Hoje é o Dia Mundial de quê?
Quero criar o Dia Mundial Do Estranho. Infelizmente para nós, que já nos esquecemos de como é, não creio que fará muita diferença
Nos últimos tempos tenho vindo a aperceber-me de que se andaram a inventar dias para tudo. Parece que há sempre um bom motivo para comemorarmos, sejam eles coisas nobres, como o Dia dos Avós (ao menos, aos que nunca lhes dão atenção, sempre lhes dá para pegar no telefone nesse dia) ou outros como o Dia das Zonas Húmidas. Pronto, desculpem-me a piada fácil, bem sei que tem distintos motivos, mas parece-me que estamos claramente perante uma má escolha de nome. Mas continuando: existem mesmo muitos Dias de Coisas. Desde o Dia dos Namorados, ao Dia do Turista, ao da Criança, ao da Energia e, depois, há um Dia que não existe.
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Nos últimos tempos tenho vindo a aperceber-me de que se andaram a inventar dias para tudo. Parece que há sempre um bom motivo para comemorarmos, sejam eles coisas nobres, como o Dia dos Avós (ao menos, aos que nunca lhes dão atenção, sempre lhes dá para pegar no telefone nesse dia) ou outros como o Dia das Zonas Húmidas. Pronto, desculpem-me a piada fácil, bem sei que tem distintos motivos, mas parece-me que estamos claramente perante uma má escolha de nome. Mas continuando: existem mesmo muitos Dias de Coisas. Desde o Dia dos Namorados, ao Dia do Turista, ao da Criança, ao da Energia e, depois, há um Dia que não existe.
Não existe porque também eles deixaram de existir. Porque ninguém se lembra deles, porque deixou de importar, porque deixámos de nos importar. Mas quando somos crianças isto não é nada assim. Se vejo alguém do meu tamanho sentado no chão a brincar, eu pego nas minhas bonecas e junto-me a ele. Porquê? Porque a dois é mais divertido. É tão simples quanto isto. Então, se todos os dias passas por aquele senhor amoroso que mantém o mesmo bigode há anos, e que vês sentado no mesmo banco de jardim todos os dias, porque é que não é simples dizeres-lhe "Olá"? Sabes se é viúvo, se tem filhos a léguas de distância, se sofre de alguma doença ou se, simplesmente, não se lembra da última vez que conheceu alguém? Não sabes. Não sabes porque, simplesmente, não te lembras que ele existe.
O que antes era simples agora passou a ser outra coisa. Esquecemo-nos de nos lembrar dos outros, perdemos a consciência da existência de outras vidas para além daquelas que se cruzam directamente com a nossa. Embora nada disto pareça capaz de travar a criação de elos nas redes sociais, nas quais somos capazes de perder bem mais do que meia hora diária em busca da fotografia perfeita e do "tweet" regado a humor com rigor para impressionar o maior número de desconhecidos. Mas nunca nos damos conta de que pode ser tão simples fazer a diferença na vida de outra pessoa perdendo, apenas, cinco minutos. Cinco minutos sem filtros, sem máscaras, sem tretas. Só tu e eu, cara a cara.
Posto isto, a minha proposta é esta: quero criar o Dia Mundial Do Estranho. Infelizmente para nós, que já nos esquecemos de como é, não creio que fará muita diferença. Mas se aos mais novos pararmos de roubar a capacidade inata de criar elos e ligações de uma forma espontânea, daqui a uns 50 anos poderemos vir a ter uma sociedade verdadeiramente humana. Se ao ímpeto bom do coração de uma criança juntarmos o incentivo de, ao menos um dia por ano, sair para a rua com vontade de dar afecto e atenção sem esperar nada em troca, isto pode vir a ter um poder verdadeiramente transformador no mundo.
Num desses dias, daqui a 50 anos, eu perguntarei ao meu filho: “Então, quem vais cumprimentar hoje?” “Acho que ele se chama José. Costumava vê-lo com uma senhora, mas agora está sempre sozinho. Acho que vai gostar de receber a flor que desenhei para ele.”
Aceitam-se propostas de dias.