmos, por questões partidárias, o desempenho cabal e pleno até ao último dia da legislatura. Esse é o ponto que deve prevalecer neste processo de amadurecimento de construção da decisão.

Mesmo que não haja acordo, há condições para a coligação continuar a governar?
Há todas as condições, nós já o fizemos de resto no passado.

Mas noutras circunstâncias…
Certo, mas já o fizemos no passado e não foi por causa disso que perdemos as eleições. Este governo vai cumprir a legislatura até ao fim.

E a sua opinião?
Tenho uma opinião, mas não gostaria de a transmitir. Temos é que definir o objectivo comum e que os partidos não percam a sua relação de confiança com os eleitores para os mobilizar. Se me disser que esse raciocínio é mais viável se houver listas conjuntas, digo que é um critério de interpretação daquilo que estou a dizer, mas não vou tomar a posição final.

Mas a linha oficial da direcção do PSD é que deve haver coligação…
As direcções políticas dos dois partidos não vão tratar isso assim na praça pública. Temos um pensamento e vamos trabalhá-lo com o nosso parceiro de coligação.

Em caso de não haver maioria do PS, acha que o PSD deve estar disponível para uma solução de Governo ou uma solução parlamentar que viabilize um Executivo?
O PSD vai ganhar as eleições legislativas.

Mas se não vencer…
Vai vencer. E eu gastarei até às minhas últimas energias, todas elas, para cumprir esse objectivo.

Não quer dizer se o PSD deve estar disponível para uma futura aliança com o PS…
Não coloco sequer esse cenário.

Mas é real e possível, até pelo que dizem as sondagens…
Não valorizo as sondagens. Acho que temos todas as condições para vencer as legislativas.

Falemos então de presidenciais. Gostava de ver Santana Lopes como candidato a Belém?
Os candidatos presidenciais devem nascer de uma vontade individual. E o que eu desejo é que todas as pessoas que sintam essa vontade o possam fazer com toda a liberdade e espontaneidade. Há muita gente na nossa área política com condições. É o caso de Santana Lopes, Marcelo Rebelo de Sousa, Rui Rio e outras figuras como Leonor Beleza e Marques Mendes. Devemos aguardar as disponibilidades. O partido não deve ser o motor de arranque de nenhuma candidatura presidencial e nenhum candidato deve ter interesse nisso.

Marcelo Rebelo de Sousa parece excluído pela direcção do PSD…
Que eu saiba, a direcção do PSD não excluiu ninguém.

Sobre o futuro do PSD, vê-se como candidato a sucessor de Passos Coelho?
Essa questão não se coloca. O dr. Passos Coelho vai ser líder do PSD durante mais alguns anos. Vai continuar a ser primeiro-ministro. Estarei com muita convicção no apoio político a Passos Coelho. Ele tem sido de uma tenacidade e inteligência política muito grande.

O Parlamento deve discutir em breve a adopção por casais homossexuais. Vai dar liberdade de voto?
Temos uma forma de abordar essa questão que é a de respeitar a individualidade de cada deputado e é assim que vai continuar a ser.

A proposta de referendo caiu em definitivo?
Deve ser uma matéria pensada no âmbito dos programas eleitorais para a próxima legislatura. Acho que deve ser sujeito a uma consulta popular. Continuo a pensar o que pensava.