A Europa de hoje é aborrecimento e perdeu a alma, diz Matteo Renzi
Começa esta terça-feira a presidência italiana da UE. Renzi discursa amanhã no Parlamento Europeu. Consta que não falará em “bruxelês”, para os europeus perceberem, e que o tom será marcadamente político.
A primeira prioridade do semestre italiano é o crescimento e o emprego. A segunda é o encorajamento das reformas estruturais nacionais — do Estado ao mercado do trabalho, do sistema político ao combate à corrupção — e o aumento do investimento, os dois pilares da retoma do crescimento. A terceira é colocar na frente a economia real e reforçar a solidariedade. Mas, para ter direito a uma aplicação flexível do Pacto Orçamental, é preciso fazer reformas. E sem flexibilidade na aplicação do Pacto há o risco de provocar recessão.
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A primeira prioridade do semestre italiano é o crescimento e o emprego. A segunda é o encorajamento das reformas estruturais nacionais — do Estado ao mercado do trabalho, do sistema político ao combate à corrupção — e o aumento do investimento, os dois pilares da retoma do crescimento. A terceira é colocar na frente a economia real e reforçar a solidariedade. Mas, para ter direito a uma aplicação flexível do Pacto Orçamental, é preciso fazer reformas. E sem flexibilidade na aplicação do Pacto há o risco de provocar recessão.
Noutra vertente, é fundamental “mudar o discurso europeu”. Cinco anos de crise “com um debate político exclusivamente centrado na austeridade, provocaram um pesado desgaste da União Europeia. (...) Precisamos de restabelecer a confiança entre os Estados membros, ultrapassar o fosso que os cidadãos europeus sentem em relação às instituições da UE. (..) Isto exige uma abordagem global, para lá do economia. Temos de empurrar o discurso europeu para além da pós-crise financeira.” O primeiro grande nó a desfazer é a percepção que muitos europeus têm da UE como entidade longínqua e estranha às suas vidas.
Só retórica?
“Não basta ter uma moeda, um presidente e uma fonte de financiamento em comum. Ou aceitamos um destino e valores comuns ou perdemos o papel da Europa perante si mesma.”
Estas ideias não são propriamente originais. Falta ouvir o discurso de amanhã. É preciso notar que, em Renzi, o tom é particularmente importante. Ele mudou a linguagem política da esquerda italiana e tal foi, ao lado da energia e do activismo, uma das chaves da sua meteórica ascensão ao poder. Explicou aos italianos que o mundo mudou e não se pode hoje governar com as políticas e programas do século XX. Foi aquilo a que a esquerda e os sindicatos mais resistiram. Ele reivindica pertencer à “geração Erasmus”. Também não fala o “bruxelês”. Isto pode fazer muita diferença.
Renzi não tem a veleidade de substituir a chanceler Merkel. O que ele parece pretender é criar uma nova dinâmica na política europeia e fala muito em “mudar os métodos”. Se não tem poder, tem a seu favor uma conjuntura política nova. Após o surto dos populistas e eurocépticos nas eleições europeias de 25 de Maio, sabe que a política europeia não pode deixar de mudar, sob pena de suicídio comunitário.
“As eleições europeias mostraram uma generalizada e ainda não respondida aspiração de mudança”, lê-se no documento italiano enviado ao Conselho Europeu. “A escolha é nossa. Podemos fechar os olhos e esperar que esta aspiração azede, alimentado sentimentos anti-europeus e até xenófobos. Ou poderemos responder às queixas subjacentes. Transformar as escaldantes tensões na Europa em energia positiva.”
A margem de manobra de Renzi é muito estreita. A presidência rotativa não é um poder, é uma oportunidade. “O semestre da presidência italiana arranca num clima difícil, com a disputa dos postos na UE, com um Parlamento acabado de eleger e que viu a afirmação das forças anti-europeias”, declara à AFP Federico Niglia, professor de História Contemporânea na Universidade Luiss de Roma. Para não falar nos grandes focos de crise, como a Ucrânia. Conclui Niglia: “O resultado das eleições europeias é um indicador impossível de ignorar, foi um sinal de alarme.”
A “renzomania”
Há um excesso de expectativas em torno do jovem presidente do Conselho de Ministros italiano. O Figaro fala numa “renzomania à conquista da UE” e aponta-o como a nova “coqueluche” da Europa — o grande comunicador que soube “restituir a confiança a um país deprimido por dois anos de austeridade” e que também soube “seduzir Angela Merkel”. Quer mudar a orientação da Europa.
É evidente que Renzi está a capitalizar as reformas em curso na Itália para reforçar o seu peso na Europa. Não tem grande “experiência europeia”, o que tanto pode ser um handicap como um trunfo. Mas, com Merkel mais preocupada com os riscos políticos da UE, com François Hollande na “mó de baixo”, com David Cameron isolado na sua trincheira nacionalista, Renzi é o melhor colocado para pedir “um pouco mais de solidariedade e um pouco menos de austeridade”.
Interrogava-se há dias o jornal online EUobserver: “Pode o serial killler da política italiana mudar o curso da austeridade na UE?” É um bom título mas algo exagerado.
Nem só de política europeia se vai ocupar Renzi, Na quinta-feira tem uma nova prova de fogo no Senado, exactamente a propósito da reforma da câmara alta. Há grandes reticências dos senadores de Berlusconi e da esquerda do Partido Democrático, de Renzi. Na Itália as reformas estão sempre por um fio.