Da versatilidade da (nossa) cortiça: por um melhor tratamento das águas
Estes derivados de cortiça estão atualmente em estudo para projetos piloto de tratamento de águas
Uma das exportações de que mais nos orgulhamos como portugueses será certamente a cortiça. Portugal é responsável pela produção de cerca de metade da cortiça a nível mundial e parece não ter fim a sua gama de aplicações. Que melhor material que um tão associado ao nosso país para escrever sobre mais uma boa notícia da ciência feita por cá?
A verdade faz-nos mais fortes
Das guerras aos desastres ambientais, da economia às ameaças epidémicas, quando os dias são de incerteza, o jornalismo do Público torna-se o porto de abrigo para os portugueses que querem pensar melhor. Juntos vemos melhor. Dê força à informação responsável que o ajuda entender o mundo, a pensar e decidir.
Uma das exportações de que mais nos orgulhamos como portugueses será certamente a cortiça. Portugal é responsável pela produção de cerca de metade da cortiça a nível mundial e parece não ter fim a sua gama de aplicações. Que melhor material que um tão associado ao nosso país para escrever sobre mais uma boa notícia da ciência feita por cá?
Na revista Chemical Engineering Journal de Outubro, um estudo conjunto entre o Centro de Química e Bioquímica da Faculdade de Ciências da Universidade de Lisboa, os Centros de Investigação 3B’s e ICVS da Universidade do Minho, o Departamento de Química da Universidade de Aveiro e a Corticeira Amorim, refere a aplicação de carvões ativados, preparados com recurso a grânulos de aglomerados de cortiça expandida, para a remoção de compostos farmacêuticos poluentes das águas potáveis ou residuais. Estes compostos não são removidos pelos processos convencionais de tratamento de águas, pelo que esta metodologia poderá ser bastante relevante para uma melhor qualidade das águas que consumimos.
Estes grânulos, sub-produtos da indústria corticeira, foram utilizados como precursores amigos do ambiente para preparar carvões ativados com afinidade para remoção de três analgésicos comuns: paracetamol, ibuprofeno e ácido acetilsalicílico, bem como a cafeína, um agente de contraste (iopadimol) e um regulador lipídico (ácido clofíbrico). Os carvões foram preparados por tratamento físico dos grânulos com vapor de água ou químico com compostos de potássio. Nas condições experimentais utilizadas, os carvões derivados da cortiça permitiram remover até 90% da concentração de cada fármaco das águas. O tipo de tratamento dos aglomerados de cortiça gera uma diferente estrutura porosa interna dos grânulos, o que influenciará a afinidade para cada molécula.
As investigadoras principais do estudo, Ana Sofia Mestre e Ana Paula Carvalho, do Centro de Química e Bioquímica da Faculdade de Ciências da Universidade de Lisboa, referem que “a produção de carvões por este método encontra-se patenteada e que estes resultados promissores sugerem a utilização do método também na remoção de corantes e metais das águas. Estes derivados de cortiça estão atualmente em estudo para projetos piloto de tratamento de águas. Apesar de os aglomerados serem produzidos a partir de cortiça que não utilizável para a produção de rolhas, os grânulos podem vir a ser obtidos a partir de reciclagem em grande escala de rolhas após tratamento adequado”.
Para terminar, sinto-me orgulhosa por ter aprendido sobre uma potencial forma amiga do ambiente e inspirada num material tão português de ter um consumo doméstico de água mais seguro. Mais um possível elo entre água e vinho, já que dizem as regras de etiqueta que um copo de vinho deve estar acompanhado de um copo de água. No próximo jantar em que o leitor abra um bom vinho português, poderá olhar de outro modo para a rolha que preserva este néctar. Agora, é tempo para um brinde.
Este texto foi escrito de acordo com o novo acordo ortográfico