O cartoon de André Carrilho que ajudou a despertar a atenção para o ébola
Desenho do cartoonista analisa papel dos media na forma como o vírus é seguido fora do continente africano.
André Carrilho é um dos nomes obrigatórios quando se fala de cartoons ou ilustrações. O português, qua acrescenta ainda no currículo trabalhos na área da animação, design e caricatura, já teve o seu nome no PÚBLICO e agora assina de forma periódica cartoons no Diário de Notícias. Requisitado por publicações estrangeiras como o The New York Times, The New Yorker ou Vanity Fair, ganhou ainda vários prémios nacionais e internacionais.
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André Carrilho é um dos nomes obrigatórios quando se fala de cartoons ou ilustrações. O português, qua acrescenta ainda no currículo trabalhos na área da animação, design e caricatura, já teve o seu nome no PÚBLICO e agora assina de forma periódica cartoons no Diário de Notícias. Requisitado por publicações estrangeiras como o The New York Times, The New Yorker ou Vanity Fair, ganhou ainda vários prémios nacionais e internacionais.
Nas últimas semanas, o cartoon que fez para a edição de 10 de Agosto do DN tem sido alvo de análise em jornais, sites noticiosos e redes sociais, como o Facebook ou o Twitter. O impacto do cartoon levou a que fosse contactado para que o seu trabalho fosse reproduzido por outras publicações.
A explicação para a importância dada à imagem pode ser feita se analisarmos a forma como tem sido feita a cobertura jornalística do ébola. Colocado o tópico ébola no Google Trends, que indica a popularidade de um tópico numa linha de tempo, sendo possível ver os picos de pesquisa quando associados à publicação de notícias, a pesquisa pela palavra atingiu valores impressionantes em Agosto e Outubro.
Por exemplo, quando é feita uma leitura dos dados a nível mundial, os dias 2 e 8 de Agosto e as primeiras semanas de Outubro, nomeadamente os dias de 1 a 3, 8 e 10, tiveram picos reveladores. Nestes dias, o mundo parece ter tomado consciência de que o ébola é extremamente perigoso e que este tinha chegado aos Estados Unidos e à Europa.
Até aqui, os casos registados na Libéria, Serra Leoa e Guiné-Conacri, onde ocorreu a esmagadora maioria das mortes pelo vírus, despertaram a atenção de poucos e o interesse não foi tão significativo. As alterações de comportamento surgem quando o primeiro doente com ébola chega aos Estados Unidos e a Organização Mundial da Saúde declara a epidemia uma “emergência internacional”. Há um novo disparo após ser confirmado o primeiro caso na Europa, numa enfermeira espanhola, e quando é avançado que o número de vítimas mortais já ultrapassou os 4000.
Numa leitura ao que se passou em Portugal, os picos no Google Trends são semelhantes mas disparam também quando é avançado pela comunicação social que há um caso suspeito de ébola no Hospital de São João, no Porto, o que depois não se veio a verificar.
André Carrilho estava atento a esta realidade quando criou o cartoon para o DN. “Parece-me que a atenção que se dá às epidemias nos media ocidentais não tem a ver com uma medida universal de sofrimento humano, mas com a maior ou menor possibilidade de nos atingirem. Os meios de comunicação social tendem a passar de alguma indiferença para a sobreexposição e pânico, sem nunca deixarem de tratar o assunto numa perspectiva que opõe 'eles' [África] a 'nós' [EUA e Europa]", disse ao PÚLICO.
Foi com base nesta observação e na notícia de que dois missionários norte-americanos infectados na Libéria tinham recebido um medicamento experimental chamado ZMapp, composto por três anticorpos humanos contra o vírus, que André Carrilho criou o cartoon.
Quanto à reacção que a imagem por si criada recebeu mais recentemente nas redes sociais, o cartoonista considera que resultou numa “coincidência de factores”. “O público, de repente, começou a prestar atenção e a perguntar-se o porquê de só agora estar a fazê-lo. O cartoon é sobre isso, e encontrou ressonância no que as pessoas sentiam. Foi partilhado em alguns círculos online e começou a ser usado como ilustração do que se estava a passar nos media. Depois, os próprios media pegaram nele.”
Tal como André Carrilho, outros cartoonistas fizeram uma análise mordaz da forma como o ébola estava a ser seguido pela população e a dimensão do pânico gerado em torno do vírus. O português dá como exemplo um cartoon publicado no jornal The Sacramento Bee, onde um homem obeso, rodeado de fast-food, tabaco e álcool, e estatísticas sobre o número de mortes associadas ao seu consumo abusivo, acrescenta à sua lista de pânico o ébola.
No último domingo, André Carrilho regressou ao tema ébola no DN. Um homem negro sai de um avião e à sua espera estão médicos com factos protectores prontos a agir. O autor quis sublinhar a “diferença de atitude em relação ao ébola, que passou para um medo desproporcionado, segundo alguns especialistas de saúde”. “E há quem agora use o assunto para falar de controlos mais apertados à imigração vinda de países em vias de desenvolvimento”, acrescenta.