“Este Mundial teve mais decepções do que equipas a jogar bem”
Paulinho Cascavel abandonou há muito o futebol e dedica-se agora a negócios na área da construção e distribuição.
Foi a algum jogo do Campeonato do Mundo?
Não consegui. Estive recentemente em Curitiba, mas preferi ficar com os amigos a fazer um churrasco e a torcer na televisão, que acaba por se ver melhor o futebol.
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Foi a algum jogo do Campeonato do Mundo?
Não consegui. Estive recentemente em Curitiba, mas preferi ficar com os amigos a fazer um churrasco e a torcer na televisão, que acaba por se ver melhor o futebol.
Está satisfeito com aquilo que o Brasil tem feito até agora?
Espero mais da selecção brasileira. A equipa está a depender ainda muito do Neymar. Praticamente todos os ataques têm que passar pelos pés dele. Mas essa é uma tendência do Mundial, como o Uruguai está dependente do Suárez, a Holanda do Robben. O campeonato está a desenhar-se muito no sector defensivo, com equipas de contra-ataque.
Os Mundiais costumam estabelecer uma certa tendência para o futebol nos anos seguintes. Acredita que os próximos anos vão ser assim: futebol defensivo e apoiado numa grande figura atacante?
Os resultados recentes já têm mostrado isso. As últimas equipas a ganhar na Europa [Liga dos Campeões], o Bayern [de Munique] e o Real Madrid, são equipas que defendem bem e que têm muita velocidade no contra-ataque. Penso que a tendência será essa. Este Mundial teve mais decepções do que equipas a jogar bem. Ninguém imaginava selecções como Portugal, Espanha, Itália e Inglaterra de fora na primeira parte.
O Brasil só será campeão se o Neymar estiver bem, ou Scolari ainda pode melhorar o colectivo?
Vai depender muito do Neymar. Espero que ele esteja bem, que não esteja lesionado nem tome nenhum cartão para avançarmos nestas próximas fases. O Scolari tem o seu sistema de jogo e não gosta muito de mexer na equipa inicial. Na minha opinião, já devia ter tirado o Paulinho. O Daniel Alves também não está numa fase boa e, no ataque, o Hulk ainda não explodiu. Quem o conhece do futebol português, sabe que ele pode fazer muito mais do que fez até ao momento. E há o Fred que, para mim, é o jogador que está mais aquém na selecção toda.
Como é que um avançado que fazia tantos golos vê a prestação do Fred?
Ele vem de praticamente quatro meses parado sem jogar. Num Campeonato do Mundo, é muito difícil chegar sem rimo e conseguir dar a volta, porque são jogos muito rápidos, de cobrança muito forte. Ele é um grande jogador, muito oportunista e espero que marque golos. Mas a selecção tem que mexer em alguns sectores para poder chegar com mais facilidade à final.
Assusta-o a possibilidade de ver a Argentina chegar à final do Maracanã?
Eu acredito que é a final que todos os brasileiros querem: chegar ao Maracanã com a Argentina e ganhar. Eles não assustam, até porque a equipa depende também bastante do Messi. Este Mundial está muito equilibrado. Não vejo nenhuma equipa favorita.
Quais foram as surpresas até ao momento?
A Costa Rica. E a Colômbia, que embora tendo uma boa selecção, não esperava que chegasse com tanta facilidade aos oitavos-de-final, ainda por cima sem Falcão.
Como viu a prestação de Portugal?
Infelizmente, decepcionou. Quem conhece a selecção portuguesa, sabe que tem muito mais para dar. É uma equipa recheada de grandes jogadores, que já provaram o que valem. É verdade que houve lesões que prejudicaram um pouco a equipa, mas a atitude portuguesa, depois daquele jogo com a Alemanha, foi comodista. Faltou um pouquinho daquele querer ganhar. A selecção portuguesa ficou muito à espera que o Cristiano Ronaldo fizesse aquilo que o Neymar está a fazer no Brasil: ir buscar a bola, pegar, partir e ganhar o jogo sozinho.
Mas não é assim que o Cristiano Ronaldo habitualmente funciona.
Ele precisa de espaço, precisa que os companheiros vão alterando, precisa de jogadas de velocidade de um lado e de outro para ele ter espaço. E a selecção portuguesa jogou a passo.
Em Portugal tem-se discutido a questão da preparação. Portugal estagiou em Campinas, sabendo que ia jogar em Brasília e especialmente em Manaus, onde há muito calor. Conhecendo o Brasil, a questão do clima pode ter sido mais um factor problemático?
Não acredito nisso. Quem já jogou sabe que os jogadores estão preparados para essas mudanças grandes. Na Europa é comum estarem a disputar jogos num clima mais quente e, de repente, irem jogar com 10 graus negativos. Campinas é uma região muito boa e não é por causa do clima ou das viagens que mudou alguma coisa.
Como viu os protestos em torno da Copa?
O povo teve um pouco de consciência e soube que esta não era a hora de protestar. Nós temos eleições agora no final do ano e, se alguém quer protestar, proteste nas urnas. Vá la e vote e mostre o seu descontentamento. Eu esperava que houvesse mais confusões, mas a Copa felizmente tem sido um show.
Já fez o exercício de pensar onde é que jogaria no futebol moderno, depois de ter sido o melhor marcador de Portugal por duas vezes?
Eu hoje acho que até jogaria melhor em muitas equipas, até pela falta que tem de pontas-de-lança de raiz. Penso que podia jogar em boas equipas de Portugal como do resto da Europa.
Hoje o que se vê é que os bons jogadores brasileiros acabam por ir jogar para países como a Ucrânia, Rússia ou Turquia, lugares onde se paga melhor. Imaginava-se a jogar num campeonato desses?
Eu preferia estar jogando no centro da Europa, na Inglaterra, na Itália ou na Espanha, que são ligas mais conhecidas e com menos frio. Mas essa é a tendência normal neste momento e esses países têm salários que no centro da Europa dificilmente são pagos.
De todos os anos que passou em Portugal, qual é o momento que mais recorda?
Aquele segundo ano em Guimarães é muito importante, para a cidade e para mim. Eu cheguei e fiquei meia época no FC Porto, onde acabei por não jogar [era suplente de Fernando Gomes] e depois fui para o Vitória. O primeiro foi de ambientação à equipa, mas já fizemos uma grande época, ficando em 4.º lugar e eu fiz 25 golos. Mas o segundo ano foi quando a equipa se reforçou, vieram mais jogadores como o Ademir Alcântara e foi a minha época marcante. 1986-87 foi o meu auge.
Como viu estes últimos anos em que o Vitória passou por um momento tão difícil financeiramente?
Por tradição, é uma equipa que é muito cobrada. Os seus sócios são os mais apaixonados de Portugal, tirando os três grandes, mas a cobrança é muito grande e essa adaptação à falta de dinheiro do clube foi difícil, mas estes dois últimos anos acabaram por ser bons. E, a pouco-e-pouco, vai-se adaptando a uma nova realidade e assim voltar a um lugar que é o dele, que é ali a intrometer-se entre os três grandes.
Ficou feliz com a vitória na Taça de Portugal de 2013?
Sim. Cheguei a Guimarães um dia depois, mas ainda a tempo de comemorar. Os adeptos e a cidade mereciam isso, pelo que o Vitória representa no futebol português.
Depois do Vitória, veio o Sporting, com dois anos bons em Alvalade.
Estive três anos no Sporting. No primeiro ano, fui o melhor marcador do campeonato novamente. Na Taça UEFA jogamos contra o Nápoles [1989-90, triunfo dos italianos no desempate por grandes penalidades, depois de dois empates a zero]
Nápoles de Maradona nessa altura. O que recorda desse jogo?
O penálti ao Ivkovic. O Maradona disse que lhe dava 100 dólares se ele defendesse e ele defendeu. E foi lá ao balneário pagar e o pessoal pegando no pé do Maradona por ele ter apostado. Acabamos por confraternizar depois um bocadinho. Havia muitos brasileiros no Sporting e o Careca e o Alemão no Nápoles.
O Sporting também passou por um processo um pouco semelhante ao do Vitória nos últimos anos. Como viu esta recuperação do Sporting no último ano?
Fiquei muito contente. Além de ter uma ligação muito forte com o clube, o Sporting estava muito fora e isso era mau para o próprio futebol português, que não pode ficar só entregue a Benfica e FC Porto. Espero que o Sporting consiga agora estruturar-se melhor e brigar pelos títulos, que é o lugar onde tem que estar, lutando até às últimas jornadas para ser campeão.
O Paulinho também viveu uma fase conturbada do Sporting e passou por alguma tensão com o Sousa Cintra enquanto presidente.
O Sporting sempre teve problemas directivos. Eu estive lá três épocas e tive três presidentes diferentes (Amado de Freitas, Jorge Gonçalves e Sousa Cintra). O que menos entendia de futebol era o Sousa Cintra e pela maneira de ele ser, não ajudava nada a criar um bom ambiente.