Abdullah rejeita resultados e declara-se vencedor das presidenciais afegãs
EUA avisam que podem retirar apoio financeiro e militar ao país se alguém tentar tomar poder de forma ilegal.
A tensão política em Cabul, latente desde a segunda volta das presidenciais, a 14 de Junho, subiu de tom depois de a comissão eleitoral ter anunciado que, segundo os resultados preliminares, o antigo ministro das Finanças, Ashraf Ghani, foi o mais votado, com 56,4% dos votos, quando na primeira volta se tinha ficado pelos 31%, muito atrás dos 45% conseguidos por Abdullah.
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A tensão política em Cabul, latente desde a segunda volta das presidenciais, a 14 de Junho, subiu de tom depois de a comissão eleitoral ter anunciado que, segundo os resultados preliminares, o antigo ministro das Finanças, Ashraf Ghani, foi o mais votado, com 56,4% dos votos, quando na primeira volta se tinha ficado pelos 31%, muito atrás dos 45% conseguidos por Abdullah.
Os escrutinadores dizem que votaram 8,1 milhões de afegãos, mais dois milhões do que em Abril, o que explicaria a reviravolta. Mas para Abdullah, que foi ministro dos Negócios Estrangeiros após a queda do regime taliban, estes números mais não são do que a prova de que houve fraude “a uma escala industrial”, com a conivência do Presidente cessante, Hamid Karzai, para garantir a eleição de Ghani.
A comissão eleitoral adiantou que, na sequência de negociações entre candidatos, vão ser reavaliados os votos em mais de 7000 assembleias de voto. Optando por um tom conciliatório, Ghani não reivindicou ainda a vitória e disse nesta terça-feira apoiar “todos os pedidos de Abdullah para uma recontagem e auditoria a votos suspeitos”. Mas Abdullah mantém-se firma na denúncia da fraude.
“Somos os vencedores destas eleições, sem margem para dúvida”, disse o candidato que, em 2009, desistiu de disputar uma segunda volta contra Karzai, denunciando esquemas destinados a garantir a reeleição do único Presidente que o Afeganistão conheceu desde 2001, após a invasão americana.
À sua frente, cerca de três mil apoiantes reunidos dentro da grande tenda habitualmente usada para as reuniões da Loya Jirga (a grande assembleia tribal afegã) gritaram “morte a Karzai, viva Abdullah” e pediram que o candidato declarasse logo ali o seu governo – uma reivindicação que, segundo a BBC, conta com o apoio de alguns governadores, autarcas e poderosos senhores da guerra. Abdullah diz que “não vai ignorar este apelo”, mas pediu aos apoiantes que lhe “dêem alguns dias para consultas e discussões”.
Pouco antes do inflamado comício, em que foi derrubado e destruído um poster com a fotografia de Karzai, o secretário de Estado norte-americano criticou os que sugerem a formação de “um governo paralelo”. “Qualquer acção para tomar o poder por meios à margem da lei custará ao país o apoio financeiro e de segurança dos EUA e da comunidade internacional”, avisou John Kerry. O Afeganistão depende da ajuda externa para quase tudo é essa a principal arma que os aliados têm para pressionar os afegãos – os políticos e as suas redes de interesses clientelares – a não romper com aquela que seria a primeira transição democrática de poder na história do país, a meses da retirada das tropas da NATO.
Os observadores temem que o impasse em torno do desfecho das eleições abra um período de instabilidade e violência, potencialmente explosivo num país regido por lealdades étnicas e tribais (Ghani é pashtun, Abdullah é filho de um casamento misto mas tem a sua base de apoio entre a população tajique).
No comício desta terça-feira, Abdullah assegurou que “não quer uma guerra civil” e, anunciando a ida de Kerry a Cabul na sexta-feira, disse ter recebido garantias de que os EUA “estão ao lado dos afegãos na luta pela justiça”. Segunda-feira, Washington juntou-se à União Europeia na exigência de uma "avaliação exaustiva" das fraudes sem, no entanto, atribuir responsabilidades.