A mesa perfeita

Ontem, estava eu a escrever, batendo nas teclas e não reparei que o ranger da mesa estava a tentar dizer-me alguma coisa.

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Ontem, estava eu a escrever, batendo nas teclas e não reparei que o ranger da mesa estava a tentar dizer-me alguma coisa.

Já tenho a mesa há mais de três meses. Eu sei porque a mesa é comprida e larga e, para além do meu computador, tinha aproximadamente três meses de livros e tralhas detestáveis (contas) e preciosas (canetas) em cima.

A mesa anterior, onde escrevo há anos, era uma mesa de armar, pequena e tosca, que tinha a grande vantagem de estar à altura certa para escrever.

Sendo a mesa nova (dos anos 40, estilo Almirante Reis) bastante mais alta e atravancada doía-me sempre que escrevia durante mais de uma hora. Mas escrever já é tão cruel sofrimento que admite facilmente quaisquer outros sofrimentos disponíveis.

Estava a decidir a colocação de uma vírgula quando a mesa começou, muito lentamente, a desfazer-se, perna por perna. Levou uns bons dez segundos a espatifar-se no chão, dando-me tempo de fugir do colapso.

"Ai o computador...!", disse em voz alta durante o estrondo. Mas é um Mac e os Macs são difíceis de matar.

A mesa rachou-se o mais que podia: não poderá jamais ser reconstituída. Ainda bem. Não gostava daquela mesa, pretensiosa e ministral. Gosto é desta, da velha. Também já se foi abaixo das canetas três vezes. Mas dá para segurar o computador e deixá-la ir ao chão. Reconstitui-se em dois minutos e não se pensa mais nisso. É melhor.