Algo estranho aconteceu a esta selecção portuguesa
Equipa ficou perto da eliminação no Mundial 2014. Dez dos 23 jogadores tiveram problemas musculares desde o início do estágio. Sucessão de lesões é anormal.
O PÚBLICO ouviu especialistas em fisiologia e medicina desportiva, que não quiseram falar muito em concreto da selecção portuguesa, por não terem dados sobre as lesões, mas todos concordam que esta situação é estranha. “[A vaga de lesões] é uma situação anormal. Agora, é preciso perceber caso a caso quais os factores que a desencadearam”, diz José Soares, professor de fisiologia na Faculdade do Porto e antigo preparador físico da selecção e do Boavista. “Isto não é normal em equipa nenhuma”, acrescenta Joaquim Fonseca Esteves, antigo director do Centro de Medicina Desportiva.
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O PÚBLICO ouviu especialistas em fisiologia e medicina desportiva, que não quiseram falar muito em concreto da selecção portuguesa, por não terem dados sobre as lesões, mas todos concordam que esta situação é estranha. “[A vaga de lesões] é uma situação anormal. Agora, é preciso perceber caso a caso quais os factores que a desencadearam”, diz José Soares, professor de fisiologia na Faculdade do Porto e antigo preparador físico da selecção e do Boavista. “Isto não é normal em equipa nenhuma”, acrescenta Joaquim Fonseca Esteves, antigo director do Centro de Medicina Desportiva.
Cristiano Ronaldo, um dos jogadores que mais minutos jogaram durante a época, chegou à selecção com uma lesão muscular na coxa esquerda, além de uma tendinose no joelho esquerdo. Mas não foi o único “cliente” do departamento clínico, que teve de tratar mais nove jogadores por causa de problemas musculares: Beto, Pepe, Raul Meireles, Rui Patrício, Hugo Almeida, Fábio Coentrão, Bruno Alves, Hélder Postiga e André Almeida.
O que pode explicar esta série de lesões anormal, umas em jogadores com muitos jogos, outras em atletas que até nem estavam sobrecarregados? Joaquim Fonseca Esteves explica que, genericamente, há quatro factores que se conjugam para evitar lesões musculares: “a boa hidratação, nutrição adequada, adaptação ao meio e treino adequado.” E José Soares acrescenta que depois há “factores intrínsecos” de cada atleta – como a predisposição para lesões, motivadas, por exemplo, por desequilíbrios entre as duas pernas – e “factores extrínsecos”, como o ambiente ou a relva.
Paulo Rocha, professor de exercício na Faculdade de Motricidade Humana, centra-se particularmente na questão da hidratação. “Pequenas perdas de peso corporal significam uma redução significativa do rendimento desportivo”, diz este técnico do Instituto Português do Desporto e Juventude, explicando que os jogadores podem perder dois quilos por jogo, o que obriga não só a beberem líquidos, mas também reforçarem a bebida com minerais.
A própria alimentação deve ser ajustada, evitando, por exemplo, “comidas condimentadas ou com excesso de sal”, porque “agravam desidratação”, destaca Paulo Rocha, destacando ainda a importância de “privilegiar alimentos mais líquidos, como sopas.”
“E a hidratação não é só no jogo, é diária. Na preparação e em repouso. É importante em todo o processo de estágio”, acrescenta o professor de exercício, explicando que a desidratação se torna particularmente gravosa quando “ocorre dentro das células” dos músculos.
Outro aspecto relevante é o local de estágio. Em 2002, Portugal esteve em Macau, onde conviveu com níveis de humidade superiores aos que encontrou na Coreia do Sul. Correu mal. Desta vez, esteve em Óbidos, Estados Unidos e montou quartel-general em Campinas, que tem um clima um pouco mais fresco do que os locais dos jogos, como Salvador ou Manaus. Paulo Bento já explicou que preferiu dar prioridade à qualidade de treino, algo que faz sentido na análise de Paulo Rocha.
João Pereira, lateral-direito da selecção nacional, disse ontem que a preparação foi adequada e que “se houvesse algo errado lesionavam-se os outros jogadores”: “São lesões diferentes, que não se podem controlar e acontecem no futebol.”
Será mesmo assim? José Soares, por exemplo, diz que não encontra explicação para várias das lesões terem acontecido logo nos primeiros minutos: “É estranho, não consigo encontrar explicação. Só a equipa médica poderá dizer.” Paulo Rocha também fala de “ocorrências que são difíceis de explicar”, embora acredite que a equipa técnica planeou tudo como deve ser, até porque há ferramentas, como testes sanguíneos e de saliva, que permitem ir avaliando a condição dos jogadores e adequar o treino ao momento em que estão. “Estas lesões também são infelicidades”.
Uma explicação que genericamente não convence Fonseca Esteves. “Isto não pode ser uma coisa da Nossa Senhora de Fátima. Estes atletas não têm carências alimentares, nem hídricas. São jogadores profissionais. Não vejo que se possa falar de azares”, diz este médico, acrescentando que quando a prevenção de lesões “não é feita com regras e disciplina, surgem problemas”. Só as equipas técnica e médica da selecção têm todos os dados na mão. Só eles podem dizer, com certeza, o que correu mal. Porque está à vista que algo estranho aconteceu.