Reclusos não trabalham, mas cadeias pagam-lhes para evitar motins

Faltam guardas para acompanhar os reclusos nas actividades que ficam suspensas. Verbas são pagas para que reclusos continuem a ter dinheiro para as suas despesas e não se revoltem.

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Só cinco das 25 cadeias regionais não estão sobrelotadas Paulo Pimenta

A ordem informal, praticada na maioria das 51 prisões existentes, pretende evitar agressões entre reclusos e situações incontroláveis. Nas cadeias, a usura é grande e geradora de conflitos. Os reclusos cedem mutuamente cigarros e outros produtos e quando quem empresta não é ressarcido o valor da dívida tal como os problemas a ela associados aumentam.

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A ordem informal, praticada na maioria das 51 prisões existentes, pretende evitar agressões entre reclusos e situações incontroláveis. Nas cadeias, a usura é grande e geradora de conflitos. Os reclusos cedem mutuamente cigarros e outros produtos e quando quem empresta não é ressarcido o valor da dívida tal como os problemas a ela associados aumentam.

O dinheiro não pode circular dentro das cadeias, mas cada um dos reclusos tem uma conta interna com um cartão associado. Precisam dele para comprar tabaco, cartões de telefone para ligar à família, bolachas, leite, iogurtes e outros bens no bar.

“Os guardas marcam falta aos reclusos nos mapas diários de trabalho, mas depois eles recebem na mesma como se tivessem ido”, disse o presidente do Sindicato Nacional do Corpo da Guarda Prisional (SNCGP), Jorge Alves. Para o dirigente, esta situação é uma das que resulta da falta de guardas que afecta principalmente as cadeias de Coimbra, Alcoentre, Tires, Santa Cruz do Bispo e Pinheiro da Cruz. O SNCGP diz serem necessários mais 1200 para atenuar as dificuldades. Existem 14.284 reclusos, dos quais só 4637 trabalham. Há cerca de 3900 guardas ao serviço.

Também na última greve dos guardas, entre Abril e Maio, os constrangimentos impediram muitos reclusos de trabalharem. Também então foi tudo pago. “Os reclusos que não foram trabalhar na greve receberam na mesma. Os directores preferem pagar para que os reclusos se portem bem e estejam calados”, disse o presidente do Sindicato Independente do Corpo da Guarda Prisional, Júlio Rebelo.

A Direcção-Geral de Reinserção e Serviços Prisionais “desmente”, porém, que exista uma “orientação” para “serem pagos salários a reclusos quando não trabalhem”. Garante que na greve só receberam os reclusos que trabalharam e nega que as actividades estejam suspensas por falta de guardas.

Em causa estão verbas que em média rondam os 2,50 euros por cada dia de trabalho em tarefas de carpintaria, agricultura e mecânica. Os produtos são vendidos pelas cadeias.

Em Coimbra, cerca de 50 reclusos não trabalharam durante toda a semana passada por falta de guardas. Esta quinta-feira só trabalharam três em tarefas mecânicas. Contactado pelo PÚBLICO, o coordenador da zona centro do SNCGP, Jorge Ramos, também guarda na cadeia de Coimbra, confirmou a situação.

Aquela prisão tem 123 guardas para mais de 500 reclusos. Mas desde Janeiro, 14 guardas aposentaram-se, 16 ficaram de baixa e 20 estão agora de férias. Além disso, 17 esperam apenas a efectivação da reforma que já viram pediram.