Governo enfrenta nova censura com receio do Tribunal Constitucional

Bancadas da maioria começam a acreditar que é possível ganhar as próximas legislativas, mas no Governo há o receio de que um chumbo do Tribunal Constitucional obrigue a nova intervenção da troika.

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Passos explicou ao partido os desafios que o Governo enfrenta Nuno Ferreira Santos

Na maioria há mesmo quem tema um chumbo de grande dimensão capaz de gerar uma hecatombe e a possibilidade de pedir o prolongamento do programa de assistência financeira, que terminou a 17 de Maio, mas cujo fecho oficial da última revisão por parte do FMI só ocorre a 16 de Junho.

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Na maioria há mesmo quem tema um chumbo de grande dimensão capaz de gerar uma hecatombe e a possibilidade de pedir o prolongamento do programa de assistência financeira, que terminou a 17 de Maio, mas cujo fecho oficial da última revisão por parte do FMI só ocorre a 16 de Junho.

Para o Governo, o pior cenário em cima da mesa é se o chumbo aos cortes adicionais dos salários dos funcionários públicos e os das pensões de sobrevivência é retroactivo, obrigando o Estado a devolver as verbas em causa. Situação que abre um buraco orçamental gigante e pode deixar o Executivo “com a corda na garganta”, nas palavras de uma fonte social-democrata.

Nas mãos dos juízes do Palácio Ratton estão os cortes adicionais nos salários do Estado, os cortes nas pensões de sobrevivência e as taxas de 6% sobre o subsídio de desemprego e de 5% sobre as baixas médicas, além do corte nos complementos de pensão a que tinham direito trabalhadores de empresas públicas.

Apesar da derrota eleitoral sofrida no passado domingo e que PSD e CDS reconheceram, os dois partidos ganharam algum fôlego ao ver que os eleitores decidiram não premiar o principal partido da oposição. A bancada socialista ficou, aliás, dividida sobre o sentido de voto da moção de censura, acabando por decidir dar uma "orientação de voto favorável" à iniciativa do PCP (ver pág. 8), que tem o apoio garantido do BE.  

Tanto no PSD como no CDS começa-se a acreditar que é possível ganhar as próximas eleições legislativas. Mas com tonalidades diferentes. Se no partido liderado por Paulo Portas se pede uma governação que dê sinais de que a troika já foi embora e de que o país já não vive “no tempo de excepção”, no PSD Passos Coelho já pôs travão a qualquer tentativa de irresponsabilidade.

"Muitos daqueles que acham que agora que o Programa de Assistência Económica e Financeira acabou e que, portanto, já não precisamos de cumprir o memorando de entendimento e podemos discutir tudo outra vez sem constrangimentos de qualquer espécie são os primeiros a não terem nenhuma consciência do que está em jogo", afirmou o líder do PSD e primeiro-ministro na abertura do Conselho Nacional do partido, na quarta-feira à noite. Uma intervenção que foi aberta à comunicação social, num gesto raro, e em que Passos Coelho deu uma mensagem de alento ao partido, mas com muitos recados internos e até com uma certa dose de mea culpa.

Assumindo que “a seu tempo” o partido se vai posicionar para “ganhar as legislativas”, o líder do PSD falou da necessidade de “aproveitar as condições para dar sustentabilidade aos resultados” e “dar uma maior esperança às pessoas”. Mas travou qualquer ideia de eleitoralismo ao dizer que este esforço “não é importante para o Governo, mas sim para o país”.

A "longa cartilha de deveres"
Lembrando que no Governo “ainda há muito a fazer” até ao final da legislatura, incluindo “corrigir o défice”, o primeiro-ministro não deu como terminado o esforço para “livrar Portugal do resgate financeiro”. E falou da “longa cartilha de deveres”, nomeadamente da reforma do Estado.

No impulso que quis dar aos militantes para a mobilização, Passos Coelho sublinhou a necessidade de ser “humilde” e de “não mostrar embaraço” com o que foi feito. E reconheceu que é preciso “melhorar a comunicação”, “estar mais com as pessoas, com os seus problemas, com os seus dramas” e pediu aos deputados para estarem mais disponíveis nesta nova fase.

A má comunicação do Governo foi aliás uma das poucas críticas ouvidas no Conselho Nacional. Alguns sociais-democratas, que não foram eleitos pela lista da actual direcção, criticaram a garantia do Governo de não aumentar impostos e de, semanas depois, anunciar a subida do IVA no Documento de Estratégia Orçamental. Segundo relatos feitos ao PÚBLICO, Passos Coelho ouviu e respondeu, argumentando que a subida do IVA serve a sustentabilidade da Segurança Social e não é um mero instrumento de consolidação orçamental.

Em vésperas de uma decisão, o Tribunal Constitucional mereceu um alerta na interpretação de alguns sociais-democratas. Passos Coelho pediu aos responsáveis “que têm nas suas mãos “decisões importantes para o futuro do país” que compreendam que a governação dos últimos três anos não foi “porque a troika impôs” mas porque era preciso tirar o país “da beira da insolvência”. E concluiu: “se não compreenderem isto, comprometem as aspirações legítimas de uma recuperação sustentada da economia e de uma recuperação da credibilidade que é necessária no espaço europeu".

A questão do CDS e da coligação pré-eleitoral para as legislativas esteve ausente da reunião da comissão política do PSD, na quarta-feira à tarde, e apenas mereceu algumas palavras por parte de Passos Coelho. A seu tempo, a questão será colocada nos dois partidos, disse o líder do PSD, o que foi interpretado por alguns sociais-democratas como a inevitabilidade da renovação da aliança. Uma coligação que também é defendida no CDS, embora Paulo Portas não pretenda assumi-la para já.