Plataforma online permite que doentes façam exercícios cognitivos em casa

No Dia Mundial da Esclerose Múltipla o PÚBLICO foi conhecer o Cogweb, um sistema online que facilita a ligação entre médicos e doentes.

Foto
Imagem de alguns dos exercícios possíveis DR

O neurologista Vítor Cruz, do Centro Hospitalar Entre o Douro e Vouga (CHEDV), que lidera o projecto conjuntamente com a neuropsicóloga Joana Pais, do mesmo centro hospitalar, explica ao PÚBLICO que a ideia nasceu da necessidade de trabalhar a parte cognitiva com pessoas com doenças tão diferentes como a esclerose múltipla, Alzheimer, Parkinson, esquizofrenia, depressão, acidentes vasculares cerebrais e traumatismos crânio-encefálicos muitas delas em idade activa.

A verdade faz-nos mais fortes

Das guerras aos desastres ambientais, da economia às ameaças epidémicas, quando os dias são de incerteza, o jornalismo do Público torna-se o porto de abrigo para os portugueses que querem pensar melhor. Juntos vemos melhor. Dê força à informação responsável que o ajuda entender o mundo, a pensar e decidir.

O neurologista Vítor Cruz, do Centro Hospitalar Entre o Douro e Vouga (CHEDV), que lidera o projecto conjuntamente com a neuropsicóloga Joana Pais, do mesmo centro hospitalar, explica ao PÚBLICO que a ideia nasceu da necessidade de trabalhar a parte cognitiva com pessoas com doenças tão diferentes como a esclerose múltipla, Alzheimer, Parkinson, esquizofrenia, depressão, acidentes vasculares cerebrais e traumatismos crânio-encefálicos muitas delas em idade activa.

“O modelo de acesso a consultas presenciais era insustentável e não havia regularidade suficiente para a reabilitação cognitiva, pelo que acabava por ser muito ineficaz”, refere o médico, que na sexta-feira apresentou a várias associações de doentes o Cogweb, que deu os primeiros passos em ambiente clínico em 2007 e que está agora a ser adaptado para castelhano e inglês para ser disponibilizado no estrangeiro.

Para contornar as dificuldades de fazer este trabalho presencialmente, seja para evitar deslocações dos doentes ou por ser impossível ter profissionais de saúde em número suficiente, Vítor Cruz e Joana Pais optaram então por desenvolver, em parceria com outros colegas, um modelo em que os doentes pudessem fazer através da Internet os exercícios prescritos pelos profissionais de saúde e que são “adaptados a cada doença e ao estado do doente”.

Se numas situações o objectivo é a recuperação de capacidades perdidas, noutras o importante é “travar a progressão da doença”. Em todos os casos, quando o utilizador piora os resultados nos testes, é lançado um alerta para que o médico ou neuropsicólogo responsável pelo doente o convoque para uma avaliação presencial.

“Se um doente fizer exercícios seis horas por semana, isso representa 15 vezes mais do que o que conseguíamos fazer presencialmente e equivale quase a 50 mil horas de trabalho de um psicólogo que seriam necessárias”, ilustra o neurologista.

Conjugar o tratamento com o trabalho
No caso de Patrícia, a esclerose múltipla diagnosticada em 2001 trouxe novas sequelas há um ano, quando um surto juntou às vertigens alguns problemas de memória e de marcha. De baixa, divide-se entre a fisioterapia e os exercícios cognitivos para a memória e atenção.

“Agora não estou a trabalhar, mas o método é excelente quando se é activo, pois em qualquer sítio com Internet posso fazer uns 30 minutinhos por dia do plano que me é proposto e noto melhorias”, adianta. Nesta quarta-feira assinala-se o Dia Mundial da Esclerose Múltipla, que neste ano é precisamente dedicado ao acesso à inovação e à informação. Ao todo, em Portugal, a doença inflamatória do sistema nervoso central afecta cerca de 5000 pessoas, a grande maioria em idade activa, entre os 20 e os 40 anos.

Memorizar uma lista de palavras e reproduzi-la em seguida, ver cubos a acender no ecrã e decorar a sequência para depois fazer igual, fazer um puzzle com imagens que aparecem no ecrã ou seleccionar uma imagem que esteja de acordo com uma frase apresentada são alguns dos exercícios disponíveis. A grande diferença para outras ofertas deste género que já existem, sublinha Vítor Cruz, é que neste caso a “receita” é dada pelo médico ou psicólogo responsável por cada doente. Além disso, o sistema está preparado para gerar gráficos a partir dos resultados e para criar alertas sempre que o desempenho não esteja de acordo com o que é suposto. Um artigo que acaba de ser publicado no Journal of Medical Internet Research com resultados do projecto dá também resultados animadores: 83% das pessoas cumprem na totalidade os planos previstos e a idade não é uma barreira na hora de utilizar a plataforma.

Neste momento o Cogweb já conta com mais de 1000 doentes em todo o país. Cerca de 30% dos utilizadores do sistema são pessoas que tiveram acidentes vasculares cerebrais e traumatismos cranianos, 30% são pessoas com várias demências e 20% com esclerose múltipla. Uma das prioridades foi dar formação a outros profissionais de saúde, pelo que o sistema já está disponível em vários hospitais e clínicas, num total de 40 unidades. Se o doente aceder ao sistema através dos hospitais do Serviço Nacional de Saúde não paga nada, ficando a cargo da instituição um pagamento mensal de seis euros por cada doente que utiliza os exercícios. Para acessos particulares, o Cogweb encaminha os interessados para uma avaliação neuropsicológica e o doente paga 40 euros por mês ou 190 euros por seis meses.

A equipa do Cogweb está agora a trabalhar também num novo sistema, o Brain on Track, que se destina a avaliar os riscos cognitivos em populações mais alargadas, de forma a ser feito um diagnóstico precoce, e que está, neste momento, a ser alvo de uma experiência piloto no Porto.