Ciências sociais: do choque à preocupação no CIES de Lisboa

O orçamento destinado ao funcionamento daquele centro de investigação passaria de 200 mil para 30 mil euros.

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António Firmino da Costa DR

Primeiro, a equipa ficou em choque. Como podia o Centro de Investigação e Estudos de Sociologia (CIES) ter uma classificação tão baixa? O que justificava aquele "bom" na primeira fase do processo de avaliação promovido pela Fundação para a Ciência e Tenologia (FCT), se sempre tivera "excelente"? Depois, diz a socióloga Patrícia Ávila, instalou-se a grande preocupação.

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Primeiro, a equipa ficou em choque. Como podia o Centro de Investigação e Estudos de Sociologia (CIES) ter uma classificação tão baixa? O que justificava aquele "bom" na primeira fase do processo de avaliação promovido pela Fundação para a Ciência e Tenologia (FCT), se sempre tivera "excelente"? Depois, diz a socióloga Patrícia Ávila, instalou-se a grande preocupação.

“As consequências são grandes, não só para nós, mas para todo o sistema científico”, comenta o director, João Sebastião. O orçamento destinado ao funcionamento da estrutura passaria de 200 mil para 30 mil euros. O centro deixaria de atrair estudantes de doutoramento e de pós-doutoramento. Perderia capacidade de se candidatar a grandes projectos de investigação internacionais. “Destruir-se-ia uma equipa de investigação altamente competente e altamente competitiva”, diz.

Avaliado pela FCT em 1996, 1999, 2002 e 2007, o CIES foi sendo classificado de "excelente" e essa apreciação manteve-o entre os centros mais cotados do país. Há uma percepção interna e externa sobre a sua qualidade, sublinha Patrícia Ávila, que ocupa o cargo de subdirectora. Ano após ano, uma comissão externa permanente de aconselhamento científico tem visitado o centro e sempre produziu pareceres positivos. Nem uma palavra sobre isso no relatório de avaliação. Como poderia a qualidade cair?

João Sebastião cita indicadores que contrariam qualquer ideia de perda de qualidade: a publicação de artigos em revistas científicas indexadas passou de 39 para 84 entre 2008 e 2012. Em 2013, alcançou um simbólico número: 100. O centro mantém grande capacidade de captar investigadores estrangeiros: 19 nacionalidade, o que corresponde a 22% dos investigadores integrados. Ali trabalham 100 doutorados a tempo inteiro e mais de 50 investigadores associados.   

Investigadores como António Firmino da Costa até se emocionam ao falar do que lhe parecem ser “erros grosseiros”. Desde logo, os avaliadores parecem acreditar que o CIES ministra cursos de licenciatura e mestrado, quando acolhe estudantes de doutoramento e pós-doutoramento. Depois, duvidam que lhes faculte acesso a revistas científicas, livros, jornais, bases de dados e packages estatísticos, quando o CIES faz parte do ISCTE-IUL, conhecido pelas boas condições de trabalho.

Perplexidade também lhes causou o facto de os avaliadores afirmarem que as temáticas das desigualdades e das imigrações estão “esgotadas em termos de publicações tanto ao nível local como europeu”. São, enfatiza João Sebastião, dois aspectos centrais no país e na Europa de hoje. O CIES tem produzido conhecimento através do Observatório das Desigualdades e do Observatório da Emigração.

Patrícia Ávila lembra que nunca os avaliadores se deslocaram ao CIES. Nunca ninguém os viu. Nem sequer sabem quem são. Toda a avaliação foi feita com base em documentos. Se os “erros” não forem corrigidos, o CIES ficará afastado da segunda fase. “Ficamos limitados na nossa capacidade de argumentar”, diz. Apesar da preocupação, ainda há esperança que tudo se reverta. Grandes nomes de outros centros de investigação já manifestaram a sua indignação com a avaliação.