Bruxelas pede mais medidas em 2015, mas Governo prefere subir meta do défice para 2,7%
Comissão Europeia diz que qualidade da consolidação orçamental está mais baixa e diz ao Governo para tomar mais medidas. Executivo responde que “não seria coerente subir impostos”.
Foi à margem de uma visita ao concelho de Oleiros que Pedro Passos Coelho confirmou esta terça feira as notícias que davam conta de uma revisão em alta do objectivo de défice para 2015. "Ao longo destes três anos, apesar da recessão, conseguimos baixar para 4% o défice e, no próximo ano, iremos reduzir a nossa estimativa para 2,7%", afirmou.
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Foi à margem de uma visita ao concelho de Oleiros que Pedro Passos Coelho confirmou esta terça feira as notícias que davam conta de uma revisão em alta do objectivo de défice para 2015. "Ao longo destes três anos, apesar da recessão, conseguimos baixar para 4% o défice e, no próximo ano, iremos reduzir a nossa estimativa para 2,7%", afirmou.
Até agora, a meta para o próximo estava fixada nos 2,5%, o valor que tinha sido acordado entre o Governo e a troika. O primeiro-ministro, contudo, preferiu sublinhar que “Portugal sairá do procedimento por défice excessivo em 2015” e que esta será “a primeira vez, em 15 anos, que terá um défice abaixo dos 3%”.
Desde 1999, quando Portugal entrou no euro, por diversas vezes os Governos previram nas suas propostas de orçamento défices inferiores a 3% e, em algumas ocasiões, apresentaram dados preliminares que apontavam para a concretização desse objectivo. No entanto, revisões posteriores dos dados conduziram ao registo de défice sempre superiores à barreira de 3% definida pelas regras orçamentais europeias. Em 2007, antes da crise financeira internacional, o défice obtido foi de 3,1% do PIB.
Para justificar a decisão de elevar a meta do défice, Passos Coelho afirmou que “não seria coerente aumentar os impostos”.
Algumas horas antes deste anúncio do Governo, a Comissão Europeia publicou o relatório de avaliação final ao programa da troika aplicado em Portugal entre 2011 e 2014 e fez da condução da política orçamental pelo Governo o alvo dos seus principais avisos e críticas.
Para 2015, um dia antes de o Governo apresentar a proposta de orçamento, o aviso de Bruxelas foi claro: se Portugal quisesse cumprir o objectivo de défice de 2,5% no próximo ano, Portugal teria de colocar no terreno medidas adicionais de austeridade no valor de 500 milhões de euros.
A Comissão faz os cálculos sobre aquilo que o país precisaria de fazer para passar de um défice de 4% em 2014 (sem contar com as despesas consideradas extraordinárias) para os 2,5% acordados com a troika. Em primeiro lugar, os técnicos do Executivo europeu recordaram que em Maio, quando o programa ainda não tinha sido concluído, o Governo e a troika estimavam que seriam necessárias medidas equivalentes a 0,8% do PIB (cerca de 1400 milhões de euros), sendo a restante consolidação obtida através do crescimento da economia.
Agora, a Comissão Europeia diz que as contas são as mesmas, mas alerta para a existência de um problema. É que em Maio, o Governo e a troika ainda não incluíam nas suas previsões que o Tribunal Constitucional pudesse colocar entraves à nova contribuição de sustentabilidade nas pensões e ao cortes salariais em vigor na função pública. Como esses chumbos do Constitucional não foram totalmente compensados pelo Governo, a Comissão Europeia estima que, agora, as medidas de consolidação previstas ascendem apenas a 0,5% do PIB (cerca de 900 milhões de euros).
“Isto implica que o Governo vai ter de especificar medidas adicionais no Orçamento do Estado para 2015 por forma a atingir a meta de défice acordada de 2,5% do PIB”, afirma o relatório da Comissão. Ficavam assim a faltar medidas no valor de 0,3% do PIB (cerca de 500 milhões de euros). Além disso, Bruxelas diz que o Governo deve encontrar soluções permanentes para as medidas temporárias que aplicou no passado, como a sobretaxa de IRS (que voltará a estar presente no OE 2015) e a Contribuição Extraordinária de Solidariedade.
A opção do Governo, em vez de apresentar novas medidas, parece ser afinal deixar o défice público em 2015 derrapar, pelo menos em parte, face ao objectivo inicial.
Falta saber se esta revisão em baixa do objectivo já está a negociada com a Comissão Europeia que voltou esta terça-feira, no relatório que publicou, a recordar a existência de um compromisso com Portugal para que o défice fique nos 2,5% e não apenas abaixo de 3%, como define a legislação europeia para a generalidade dos países.
Em respostas ao PÚBLICO, fonte oficial da Comissão Europeia não confirma a existência de negociações para rever a meta do défice, repetindo as afirmações feitas na segunda-feira pelo vice-presidente Jyrki Katainen, onde era garantido que não tinham ainda sido tomadas decisões sobre qualquer proposta de orçamento dos Estados-membros e que tal apenas aconteceria depois de as propostas serem entregues aos serviços da Comissão.
Bruxelas irá enviar, na segunda metade deste mês, uma equipa para realizar a sua primeira avaliação pós-programa a Portugal.
Consolidação de menor qualidade
No relatório, a Comissão assinala ainda que o esforço necessário para cumprir a meta do próximo ano irá depender também da forma como irá acabar o presente ano em termos orçamentais. E neste capítulo, Bruxelas é muito crítica em relaçãoao Governo português.
Embora continuando a assumir como cenário base que o défice sem despesas extraordinárias pode chegar no final de 2014 à meta pretendida de 4% (com o défice estrutural a diminuir o mínimo exigido de 0,5 pontos percentuais), a Comissão Europeia diz que subsistem muitos riscos em redor deste resultado.
A Comissão está preocupada com a possibilidade da economia crescer menos que o esperado, com as pressões orçamentais ao nível das despesas com pessoal, transferências sociais e consumos intermédios (que já foram revistas em alta) e com a possibilidade de um novo chumbo do Tribunal Constitucional ao agravamento da contribuição para a ADSE, no valor de 0,2% do PIB.
Além disso, alerta que, com a apresentação do segundo orçamento rectificativo no final de Agosto, “a qualidade do ajustamento orçamental se tornou mais baixa” e que o Governo está a aproveitar mal os benefícios trazidos pela aceleração da actividade económica. “A nova estratégia implica que a receita adicional proveniente da recuperação económica e das reservas orçamentais estão agora a ser usadas para suportar uma despesa pública mais alta. Isto quando um dos objectivos do programa no capítulo orçamental, em particular para 2014, era o de prosseguir uma consolidação orçamental baseada na redução permanente das despesas, que tornaria o ajustamento mais sustentável e e mais favorável a um crescimento económico no médio prazo”, afirma o relatório da Comissão Europeia.
Considerando as despesas de carácter extraordinário, como a relacionada com a injecção de capital no BES, a Comissão Europeia calcula que o défice português pode chegar em 2014 aos 7,5%.