BESI e bancos internacionais ligados ao aumento de capital do BES podem ser responsabilizados por perdas de investidores

Banco de Portugal e CMVM travam braço-de-ferro sobre a responsabilidade de cada instituição na autorização do último aumento de capital do BES que gerou elevados prejuízos aos investidores, nomeadamente aos clientes de retalho da instituição.

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Carlos Costa, governador do Banco de Portugal Miguel Madeira

Entre os visados encontram-se o BES Investimento (BESI), o Morgan Stanley, a UBS, a Merrill Lynch, o Citigroup, o J.P. Morgan e o banco Nomura.

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Entre os visados encontram-se o BES Investimento (BESI), o Morgan Stanley, a UBS, a Merrill Lynch, o Citigroup, o J.P. Morgan e o banco Nomura.

A operação que reforçou o capital do antigo BES em 1047 milhões de euros, e que ficou concluída em Maio, serviu para a equipa de gestão liderada por Ricardo Salgado colocar os rácios de capital do ainda segundo maior banco privado acima dos 7% exigidos pelos reguladores. Os fundos foram levantados junto de investidores institucionais, mas também junto de milhares de clientes do retalho que subscreveram as acções a 0,65 cêntimos aos balcões do antigo BES.

Ao contrário dos institucionais que têm acesso a informação relevante e experiência de mercado de capitais, a generalidade dos clientes de retalho do BES, que se tornaram accionistas do banco em Maio, não dispõem de dados completos sobre a instituição e o funcionamento da bolsa. 

O aumento de capital foi tomado firme por um consórcio de bancos de investimento internacionais [ Morgan Stanley, UBS, Merrill Lynch, o Citigroup, J.P. Morgan e Nomura], que incluía o BESI, que receberam 31 milhões de euros, como contrapartida da garantia do sucesso da operação. Tratou-se, aliás, da primeira vez, desde a privatização do banco, no início dos anos 1990, que o grupo recorreu a uma solução de colocação de acções por tomada firme e que os accionistas de referência, o Espírito Santo Financial Group, o Crédit Agricole (que já anunciou perdas com a sua posição no BES), o Bradesco e a PT, não se comprometeram a acompanhar a operação na proporção dos seus investimentos.

Caso a CMVM considere que houve falhas na elaboração do prospecto de emissão do aumento de capital (artigo 149 do Código de Valores Mobiliários) pode responsabilizar os intermediários financeiros. A CMVM pode ainda, se entender, seguindo a lei, investigar se o BESI, liderado por José Maria Ricciardi, colocou e forneceu toda a informação na sua posse aos restantes bancos. 

Apesar de o prospecto de emissão do aumento de capital ter referido a possibilidade de as contas do BES poderem ser alvo de nova revisão e de se admitir a possibilidade de virem a ser apuradas novas "irregularidades materialmente relevantes" no GES - que colocavam a Espírito Santo International numa "situação financeira grave" –, o que agravava a exposição do banco ao universo empresarial dos antigos donos, a procura não se retraiu e o aumento de capital ficou totalmente preenchido.

Só que bastou um mês, a seguir à operação ter sido concretizada [o exercício dos direitos começou a 19 de Abril e terminou a 2 de Maio], para as contas do antigo BES começarem a ser alvo de sucessivas correcções, por ocultação de dados e apuramento de ilicitudes, o que levou a que as acções a caírem, em poucas semanas, de 65 cêntimos para 12 cêntimos.  

A CMVM quer apurar agora se os intermediários financeiros divulgaram toda a informação que possuíam à data dos factos, mesmo as suspeitas que poderiam ter na altura. Quarta-feira passada, ainda antes de ser intervencionado pelo Estado e pelo resto do sector, o BES revelou os maiores prejuízos da história empresarial portuguesa: 3600 milhões de euros (mais do dobro do que era o seu capital), o que obrigou ao resgate de 4900 milhões de euros.

Esta operação está a ser alvo de um braço-de-ferro entre o Banco de Portugal (BdP) e a Comissão do Mercado de Valores Mobiliários (CMVM). Para Carlos Costa a responsabilidade da autorização do aumento de capital do antigo BES e do conteúdo do prospecto é da CMVM, mas Carlos Tavares, através de um comunicado emitido segunda-feira à noite, veio esclarecer que "a CMVM não dispõe de qualquer poder relativamente às decisões sobre aumento de capital de qualquer sociedade".

A decisão cabe aos accionistas e, no caso de instituições de crédito, necessita de ter acordo do Banco de Portugal.” E adianta que, na aprovação do prospecto, à CMVM compete apenas "verificar que toda a informação relevante sobre a sociedade é prestada em termos adequados pelos responsáveis pela elaboração e pelo conteúdo do prospecto.”

O Financial Times já classificou o último aumento de capital do BES como “o mais ruinoso de sempre na indústria financeira” em que “num curto espaço de tempo [em dois meses] os investidores perderam tudo”.  Com o resgate ao ex-BES, dividindo-o em dois, num banco bom (Novo Banco) e num banco tóxico (que mantém a marca BES), para onde transitam os accionistas e detentores de divida subordinada, "os investidores enfrentam a elevada probabilidade de ficarem sem nada."

Para o jornal britânico, o aumento de capital do BES "irá para o topo da tabela dos piores aumentos de capital de sempre na indústria financeira, de acordo com dados recolhidos pela Dealogic". O Financial Times apenas considera na sua análise operações de valor superior a mil milhões de dólares. 

A intervenção no BES requere um esforço de 4900 milhões de euros, através do Fundo de Resolução, para capitalizar o Novo Banco, que fica com os activos bons que eram do BES. Deste valor, 4400 milhões são emprestados pelo Estado ao Fundo, que tem de entrar com 500 milhões. Como actualmente só existem 367 milhões, as instituições financeiras visadas, com destaque para os bancos, terão ainda responsabilizar-se por mais 133 milhões. Nesta terça-feira houve mais uma reunião entre os bancos e o BdP, para acertar algumas questões ligadas à intervenção.

O silêncio da PT
Quem já está a fazer as contas à exposição ao BES são os seus accionistas. Nesta terça-feira, o francês Crédit Agricole, que detinha 14,6% e era um aliado da família Espírito Santo desde a privatização do banco, revelou que teve de registar um impacto negativo de 708 milhões de euros nas suas contas trimestrais. O CEO do banco francês, Jean-Paul Chifflet, avançou que o grupo se sente “enganado por uma família com quem tentou criar uma verdadeira parceria” e anunciou que estão a ser estudadas eventuais medidas legais contra a antiga equipa de gestão do BES.

Já o brasileiro Bradesco anunciou uma perda de 117 milhões de euros, decorrentes da participação de 3,9% que detém no banco português: O maior banco brasileiro adianta que provisionou a 100% a participação no seu parceiro de longa data.

Por parte da PT, dona de 2,1% do “banco mau”, até esta terça-feira a empresa ainda não esclareceu o mercado e accionistas sobre a sua exposição ao BES, algo a que está obrigada, visto tratar-se de operações com partes relacionadas. Fonte oficial da PT SGPS também não quis responder às questões sobre o levantamento dos 128 milhões de euros depositados no BES. A 30 de Junho a operadora revelou que a PT Portugal e a PT International Finance BV (já integradas na Oi) tinham 22 milhões no BES e a PT SGPS 106 milhões. Na segunda-feira, fontes oficiais da PT SGPS e da PT Portugal confirmaram que já não têm esses depósitos, mas não esclarecem quando e porquê realizaram os levantamentos.

Com essas operações, a PT escapou à determinação do Banco de Portugal, que transferiu os depósitos de accionistas com mais de 2% do BES para o “banco mau”. Nem a CMVM, nem o banco central responderam às questões do PÚBLICO sobre se estavam a analisar esta questão, e se tinham pedido mais informações. Com Luís Villalobos, Ana Brito, e Rosa Soares