Sonda europeia chegou ao destino e até disse “olá” ao seu cometa
Finalmente a 100 quilómetros de distância do cometa 67P/Churiumov-Gerasimenko, a sonda Roseta que partiu da Terra há mais de dez anos começa a revelar um mundo desconhecido que nos poderá dizer muito sobre o passado do nosso sistema solar.
“Estivemos a aproximar-nos do 67P durante tanto tempo, é quase surreal agora estarmos mesmo lá”, confessa Holger Sierks, chefe da equipa responsável pela câmara Osíris, um dos 11 aparelhos científicos instalados na sonda. “Estamos a abrir um novo capítulo da missão. E já sabemos que vai revolucionar a ciência dos cometas”, acrescenta o investigador, do Instituto Max Planck para a Investigação do Sistema Solar, na Alemanha.
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“Estivemos a aproximar-nos do 67P durante tanto tempo, é quase surreal agora estarmos mesmo lá”, confessa Holger Sierks, chefe da equipa responsável pela câmara Osíris, um dos 11 aparelhos científicos instalados na sonda. “Estamos a abrir um novo capítulo da missão. E já sabemos que vai revolucionar a ciência dos cometas”, acrescenta o investigador, do Instituto Max Planck para a Investigação do Sistema Solar, na Alemanha.
Ter um cometa como objecto de estudo é quase como fazer uma viagem no tempo. Imagine-se que se retirava um pedaço da crosta inicial da Terra e que era conservado até os humanos terem inventado poderosas máquinas para o analisar. A missão da Roseta é essa máquina mas, em vez de analisar a crosta terrestre, a sonda vai estudar um pedaço de matéria formada no início do sistema solar, há cerca de 4600 milhões de anos, que teve a sorte de nunca ter chocado contra outros pedaços maiores para assim formar os planetas.
Um dos objectivos da missão é analisar o gelo e as poeiras que constituem o cometa e procurar moléculas orgânicas. Desta forma, pode-se tentar inferir se os cometas forneceram a água e as moléculas orgânicas que permitiram o aparecimento da vida na Terra.
Desde os primórdios do sistema solar, o 67P andou a dar voltas ao Sol. Em 1959, uma aproximação a Júpiter deu-lhe uma nova trajectória e ele acabou por ser descoberto dez anos depois, por dois cientistas soviéticos que tiveram assim direito a ter os seus apelidos no nome do cometa. Passou então a girar em torno do Sol a cada 6,5 anos, fazendo uma viagem elíptica que começa um pouco para lá de Júpiter e termina a 185 milhões de quilómetros do Sol, entre a Terra e Marte.
Ao aproximar-se do Sol, a radiação solar sublima gelo do núcleo do cometa, pelo que passa directamente do estado sólido ao gasoso e produz uma cabeleira e uma cauda. Ainda assim, o 67P fica demasiado longe do Sol para poder ser visto a olho nu.
Aprovada em 1993, esta missão é o passo seguinte à da sonda Giotto, também da ESA, e que em 1986 ficou apenas a 605 quilómetros de distância do famoso cometa Halley. Lançada a 2 de Março de 2004, a sonda Roseta percorreu desde então 6400 milhões de quilómetros, deu cinco voltas ao Sol e passou junto dos asteróides Steins e Lutécia. Em 2011, a ESA pô-la a dormir e acordou-a em Janeiro deste ano, para a sua chegada ao destino final.
A partir de 7 de Maio, o aparelho utilizou propulsores para fazer dez manobras, desacelerando de uma velocidade de 775 metros por segundo para um metro por segundo em relação ao 67P, que viaja a 55.000 quilómetros por hora e encontra-se agora a 400 milhões de quilómetros da Terra, entre Marte e Júpiter.
Saudação em 23 línguas
Na sua última manobra, quarta-feira de manhã, os propulsores activaram-se durante seis minutos e 26 segundos, colocando a sonda a girar à volta do 67P, a 100 quilómetros de distância. Às 10h30 (hora de Lisboa), a equipa da Roseta, no Centro Europeu de Operações Espaciais da ESA, em Darmstadt, Alemanha, recebeu a confirmação de que a manobra tinha corrido na perfeição. “Chegámos ao cometa”, anunciou então Sylvain Lodiot, responsável pelas operações de voo. “Olá, cometa!”, leu-se depois na conta de Twitter da Roseta em 23 línguas diferentes.
Agora, inicia-se a contagem decrescente até 11 de Novembro, quando o pequeno módulo File, transportado pela sonda, for lançado para aterrar e estudar o 67P. Para isso, falta ainda muita informação. “Sabemos qual é a forma do cometa. Mas não medimos a sua gravidade e ainda não sabemos qual o seu centro de massa”, apontou Andrea Accomazzo, director de voo da missão, à agência Reuters.
Será também necessário encontrar um local plano com um quilómetro quadrado, apropriado para a aterragem do File, que depois de se libertar não pode ser comandado, mas está preparado para cair e embater no solo.
Numa das imagens captadas hoje pela câmara Osíris e divulgada poucas horas depois, vê-se o que parece ser uma pequena planície com relevo acidentado à volta. Tirada quando a sonda estava a 130 quilómetros do pedaço rochoso, nela um pixel representa 2,4 metros. “Nunca ninguém esteve tão perto do núcleo de um cometa. Vêem-se muitos pormenores”, explica Holger Sierks.
Nos próximos meses, a sonda vai continuar a aproximar-se da superfície do cometa, até estar a apenas dois ou três quilómetros, para lançar o File, que transporta dez instrumentos científicos, incluindo um que vai analisar amostras do solo. Os dois aparelhos vão estar em sintonia para fazer o retrato do cometa. Haverá, por exemplo, uma espécie de exame tomográfico para se conhecer o seu interior. Enquanto a missão do File durará entre quatro a seis meses, espera-se que a Roseta continue viva pelo menos até Dezembro de 2015, ao mesmo tempo que o cometa segue em direcção ao Sol, quando poderá ser observado em plena actividade.
Escuro como o breu devido à sua composição, com uma forma que, vista a maiores distâncias, já fez lembrar a de pato de borracha, o 67P/Churiumov-Gerasimenko deixou-nos finalmente ver a sua paisagem extrema. “A Roseta é uma missão única pelo seu objectivo científico – a compreensão das nossas origens, que é seguramente a melhor forma de compreendermos o nosso futuro”, defendeu Jean-Jacques Dordain, director-geral da ESA, citado pela agência AFP.
Inspirado na Pedra de Roseta, descoberta em 1799 e que permitiu decifrar os hieróglifos egípcios, o nome desta missão simboliza a procura de uma descodificação do passado.