Prémio Champalimaud vai para cientistas que criaram terapias para doenças da retina que causam perda de visão

Galardão premeia décadas de investigação que resultou em tratamentos para a degenerescência macular da idade e para a retinopatia diabética, duas doenças da retina que podem causar cegueira. Sete cientistas recebem ao todo um milhão de euros.

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Os vencedores: Napoleone Ferrara, Evangelos Gragoudas, Joan Miller, Anthony Adamis, George King, Patricia D’Amore e Lloyd Paul Aiello Nuno Ferreira Santos
O prémio “reconhece o desenvolvimento da terapia anti-angiogénica para doenças da retina”, explica o comunicado da Fundação Champalimaud. “A degenerescência macular relacionada com a idade e a retinopatia diabética são duas das principais causas de perda de visão e cegueira no mundo. A prevalência destas doenças aumenta hoje em todo o mundo devido ao progressivo envelhecimento da população e à crescente epidemia global de diabetes”, lê-se no comunicado.

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O prémio “reconhece o desenvolvimento da terapia anti-angiogénica para doenças da retina”, explica o comunicado da Fundação Champalimaud. “A degenerescência macular relacionada com a idade e a retinopatia diabética são duas das principais causas de perda de visão e cegueira no mundo. A prevalência destas doenças aumenta hoje em todo o mundo devido ao progressivo envelhecimento da população e à crescente epidemia global de diabetes”, lê-se no comunicado.

“No início da década de 1990, ninguém queria olhar para os doentes com degenerescência macular, porque havia tão pouco para oferecer”, disse ao PÚBLICO a médica e investigadora Joan Miller que, com os seus seis colegas, veio receber o prémio na Fundação Champalimaud, em Algés. A investigadora pertence à Escola Médica de Harvard, em Boston, assim como Evangelos Gragoudas, Patricia D’Amore, George King e Lloyd Paul Aiello.

A degenerescência macular da idade é uma doença que afecta uma região específica e pequenina da retina, a mácula, que nos dá uma visão fina o suficiente para guiar, ler ou distinguir um rosto do outro. “É muito comum. Na altura em que chegamos aos 70 anos de idade, um terço da população pode tê-la”, informou-nos a investigadora. Na versão mais grave da doença, as pessoas desenvolvem nesta região novos vasos sanguíneos que são frágeis e que libertam líquido e sangue, causando uma “grave perda de visão”.     

Antes, o tratamento contra a degenerescência macular passava por desfazer os vasos sanguíneos com um laser, que acabava também por danificar a retina na região onde era aplicado, causando perda de visão. Mas ao longo das últimas décadas, aqueles investigadores, juntamente com Napoleone Ferrara, da Universidade da Califórnia em São Diego, e Anthony Adamis, do Colégio de Medicina da Universidade de Ilinóis, descobriram o que causou o desenvolvimento daqueles vasos sanguíneos e desenvolveram terapias para tratar a doença.

“É muito entusiasmante começar com as primeiras ideias e levar a investigação até aos modelos animais e, depois, até aos ensaios clínicos e ver os resultados nos doentes. É realmente entusiasmante, faz a nossa vida valer a pena”, disse Joan Miller, defendendo que a visão é um sentido muito importante, e o seu tratamento tem um grande impacto na vida das pessoas. “É muito entusiasmante para o nosso grupo ter este reconhecimento. O prémio vai ajudar o nosso trabalho. Estamos muito honrados.”

Tudo começou com o trabalho do investigador norte-americano Judah Folkman sobre o crescimento do cancro e a angiogénese — quando novos vasos sanguíneos se formam a partir de outros vasos. O cientista, que foi professor de alguns dos galardoados e já morreu, percebeu na década de 1970 que a partir de um certo tamanho, um tumor só podia continuar a crescer depois de criar novos vasos sanguíneos para alimentar as suas células. Mais tarde, na década de 1980, Napoleone Ferrara identificou a molécula que fomentava o crescimento de novos vasos e que estava presente nos tumores: o factor de crescimento endotelial vascular (FCEV).

“O nosso grupo tinha ligações com Folkman. Ao sabermos que o FCEV estava lá [no cancro], associado à falta de oxigénio, pensámos que deveríamos procurar por ele nas doenças dos olhos porque em muitas havia diminuição de oxigénio”, explicou Joan Miller. A equipa testou o papel deste factor na degenerescência macular e demonstrou a sua importância fundamental quando, ao inibi-lo — usando inibidores desenvolvidos por Napoleone Ferrara no cancro —, os vasos sanguíneos não se formaram mais.

Mais tarde começaram a aparecer os tratamentos. A investigadora ajudou a desenvolver e a testar o Visudybe, um marcador que se liga aos vasos sanguíneos e é activado pela luz, libertando moléculas que danificam as células. “Foi introduzido em 2000, naquela altura foi o primeiro tratamento em degenerescência macular”, explicou a cientista. Mais tarde, Anthony Adamis desenvolveu o Pegaptanib, o primeiro tratamento que inibe o FCEV no olho. “Este tratamento envolve injecções nos olhos de mês a mês. Anthony Adamis está a investigar químicos com uma maior duração”, disse Joan Miller.

Apesar de a cientista se ter dedicado à degenerescência macular, o crescimento de vasos sanguíneos também ocorre na retinopatia diabética. As pessoas com diabetes deixam de produzir naturalmente insulina e não metabolizam o açúcar, este acumula-se nos vasos sanguíneos dos olhos causando a longo prazo a perda de visão.

“Lloyd Paul Aiello e George King estão a trabalhar muito nos diabetes, é um pouco mais complicado, por isso há muito trabalho a fazer naquela área”, disse Joan Miller, que continua a tentar compreender o que está por trás da degenerescência macular. Ainda não se descobriu o que faz com que as células da retina estejam a produzir o FCEV, ou seja, o que inicia a doença, e, por isso, também não é possível combatê-la logo no início, quando aparecem os primeiros sinais de perda de visão. “Temos que ir ao momento inicial da doença e tentar encontrar tratamentos para a fase inicial, é o que estamos a fazer agora.”