Fim de observação
O olhar curioso e fascinado perante a cultura popular foi sugado pelo objecto da observação. Um disco electrizante.
Os ambientes sonoros de Música Moderna estão generosamente incrustados nesse cenário: o pop/rock português anos 80 que, precisamente, vinha agarrado ao rótulo ingénuo e saloio de “música moderna”, o paraíso da música movida a sintetizadores totalmente plásticos, o disco sound manhoso e pegajoso, o cruzamento com uma encenação urbana do baile popular em clubes de strip a concorrer para o surrealismo e cópias fiéis de qualquer discoteca de província e, pelo meio, uma respiração que é mais de frescura do que de mera sobrevivência.
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Os ambientes sonoros de Música Moderna estão generosamente incrustados nesse cenário: o pop/rock português anos 80 que, precisamente, vinha agarrado ao rótulo ingénuo e saloio de “música moderna”, o paraíso da música movida a sintetizadores totalmente plásticos, o disco sound manhoso e pegajoso, o cruzamento com uma encenação urbana do baile popular em clubes de strip a concorrer para o surrealismo e cópias fiéis de qualquer discoteca de província e, pelo meio, uma respiração que é mais de frescura do que de mera sobrevivência.
E fala-se de cenário porque aquilo que se passa no mundo de TochaPestana é, em todos os sentidos, uma construção fantasiosa de uma dupla com imagem (e sonoridade a condizer) de dupla synth-pop com bola de espelhos a reflectir em óculos escuros retro-futuristas ou, em alternativa, de dupla enfarpelada em dourados e prateados ancoradas nessa tal ideia de modernidade entregue a tudo quanto brilhe, de um Porsche a percorrer estradas nacionais esburacadas pela passagem de tanto camião de mercadorias. E a imagem, aliás, é tão vital que cada um dos 13 temas será acompanhado por um vídeo – ou não fosse Tocha o mesmo realizador que conhecemos de É na Terra, Não É na Lua ou Balaou. Trata-se, no entanto, de uma construção fantasiosa que se esforça por inscrever na realidade.
Tocha já vestira antes a pele de Gonçalo Gonçalves, autointitulado “cantor romântico abandonado”. TochaPestana conserva ainda algum desse lastro da descendência de Victor Espadinha, sobretudo no magnífico tema final Piano-Bar, entre Espadinha, Rui Reininho e Serge Gainsbourg, da mesma maneira que os temas mais amigos da discoteca da dupla convocam tanto os brilhantes exercícios entre a genuinidade e a ironia dos Repórter Estrábico quanto o exagero melódico dos Modern Talking (Baila Comigo, Lisboa). Ou da mesma maneira que nas cedências às guitarras se ouve um eco da pop-sem-fronteiras dos Mler Ife Dada que convive alegremente com uma versão hard rock de Pássaro Doido (que inclui a participação da intérprete original, Dina).
Desde os Lupanar (por onde andava também Ana Bacalhau, cantora dos Deolinda, escondida aqui numas discretas segundas vozes) que Tocha e Pestana vêm ensaiando uma aproximação à cultura popular. Mas aquilo que era antes um olhar curioso e fascinado ameaça agora ser, em definitivo, sugado pelo seu objecto de observação. É esse último nível de atracção que electriza.