Jihadistas apedrejam até à morte, decapitam e usam terror como arma de domínio
Vídeo de mulher a ser lapidada, com anuência do próprio pai, é a última entrada na lista de atrocidades atribuídas ao Estado Islâmico. ONU diz haver provas de que radicais queriam exterminar yazidis do Iraque.
São exemplos da longa lista de atrocidades atribuídas ao grupo que em Junho declarou um califado nos territórios que conquistou entre a Síria e o Iraque e que, apesar da reserva a que a falta de confirmação independente obriga, ajudam a destapar o véu sobre o quotidiano de violência e medo de quem um dia se descobriu a viver sob o governo dos jihadistas.
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São exemplos da longa lista de atrocidades atribuídas ao grupo que em Junho declarou um califado nos territórios que conquistou entre a Síria e o Iraque e que, apesar da reserva a que a falta de confirmação independente obriga, ajudam a destapar o véu sobre o quotidiano de violência e medo de quem um dia se descobriu a viver sob o governo dos jihadistas.
O vídeo foi divulgado no início da semana e mostra uma mulher jovem, coberta por um véu dos pés à cabeça, rodeada por vários homens armados e por um mais idoso, que é identificado como o seu pai. Um deles lê a sentença, anunciando que a mulher foi condenada por adultério, e exorta o seu pai a condená-la, o que ele faz, perante as repetidas súplicas da filha. Puxa depois a jovem por uma corda que lhe prende as mãos à cintura até a um buraco aberto no chão, onde ela é obrigada a ajoelhar-se, começando a rezar, até que as pedras atiradas por quem a rodeia a silenciam.
As imagens, identificadas com a bandeira do Estado Islâmico a um dos cantos, foram colocadas na Internet por um grupo que se intitula “Raqqa está a ser silenciosamente massacrada”, um colectivo de activistas que nasceu da oposição ao regime de Bashar al-Assad, mas que se concentra agora a expor o terror imposto pelos jihadistas na cidade do Norte da Síria que se tornou a sua capital. O vídeo não tem data nem há indicação de onde terá sido filmado, mas o Observatório Sírio dos Direitos Humanos anunciou nesta terça-feira ter conseguido reunir informações de que uma mulher foi apedrejada até à morte numa zona conquistada pelo Estado Islâmico na província de Hama (Centro da Síria), em Agosto ou Setembro.
Este é o terceiro caso de lapidação na Síria a ser denunciado pelo Observatório, organização não governamental que recolhe informações de activistas no terreno. As anteriores aconteceram em Julho, em Raqqa e numa cidade vizinha, mas delas havia apenas relatos de testemunhas e três fotografias publicadas na conta de Twitter de um jihadista.
Abu Ibrahim Raqqawi, um dos membros do colectivo de Raqqa, contou na altura à agência AP como a população ficou chocada com o apedrejamento – pena prevista na sharia para o adultério, mas que é raramente aplicada mesmo nos países onde a lei islâmica vigora e que é ainda mais estranha na Síria, governada há décadas por um regime laico. “As pessoas não conseguiam perceber o que estava a acontecer e muitos ficaram indignados por ver sauditas e tunisinos [duas das nacionalidades mais comuns entre os jihadistas estrangeiros] a emitir tais ordens”, afirmou.
Mas há outros dispostos a seguir os seus métodos. O Observatório adiantou que um homem acusado de adultério foi apedrejado até à morte numa zona da província de Idlib (Norte) controlada pela Frente al-Nusra, o grupo da oposição que representa a Al-Qaeda na Síria, no primeiro caso do género de que há registo no país.
Numa outra entrevista, à televisão americana CBS, Raqqawi diz que há uma revolta surda na cidade contra os jihadistas, que recebem bons soldos, se apoderaram das melhores casas, fecharam escolas e hospitais. Mas os castigos que os radicais aplicam à menor dissidência aterrorizam a população e mantêm-na em silêncio. “Eles controlam Raqqa com mão de ferro”, disse o activista, explicando que há patrulhas “a cada esquina”.
O preço da rebelião foi uma lição que os habitantes de Abu Hammam, na vizinha província de Deir Ezzor, aprenderam em Agosto quando, depois de se terem revoltado contra os jihadistas, viram as forças do Estado Islâmico entrar na cidade e matar – decapitando, executando e crucificando – todos os homens que encontraram, contam sobreviventes ouvidos pelo Washington Post. Segundo o jornal, 700 pessoas terão morrido.
Atrocidades que, no caso das minorias, atingem dimensões ainda maiores. Na terça-feira, o secretário-geral adjunto da ONU para os direitos humanos disse não ter dúvidas de que o Estado Islâmico cometeu nos últimos quatro meses crimes de guerra e crimes contra a humanidade, mas no caso dos yazidis, minoria curda seguidora de uma religião pré-islâmica, “há elementos que mostram claramente uma tentativa de cometer genocídio”.
Ivan Simonovic diz haver provas de que os radicais pretendiam exterminar aquela população quando, em Agosto, os radicais tomaram a cidade de Sinjar, no Noroeste do Iraque, e cercaram a montanha vizinha onde milhares de civis se tinham refugiado. Sobreviventes contam que muitos yazidis, vistos como adoradores do diabo pelo radicais, foram executados quando recusaram converter-se e, no último número da sua revista, o Estado Islâmico vangloria-se por ter vendido mulheres e crianças como escravos. A Human Rights Watch publicou já este mês um relatório em que acusa o grupo de manter centenas de yazidis como prisioneiros na Síria e no Iraque e de forçar jovens a converter-se e a casar-se com os seus combatentes.
Os ataques aéreos norte-americanos permitiram à guerrilha curda furar o cerco e retirar de Sinjar dezenas de milhares de pessoas. Mas nesta segunda-feira o Estado Islâmico lançou nova ofensiva na vertente norte da montanha, provocando o recuo dos voluntários armados que defendiam a zona e encurralando um número indeterminado de civis que permanece na região.