Barreiro quer ser um porto seguro para recuperar vocação industrial
O Barreiro vê a possibilidade de receber o futuro porto de águas profundas no Tejo com esperança. A esperança de conseguir recuperar o seu passado industrial e a população perdida.
Ao PÚBLICO, uma fonte do executivo remeteu para as declarações produzidas pelo ministro da Economia, António Pires de Lima, que numa visita ao Barreiro, no passado dia 27 de Junho, declarou que “tudo aponta para que o novo porto de Lisboa se venha a localizar no Barreiro”.
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Ao PÚBLICO, uma fonte do executivo remeteu para as declarações produzidas pelo ministro da Economia, António Pires de Lima, que numa visita ao Barreiro, no passado dia 27 de Junho, declarou que “tudo aponta para que o novo porto de Lisboa se venha a localizar no Barreiro”.
A decisão definitiva está dependente da conclusão dos últimos estudos técnicos e ambientais, embora seja a única solução que está a ser estudada, depois de várias versões.
É também essa a convicção da Baía do Tejo (empresa da Parpública, que está a gerir os Parques Empresariais do Barreiro, Seixal e Estarreja) e do presidente da Câmara Municipal do Barreiro, Carlos Humberto Carvalho: “Se for decidido agora, estaremos em obra em 2016”, diz o autarca, adiantando que os estudos técnicos “estão muito avançados”.
O futuro porto no Barreiro não está expressamente contemplado no documento do PETI 3+, mas o “Plano Estratégico de Transportes e Infra-estruturas 3+”, actualizado este ano, prevê a expansão do Porto de Lisboa, que deverá contribuir para uma duplicação das mercadorias movimentadas nos principais portos portugueses. E depende dos fundos comunitários de apoio, já garantidos por Bruxelas, para o período 2014-2020.
O terminal de águas profundas será concessionado a privados, que assumirão a sua construção e exploração. O Governo defende que 47% dos custos previstos de 600 milhões de euros para o terminal de contentores sejam suportados pelo novo Quadro Económico de Apoio e está incluído, segundo o PETI 3+, no Corredor de Fachada Atlântica.
O autarca do Barreiro, ao contrário dos seus colegas de Almada, que rejeitaram a localização do terminal na Trafaria, só vê vantagens para o concelho por si administrado: “Não nos parece que haja aqui nada de verdadeiramente problemático que possa condicionar ou impedir a construção; é preciso potenciar as vantagens e minorar as possíveis desvantagens”, enfatiza Carlos Humberto Carvalho.
No mesmo sentido vão as palavras do presidente do Conselho de Administração da Baía do Tejo, Jacinto Pereira, que prevê transformações positivas na cidade: "Vai dinamizar todo o parque industrial do Barreiro”, e a construção do porto “vai ao encontro da estratégia da Baía do Tejo, no sentido de criar condições amigas do investimento, atrair mais empresas e criar mais emprego, muito mais atractivas para a localização de novas empresas”. A Baía do Tejo é responsável por 287 hectares do Parque do Barreiro.
O presidente da Câmara do Barreiro concorda e garante que o impacto económico “será muito positivo, vai criar muito significativamente postos de trabalho indirectos, um conjunto de actividades económicas para o concelho“. Carlos Humberto Carvalho avança ainda que “há já pessoas interessadas em investir, há algumas empresas a posicionarem-se face à eventual construção do porto” no Barreiro.
A Baía do Tejo acrescenta que “o porto irá obviamente incrementar e dinamizar a procura por parte de empresas para aqui se instalarem”. Quais? Jacinto Pereira é abrangente na resposta: “Todo o tipo de empresas. A lógica dos parques industriais é de complementaridade, o do Seixal, mais vocacionado para a indústria pesada (já existe a Siderurgia Nacional), o parque do Barreiro, para pequena e média indústria, empresas da área logística, serviços, novas tecnologias”.
O presidente da Baía do Tejo reforça que esta infra-estrutura irá facilitar o escoamento de produtos e a chegada de matérias-primas, com menores “custos para as empresas, do que o Porto de Setúbal, que está mais longe de Lisboa”. Muitas dessas futuras empresas resultantes da actividade portuária no Barreiro serão inseridas numa plataforma de logística, transportadoras, gestão de armazéns, empresas ligadas especificamente à actividade portuária, contentores, navios, despachantes oficiais, etc.
O futuro porto estará paredes-meias com a FISIPE, uma empresa de alta tecnologia, que “está entusiasmadíssima com a possibilidade desta localização”, diz o autarca do Barreiro. Carlos Humberto Carvalho reforça que as empresas exportadoras de tecnologia avançada podem aproveitar o território infra-estruturado, do ponto de vista das acessibilidades rodoviárias e ferroviárias.
O presidente da câmara lembra ainda a importância da cidade na história da Revolução Industrial em Portugal: "O Barreiro tem vocação para absorver isto. No seu tempo, a CUF (mais tarde Quimigal) foi uma empresa de tecnologia de ponta e, portanto, há aqui um saber-fazer, que é preciso aproveitar, de gerações mais antigas e mesmo das mais novas; há uma cultura que ainda é muito marcante no Barreiro, e que pode ser útil para toda a actividade económica”.
Em pouco mais de duas décadas, o Barreiro perdeu 20% da sua população, em larga medida devido à desindustrialização do final dos anos 1980. “Temos que dar passos rápidos, porque temos um problema sério, como o envelhecimento da população ou o desemprego, e é necessário retomar a importância económica e social do concelho”, sublinha Carlos Humberto Carvalho.
O adiamento de projectos de obras públicas devido à crise económica e financeira do país, como o TGV e a terceira travessia do Tejo, levou a própria empresa que gere o Parque Empresarial do Barreiro, a Baía do Tejo, a “alterar a sua estratégia, mais virada para as empresas e não na lógica da construção de habitação”, refere Jacinto Pereira.
O líder da administração desta empresa defende ainda a construção do terminal no Barreiro como alavanca económica, não só local e regional, mas também nacional: "Desde 2013, houve uma inversão do saldo entre as empresas que entraram e as que saíram dos parques empresariais”, e isso é explicado com “vários factores como o aumento da confiança na economia”.
A empresa aposta numa lógica de contratos de utilização do território e das infra-estruturas existentes para as empresas, referindo os armazéns já construídos, os espaços a descoberto e novos armazéns adaptados às necessidades dos clientes. No caso do Barreiro, existem ainda outras vantagens para a atracção de novos investimentos esperados com a construção do porto de águas profundas: há uma esquadra da PSP, uma corporação de bombeiros, redes de abastecimento de água, energia eléctrica, saneamento, etc., e dois cais que recebem navios de menor dimensão, nos terminais de líquidos e de granel.
Apesar de os estudos para a construção do porto de águas profundas para navios porta-contentores estarem numa fase adiantada, pouco se conhece do projecto que será revelado, depois de aberto o concurso público para a sua concepção. Contudo, o PÚBLICO, no decurso de uma visita guiada, apurou que ocupará 1.800 metros de extensão de frente ribeirinha e necessitará de uma área de aterro de 135 hectares (equivalente a 135 campos de futebol).
De acordo com as mesmas informações, será reservado um espaço para a construção da futura terceira travessia do Tejo, Barreiro-Lisboa.
Impacto ambiental mínimo, garantem autarquia e Baía do Tejo
Os trabalhos de uma eventual construção do porto de águas profundas no Barreiro levantam, desde já, as maiores preocupações. No leito do Tejo, as dragagens, quer na fase de construção, quer na fase de exploração, irão “desenterrar” grandes quantidades de resíduos industriais perigosos, como metais pesados e outros sedimentos fruto das indústrias localizadas na margem esquerda do rio.
Estes depósitos terão que ser tratados. “Uma boa parte daquele território foi conquistado ao rio e os aterros, na altura, eram feitos com os produtos que restavam das fábricas; as areias que vão ser dragadas têm que ser repostas para o aterro, as contaminadas têm que ser tratadas, mas há soluções técnicas que permitem tratar o que existe”, explica o presidente da Câmara Municipal do Barreiro.
Já Jacinto Pereira, da Baía do Tejo, com base numa caracterização ambiental, garante “não haver algum problema”, considerando que esta é uma oportunidade para, finalmente, se fazer a descontaminação dos solos e do leito do rio. O novo Quadro Comunitário de Apoio prevê o financiamento destes processos de descontaminação.
Muitas reticências face às informações para já disponíveis são, entretanto, colocadas pelos ambientalistas. Carla Graça, vice-presidente da Quercus e responsável da Associação de Conservação da Natureza no distrito de Setúbal, lembra que a área que está a ser pensada para o futuro porto de águas profundas do Barreiro situa-se não muito longe da Reserva Natural do Estuário do Tejo. “Temos que saber exactamente o que está lá depositado; há um passivo ambiental em termos de resíduos, e há um passivo de utilização industrial de várias décadas”, adverte a dirigente da Quercus.
Carla Graça manifesta ainda “estranheza“ pelo facto de o governo ter decidido construir um porto na margem sul do Tejo, “quando já existe um porto em Setúbal e outro em Sines”. Contudo, a Quercus não manifesta oposição ao projecto, ao contrário da posição tomada com a primeira opção, na Trafaria.
O autarca do Barreiro não esconde que o futuro porto implicará um aumento do volume de tráfego, com mais veículos pesados a circularem no concelho, mas considera que os problemas de poluição atmosférica serão também minimizados.
Novo acessos recuperados no projecto da ponte
O novo porto só terá viabilidade e sustentabilidade com novos acessos, que terão que ser construídos com base nalgumas soluções que estavam previstas para a terceira travessia do Tejo.
O presidente da Câmara do Barreiro avança que terá de ser alargado o actual IC-21 (com uma via paralela para o trânsito local) e encara como uma inevitabilidade a construção da há muito sonhada ponte rodoviária Barreiro-Seixal. Outra ligação deverá ser construída, na perspectiva de Carlos Humberto Carvalho, entre o Barreiro e a Ponte Vasco da Gama, bem como três novos nós de acesso na rede viária do concelho. “São obras de alguma envergadura, admito que nem todas sejam executadas”, acrescenta o autarca.
A ferrovia será outra das acessibilidades ao futuro porto de águas profundas. A Baía do Tejo lembra que já existe uma linha férrea antiga, do tempo da CUF, e que é ainda operada por comboios de mercadorias. Será feito um acesso directo ao terminal de contentores a partir da estação da CP do Lavradio.
Quer para a Câmara Municipal do Barreiro, quer para a Baía do Tejo, esta nova plataforma logístico-portuária é considerada uma peça-chave para o desenvolvimento do Arco Ribeirinho Sul. A empresa que gere os parques empresariais diz que também está a ser ponderada a reactivaçao do terminal fluvial do Seixal.
O presidente da câmara do Barreiro acredita que o futuro porto irá imprimir outras dinâmicas ao concelho ligadas à requalificação das margens dos dois rios que abraçam o concelho, Coina e Tejo: “Não desinserimos uma coisa da outra, devolver os rios e as suas margens às populações”, salienta Carlos Humberto Carvalho.