Seguro “não se resguardou” e coligação fez campanha anti-Sócrates

O PS e a CDU foram subindo a fasquia nas duas semanas de campanha eleitoral, e acabaram por disputar a ideia de moção de censura ao Governo. Já a campanha da coligação foi morna, com altos e baixos, e a do Bloco de contenção: pedem apenas um eurodeputado. Ideias para um balanço de campanha.

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José Maria Ferreira

De um inicial discurso cauteloso em que Assis falava da vitória como ter “mais um voto” que a direita, começou a ser expressa a expectativa de que a “abada” que Alegre pediu em Coimbra estava perto de se concretizar. A cautela dos cinco pontos de avanço passou para os dez. E ontem já se falava em 40% para os socialistas lá para o Largo do Rato. Uma postura arriscada de quem colou as europeias às legislativas, pedindo aos portugueses que encarassem as eleições como um teste aos três anos de Governo. Colocando assim sobre o PS a pressão de ser o vencedor a 25 de Maio

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De um inicial discurso cauteloso em que Assis falava da vitória como ter “mais um voto” que a direita, começou a ser expressa a expectativa de que a “abada” que Alegre pediu em Coimbra estava perto de se concretizar. A cautela dos cinco pontos de avanço passou para os dez. E ontem já se falava em 40% para os socialistas lá para o Largo do Rato. Uma postura arriscada de quem colou as europeias às legislativas, pedindo aos portugueses que encarassem as eleições como um teste aos três anos de Governo. Colocando assim sobre o PS a pressão de ser o vencedor a 25 de Maio

De certa forma, a campanha reflectiu isso mesmo. A passagem de Assis pelo país começou discreta, com uma coluna pequena com poucas bandeiras e sem bombos. A partir do comício do Porto, os números de apoiantes nas iniciativas foi crescendo.

A Convenção Novo Rumo foi o momento alto da campanha socialista. Preparada ao pormenor entre Jorge Coelho e o próprio secretário-geral, permitiu aos socialistas marcar o mítico dia 17 (da suposta saída da troika) que o Governo pretendia para si. Os anúncios de apoios à esquerda e direita – Renovação Comunista, Joana Amaral Dias e António Capucho – encaixaram na estratégia de apresentar o PS como um pólo agregador do descontentamento.

A apresentação das linhas gerais do programa eleitoral – o Contrato de Confiança - permitiu responder à crítica de que não tinha propostas. Batendo certo com as prioridades definidas – tanto para Portugal como para a Europa – do emprego e crescimento económico. Seguro prometeu acabar com cortes nas pensões, suportado num Pacto para o Emprego , e avançou com o ambicioso plano de Reindustrialização  4.0 para o país.

Embalados, os dirigentes do PS foram elevando a fasquia. Em Fafe, a quatro dias do voto, Seguro carregou no acelerador. Depois de relatar um apelo de um eleitor para “correr” com o Governo, o momento era “agora”. A mensagem derrapou para moções de censura e estratégias pós-eleitorais de pressão sobre Cavaco Silva para antecipar as legislativas.

Mas a gestão dos apoios internos já não foi tão bem conseguido. Os episódios da comparência de José Sócrates e Mário Soares feriram a transmissão da mensagem de unidade que Assis pretendia trazer para as ruas.

Campanha em circuito fechado
Em contraponto, a campanha da coligação, sem a máquina “laranja” de outros tempos, foi o espelho do desânimo geral. Visitas atrás de visitas a fábricas, centros paroquiais e poucas acções de rua. No período oficial, a campanha arrancou sem uma ideia forte, combativa.

Foi preciso José Sócrates descer à campanha socialista para a coligação ter o pretexto de condenar “quem trouxe a troika”. Um osso que PSD e CDS não largaram à espera de que os seus eleitores tradicionais, na hora de pôr a cruzinha, se arrepiem com a imagem desta sexta-feira de Sócrates em ombros entre os socialistas. Não faltaram calafrios nesta campanha. Viessem da contestação nas ruas às medidas de austeridade do Governo ou mesmo de dentro do PSD. O ex-líder Marcelo Rebelo de Sousa apareceu para jantar mas serviu um prato frio a Paulo Rangel e Nuno Melo. Apelou ao voto em Jean-Claude Juncker. Só. Como um duche gelado.

Só ontem, no penúltimo dia de campanha, os candidatos da coligação conseguiram a moldura humana de rua que não tinham alcançado até então. Foi no Chiado, numa descida da emblemática rua de Lisboa onde o PS fecha todas as suas campanhas, como a pedir meças ao maior partido da oposição (ver página 6).

CDU ganha confiança
Em 2009 a CDU tinha a pedalada imparável de Ilda Figueiredo e João Ferreira, número dois, estava na sua sombra. Agora, empurrado para a boca do palco aos 35 anos e sem carreira política antes do primeiro mandato no Parlamento Europeu, passou nas ruas quase como um desconhecido, mesmo nos territórios comunistas.

Por isso precisou, por exemplo, da ajuda do líder parlamentar João Oliveira em Évora, e a campanha ganhou uma enorme animação sempre que Jerónimo de Sousa apareceu a seu lado. A João Ferreira ainda falta ganhar à-vontade para o contacto na rua e elasticidade para adaptar (e diversificar) o discurso a cada audiência. A Inês Zuber, a número dois, falta simplesmente aparecer.

A estratégia da campanha da CDU passou por uma multiplicação de agendas para “estar em mais sítios”: o líder do PCP teve programa paralelo ao candidato com banho de multidão em freguesias comunistas. E as células do partido fizeram o trabalho de formiga em contactos porta a porta, onde até se ensinam muitos idosos a ler um boletim de voto.

Foi isso - e não sondagens de empresas - que permitiu à coligação subir o tom do discurso na segunda-feira à noite, quando João Ferreira anunciou a “real possibilidade” de eleger o terceiro eurodeputado e admitiu até um quarto eleito. Em 2009 ficaram a escassas décimas do terceiro.

Os ataques ao PS foram uma constante e os comunistas apanharam mesmo os socialistas na curva ontem, quando admitiram apresentar uma moção de censura ao Governo se a direita sair com uma derrota expressiva no domingo – decisão que o PS não teve ainda coragem de tomar.

Desafio humilde do BE
Por seu lado, o desafio que o BE impôs si próprio desde o início foi humilde. Partiu para esta campanha longe da fasquia dos três deputados ao Parlamento Europeu que conseguiu em 2009, e definiu como único objectivo para cantar vitória a reeleição de Marisa Matias, agora cabeça de lista.

Sem descartarem o desafio um segundo eurodeputado, os líderes do partido, mas também o ex-coordenador Francisco Louçã, encarregam-se de arrefecer os ânimos quando o entusiasmo dos apoiantes aquecia. Na recta final da campanha, os discursos já eram de um lugar garantido em Bruxelas. Apenas um.

Com o referendo ao Tratado Orçamental como bandeira, o Bloco foi lançando farpas ao PS da “austeridade fofinha” e acenando com o perigo destas eleições significarem um embalo para um governo de bloco central em 2015. Há uma saída: Uma “derrota estrondosa” da direita nas urnas. Com uma nota curiosa nos últimos dias: O BE fará, em jeito de promessa, as "alianças" e "pontes" que forem necessárias para derrotar a austeridade.