Governo quer legalizar explorações em conflito com normas de ordenamento

Regime para a regularização de fábricas, pedreiras, suiniculturas e unidades de tratamento prevê alteração quase automática de instrumentos de gestão territorial.

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Pedreiras, suiniculturas e aterros estão entre as explorações a regularizar Carlos Lopes (arquivo)

Depois de sucessivos processos de regularização extraordinária no passado, o novo regime traz a novidade de tornar praticamente automática a alteração de planos de ordenamento e de restrições de uso de solo que estejam a impedir a legalização daquelas actividades. Mas as situações serão avaliadas caso a caso e só poderão ser licenciados estabelecimentos que cumpram todas as demais obrigações legais.

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Depois de sucessivos processos de regularização extraordinária no passado, o novo regime traz a novidade de tornar praticamente automática a alteração de planos de ordenamento e de restrições de uso de solo que estejam a impedir a legalização daquelas actividades. Mas as situações serão avaliadas caso a caso e só poderão ser licenciados estabelecimentos que cumpram todas as demais obrigações legais.

O novo regime consta de um decreto-lei que o Governo quer aprovar brevemente, assim que obtenha uma autorização legislativa para tal, solicitada há duas semanas à Assembleia da República. A autorização será discutida e votada esta quinta-feira pelo Parlamento.

A iniciativa partiu do Ministério do Ambiente, Ordenamento do Território e Energia e tem como objectivo resolver conflitos existentes e permitir a viabilização de muitas empresas, melhorando o seu desempenho ambiental e beneficiando economia.

É uma espécie de “limpeza”, num momento em que o Governo está a fazer uma reforma no regime jurídico do ordenamento do território, como uma nova lei de bases e dos solos e outras medidas legais.

“É o momento de gerirmos a realidade que temos”, afirma Miguel de Castro Neto, secretário de Estado do Ordenamento do Território e da Conservação da Natureza. “O nosso objectivo é dizer que esta é a última oportunidade”, completa.

O argumento da “última oportunidade” vem sendo usado pelo menos desde o princípio da década de 1990, quando o Governo acordou com a indústria um “pacto ambiental”, com um prazo para o cumprimento de normas ambientais.

Nos últimos anos, novos processos de regularização extraordinária foram abertos para a indústria, pedreiras, explorações pecuárias e unidades de tratamento de resíduos. Nestes, se todas as normas fossem cumpridas mas houvesse uma incompatibilidade da actividade em causa com instrumentos de gestão territorial – como planos de ordenamento, a Reserva Ecológica Nacional ou a Rede Natura 2000 – então seria solicitada a alteração de tais instrumentos. Nada garantia que as propostas de alteração seriam concretizadas.

Muitas actividades receberam licenças provisórias de funcionamento, mas que acabaram por caducar porque os instrumentos de ordenamento não foram afinal alterados.

O secretário de Estado diz que haverá cerca de 3000 casos em todo o país. Mas outras situações ilegais que não estejam hoje identificadas podem vir a se apresentar à regularização.

Depois de aprovado o novo regime, os interessados terão um ano para pedir a legalização. O pedido faz suspender automaticamente qualquer processo de contra-ordenação que esteja em curso.

O secretário de Estado do Ordenamento diz que não se trata de uma amnistia. “Há um procedimento, há uma avaliação e há uma decisão, que pode ser favorável, desfavorável ou favorável condicionada”, diz Miguel de Castro Neto. “Será avaliado caso a caso o que é possível regularizar”.

As actividades cuja regularização não seja aprovada terão de encerrar no prazo de um ano. E os processos de contra-ordenação serão retomados.

As que forem aprovadas terão dois anos para cumprir eventuais condições para o licenciamento e só então terão o título definitivo de operação. Os processos de contra-ordenação serão arquivados. “Não pagam multas, mas vão fazer investimentos”, afirma Miguel de Castro Neto.

As deliberações serão tomadas através de uma conferência decisória, com representantes de todas as entidades interessadas. Serão levados em conta os interesses económicos, sociais e ambientais e a decisão final será por maioria de votos.

Nos termos da proposta de decreto-lei, uma decisão favorável ou favorável condicionada obriga as entidades competentes a “promover a alteração, revisão ou elaboração dos instrumentos de gestão territorial em causa, no sentido de contemplar a regularização do estabelecimento ou exploração”. E se a alteração não for feita em tempo útil, os instrumentos podem ser parcialmente suspensos. O Governo pode, no entanto, opor-se à alteração.

O mesmo vale para outras restrições de uso do solo: perante decisões favoráveis a uma actividade, terão de ser alteradas. Caso contrário, a decisão em si passa a ser suficiente para o reconhecimento do relevante interesse público da exploração ou estabelecimento, o que abre a porta à ocupação de áreas interditas a determinadas actividades.

As decisões favoráveis dependerão do reconhecimento do interesse local da exploração, aprovada em assembleia municipal.

Apesar de ser mais um processo de regularização extraordinária, depois de outros que não funcionaram como se imaginava, Miguel de Castro Neto está convencido de que este será diferente, sobretudo pelas deliberações serem tomadas em conferência decisória. “Nunca houve um processo com esta abordagem", diz.