Piadas sobre a gaguez são "bullying inconsciente"
A gaguez pode ser tratada de várias formas e quanto mais precoce for o diagnóstico e a intervenção, melhores são as perspectivas do tratamento
A gaguez continua a ser vista em Portugal como piada e, em muitos casos, chega mesmo a ser "bullying inconsciente" contra crianças e jovens, que não encontram nas escolas terapeutas suficientes para responder a esta perturbação da fala.
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A gaguez continua a ser vista em Portugal como piada e, em muitos casos, chega mesmo a ser "bullying inconsciente" contra crianças e jovens, que não encontram nas escolas terapeutas suficientes para responder a esta perturbação da fala.
O diagnóstico foi feito à agência Lusa pela Associação Portuguesa de Gagos (APG) na véspera do Dia Internacional de Consciencialização para a Gaguez, que se assinala no dia 22 de Outubro. "Em Portugal ainda há muito a utilização da gaguez para a piada, para o riso fácil, às vezes sem consciência do impacto que isso tem na pessoa que gagueja", disse à agência Lusa, o sociólogo Daniel Neves da Costa, da APG.
Estigma social nos adultos e uma espécie de "bullying inconsciente" sobre as crianças e jovens em idade escolar contam-se entre os principais impactos da gaguez, que se estima atinja cerca de 100 mil portugueses. Existem "formas de bullying e opressão das crianças e jovens que gagejam de uma forma muito inconsciente", sublinhou, adiantando que o número de terapeutas da fala nas escolas é insuficiente.
"Nestes últimos anos com todos os cortes e restrições no ensino especial têm surgido dificuldades acrescidas", no acesso aos terapeutas da fala, disse o sociólogo. A cobertura do Serviço Nacional de Saúde (SNS) não existe em todo o país, o que leva muitos pais a recorreram à associação, criada em 2005, para aconselhamento sobre terapeutas e terapias.
A gaguez pode ser tratada de várias formas e, segundo Daniel Neves da Costa, quanto mais precoce for o diagnóstico e a intervenção, melhores são as perspectivas do tratamento. O problema é que quando os pais recorrem aos médicos de família existe uma tendência de os aconselhar a deixarem passar algum tempo na expectativa que a gaguez desapareça. "Isso é um dos problemas que a APG está a tentar resolver junto da comunidade médica", disse.
Terapia da fala, instrumentos electrónicos e medicação podem ajudar a um discurso mais fluente, mas a APG lembra que não existem "curas milagrosas" para a gaguez. Debater todas estas terapêuticas para disponibilizar melhor informação às famílias é o que se pretende com mais uma edição das jornadas sobre a gaguez, a promover no sábado.
A gaguez, que atinge cerca 1% da população mundial, é uma perturbação da fluência da fala caracterizada por repetições, prolongamento de letras ou sílabas, pausas inesperadas e bloqueios. As causas da gaguez podem ser genéticas (60% das pessoas com gaguez têm um familiar gago), neurológicas (os gagos usam áreas neuronais distintas) e psicossociais (condições do desenvolvimento linguístico na infância). Em cada cinco pessoas que sofrem de gaguez, quatro são homens e apenas uma é mulher e na maioria das crianças, a gaguez surge entre os 2 os 5 anos.
Marilyn Monroe, Bruce Willis ou Anthony Quinn (actores), Winston Churchil ou Joe Biden (políticos), Charles Darwin ou Isaac Newton (cientistas) são algumas celebridades com gaguez. Também em Portugal existem vários exemplos, sendo os mais conhecidos os da escritora Maria João Seixas, do músico Mário Lajinha ou do radialista da TSF Mário Dias, que quando se senta ao microfone vê a gaguez desaparecer como por milagre. Para Daniel Neves da Costa, a explicação é simples e encontra-se na neurologia: "Os circuitos neuronais que o ser humano usa para produzir fala expontânea são diferentes daqueles que usa quando está a cantar, a ler ou a dizer um texto memorizado e a gaguez ocorre principalpemnte nos momentos de fala expontânea".