Pais poderão vir a ter acesso a lista de agressores sexuais

Proposta de lei prevê que quem tem responsabilidades parentais de menores de 16 anos possa pedir nome e morada de agressores sexuais que vivam perto de casa ou de escola dos filhos.

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Pais não podem revelar informações a que poderão vir a ter acesso Filipe Arruda

De acordo com a notícia avançada nesta terça-feira pelo Correio da Manhã, entretanto confirmada pelo PÚBLICO, a medida faz parte de uma proposta que já foi distribuída aos parceiros judiciais. No essencial, transpõe para a ordem jurídica interna uma directiva da União Europeia e transcreve obrigações já assumidas por Portugal com a ratificação da Convenção do Conselho da Europa para a Protecção das crianças contra a Exploração Sexual e Abusos Sexuais.

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De acordo com a notícia avançada nesta terça-feira pelo Correio da Manhã, entretanto confirmada pelo PÚBLICO, a medida faz parte de uma proposta que já foi distribuída aos parceiros judiciais. No essencial, transpõe para a ordem jurídica interna uma directiva da União Europeia e transcreve obrigações já assumidas por Portugal com a ratificação da Convenção do Conselho da Europa para a Protecção das crianças contra a Exploração Sexual e Abusos Sexuais.

“Não existe nenhuma obrigatoriedade dos países europeus constituírem uma base de dados sobre os agressores sexuais”, sublinha Ricardo Barroso, professor na Universidade de Trás-os-Montes, que se tem dedicado ao estudo dos agressores sexuais. O que existe é a imposição de todos os estados se esforçarem para diminuir os crimes sexuais contra as crianças. A criação de um registo de identificação é apenas uma sugestão.

Parece-lhe uma medida eficaz desde que acessível apenas por polícias e magistrados e Direcção-Geral de Reinserção e Serviços Prisionais (DGSP) e enquadrado num conjunto de outras medidas. De outro modo, "a legislação pura e simplesmente será considerada ilegal em termos europeus". 

De acordo com a proposta, da base de dados constará o nome completo, a morada, a data de nascimento, a filiação, a nacionalidade e os números de identificação civil, passaporte, contribuinte, segurança social e registo criminal da pessoa condenada. Se mudar de residência ou se se ausentar mais de cinco dias, terá de comunicar às autoridades. De outro modo, incorrerá numa pena de prisão de um a três anos.

A base de dados, que deverá ser gerida pelo director-geral da Administração da justiça, poderá ser consultada por magistrados, polícias, profissionais da DGSP, mas também pelos pais com filhos até 16 anos. Bastar-lhes-á dirigirem à esquadra ou posto da sua área de residência e fazerem prova de que têm uma criança naquela idade para poderem pedir “informação sobre a identidade e o domicílio” de alguém que conste na lista.

Ricardo Barroso diz não encontrar razões objectivas para que os pais possam ter acesso a tal tipo de informação. Para que é que isso serve?, questiona. “O que é a área de residência? Cem metros? Quinhentos metros? A proposta diz que os cidadãos terão de se comprometer a guardar segredo. Quem vai acreditar que no mundo online isso vai acontecer?” Parece-lhe evidente que essa parte da proposta não resistirá à discussão pública.

A existência de uma lista de agressores sexuais está longe de ser consensual. O anterior Procurador-Geral da República, Pinto Monteiro, disse em Janeiro que "é uma medida popular, que agrada à população, mas, se formos a analisá-la, é extremamente perigosa e ameaçadora da vida privada".

Outra das vozes que se pronunciaram contra foi a da procuradora-geral da República Joana Marques Vidal, quando ainda era presidente da Associação Portuguesa de Apoio à Vítima: "Só admito a possibilidade de as polícias terem acesso à identificação, e em casos de especial gravidade ou de reincidência", chegou a afirmar ao Expresso. E contrariou um estudo apresentado pela ministra da Justiça: "A ministra diz que há mais de 90% de reincidência neste tipo de crime, mas o único que conheço, que se refere à criminalidade sexual em geral, diz 20%."

Apesar de polémica, a medida, já antes falada pela ministra da Justiça – em Junho de 2012 e em Janeiro deste ano, na abertura do ano judicial - parece acolher aprovação junto de muitos pais. De acordo com um estudo feito no âmbito de uma tese de mestrado em Medicina Legal e intitulada Registo de Abusadores Sexuais de Menores: Percepção do cidadão português, de Mafalda Borrego, muitos pais portugueses estão de acordo com a criação deste registo.

De acordo com o referido inquérito, a maioria dos inquiridos é solteira e prefere que o acesso seja restringido às polícias. Os inquiridos que são pais defendem o acesso público. A amostra incluiu 300 cidadãos, entre os 18 e os 87 anos, em Portugal. " Este é o primeiro inquérito feito em Portugal sobre este tema", afirmou na altura Mafalda Borrego ao Diário de Notícias.

Para Ricardo Barroso, a prevenção geral fica mais acautelada com outra medida proposta. Durante cinco a 20 anos, pessoas condenadas por crimes sexuais ficarão proibidas de exercerem qualquer profissão, actividades ou função que implique lidar com menores. A proposta prevê que quem, com dolo, dê emprego a um agressor sexual num sítio que lhe permita contactar com menores seja punido com pena de prisão até um ano ou multa até 120 dias. 

Os condenados por crimes sexuais também não poderão ter a tutela de crianças, adoptar, nem serem responsáveis pelas figuras do acolhimento familiar ou apadrinhamento civil. E, se os crimes em questão forem contra os próprios filhos, ficarão inibidos de assumir responsabilidades parentais entre cinco a 20 anos.