Manifesto pela poesia
Em muitas livrarias, a poesia ainda é relegada para um segundo plano, habitando pequenas moradas em estantes sombrias. A poesia não merece viver à meia-luz
Costuma dizer-se que há um português em cada canto do mundo. E, na tentativa de se validar esta afirmação, é frequente acrescentar-se que a sabedoria popular raramente se engana. Mas cereja no topo do bolo seria se, à semelhança deste adágio, também fôssemos encontrar, nas centenas de milhares de bibliotecas espalhadas pelo mundo, obras de autores em Língua Portuguesa — textos originais, reedições ou traduções — e leitores para essas obras.
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Costuma dizer-se que há um português em cada canto do mundo. E, na tentativa de se validar esta afirmação, é frequente acrescentar-se que a sabedoria popular raramente se engana. Mas cereja no topo do bolo seria se, à semelhança deste adágio, também fôssemos encontrar, nas centenas de milhares de bibliotecas espalhadas pelo mundo, obras de autores em Língua Portuguesa — textos originais, reedições ou traduções — e leitores para essas obras.
Vem isto a propósito de, actualmente, me encontrar em Pittsburgh, nos Estados Unidos. Aqui, na Carnegie Library, por exemplo, bastaram poucos minutos para encontrar vários livros de Eugénio de Andrade, Jorge de Sena e Fernando Pessoa, em inglês. É bom ver que a poesia ocupa toda uma sala, é posta em relevo, continua a seduzir leitores, a sustentar um diálogo vivo, interessante e renovado — como acontece um pouco por todo o mundo, em tantas comunidades. Há eventos, leituras, revistas, festivais, homenagens e concursos.
Ao mesmo tempo, é estranho e penoso pensar que, em muitas livrarias, a poesia ainda é relegada para um segundo plano, habitando pequenas moradas em estantes sombrias. Não faltarão dedos que apontem razões múltiplas para a sua falta de visibilidade e diversidade, nos mais variados contextos. Mercado, vendas e lucro — números que, apesar de tudo, não podem ser retirados à equação — são substantivos que muitas vezes desfiguram a produção literária, jogam a favor dos seus próprios interesses e, infelizmente, se sobrepõem à transparência e à qualidade dos textos.
A poesia não merece viver à meia-luz. Deve ser cuidadosamente selecionada, distribuída, partilhada, revisitada, traduzida, comentada — tal como, obviamente, todas as outras modalidades de criação literária. É fundamental que tenha muitas cores, texturas, formas e vozes. Que seja íntima e simultaneamente universal.
A poesia merece respirar, seguir viagem, iluminar e ser iluminada. Precisa de espaço e de tempo para que, abandonando a penumbra, também sirva de antídoto contra a violência e a crueldade, a injustiça, a discriminação e a mentira, faces que parecem governar este planeta. Porque a Poesia não se resume a questões estéticas e estilísticas, ao número de estrofes ou de versos, a capas e contracapas — é também causa, agente, fonte, origem, movimento, transformação, procura, energia, caminho.
Por isso, é belo e motivador pensar que, em todos os cantos do mundo, assiduamente, se escuta a voz de um poema. E nele sentimos qualquer coisa de singular, um estímulo extraordinário, a presença da verdade, que se agita, inquieta e nos provoca. Ainda que a não saibamos explicar; ainda que muitos defendam que não passa de um artifício inútil, ingénuo e socialmente irrelevante; ainda que muitos acreditem que não é mais do que um ofício descartável e inequivocamente supérfluo; ainda que outros tantos afirmem que não há espaço para ela e que não vende — a poesia merece ser inesgotável.