D’Alva a chegar, D’Alva a bater
Ben Monteiro tinha uma banda de punk alinhada com as bandas punk banhadas pelo sol da Califórnia, os Triplet. Alexandre D’Alva Teixeira adorava os Triplet e, como os adorava, aquele dia haveria de chegar. Alex organizava concertos na Moita, a cidade em que nasceu. Fazia-o com dois objectivos: “Trazer bandas de que gostava à minha comunidade e fazer as primeiras partes dessas bandas.” E é então, naquele contexto, que Ben encontra Alex. “Ganhei logo admiração por ele”, conta o primeiro. “Estávamos num bar cheio de metaleiros com tatuagens e bandas com pessoal que berra e ele aparece com a banda dele, que soava a Bloc Party em português. Estava vestido de branco da cabeça aos pés e é um preto deste tamanho. Fiquei a pensar que ou ele tinha grandes cojones ou havia ali qualquer coisa que não batia bem.” Ben perceberia depois que era uma “mistura das duas coisas”, sentencia com uma gargalhada.
Assim começou a história que, chegada a este ponto em que Alex e Ben são o duo D’Alva que, depois de se apresentar com alguns singles, se prepara para editar na próxima segunda-feira, pela renovada Optimus Discos, o álbum de estreia #batequebate, não regista sinais de Bloc Party ou punk banhado pelo sol da Califórnia. Isto é pop, totalmente pop, convictamente pop. Isto é o mundo enquanto caleidoscópio, que é a imagem fragmentada que a Internet e as suas redes sociais nos devolvem. Dos anos 1980 mais sintéticos ao hip-hop enquanto festa na pista de dança; do Portugal dos Heróis do Mar ou dos GNR às licões de Prince quando 1999 era muito distante; da electrónica subterrânea movida a riff de sintetizadores (com a convidada Capicua a incitar: “Vamos fazer barulho!”) à melancolia feita de farrapos de R&B que ouvimos num Franck Ocean — tudo isto filtrado pelas lentes de quem está absolutamente imerso no seu tempo. Confirmemo-lo no próximo Optimus Alive, onde os D’Alva se apresentarão em dose dupla, dia 11 e dia 12 de Julho (no primeiro concerto acompanhados pelo Gospel Collective, no segundo em formato redux no Coreto, “num misto de live performance com feel de DJ set”).
“A música que estamos a fazer é como um Tumblr [plataforma de micro-blogging que permite partilhar on-line conteúdos multimédia]”, compara Ben Monteiro. “Agrupam-se coisas que parecem não ter relação entre si, mas ao veres o quadro completo sobressai uma identidade. Tens um filme a preto a branco, depois uma cena do Vanilla Sky, depois O Príncipe de Bel-Air, a seguir uma foto de um padrão de leopardo, depois um 3D manhoso.” O foco central, insistem, está nessas três letras que compõem a expressão mágica: P-O-P.
Sem preconceitos
Quando Alex D’Alva Teixeira editou o EP Isto Não É Um Projecto, pela Flor Caveira (Ben agia ainda como guia musical, produtor e companheiro de palco), disseram-lhes numa entrevista de rádio que o EP era “vá lá, pop”. Afirmaram-no a medo, contam, “como se fosse uma palavra feia”: “Isso deu-nos ainda mais vontade. Não temos medo da palavra, não precisamos de nos camuflar no indie-pop ou no synth-pop — a pop só parece ser validada se tiver prefixo”, comenta Ben. E depois acrescenta: “Decidir fazer pop como fazemos, quando o fizemos, foi uma atitude punk-rock.”
Há dez anos a separar o rapaz dos vintes Alex D’Alva Teixeira e o trintão Ben Monteiro. À parte esse facto, há muito a ligá-los. As origens (são ambos filhos de pai africano e mãe nascida no Brasil), o crescimento no seio da Igreja Evangélica (Alex na Moita, Ben em Carcavelos), o trabalho profissional na área do design, a ligação à editora Flor Caveira e, claro, a música que os rodeou desde muito novos. “A minha mãe tocava guitarra na igreja e eu ouvia muita música em casa. Daí a aprender a tocar um instrumento ou a querer cantar foi um salto”, recorda Alex. Momento definidor 1: ver Michael Jackson na televisão. Momento definidor 2: a chegada dos Nirvana (“Depois disso, pensei ‘quero ter uma banda rock’ e comecei a fazê-las com os meus amigos ou com a minha irmã mais nova”). Ben, por sua vez, complementava a música que brotava pela casa (“Há sempre um violão em qualquer casa de famílias brasileiras”) com a rotação de êxitos na rádio, que ouvia horas e horas a fio. Liga-os também a passagem de música electricamente ruidosa, em contexto rock (Ben Monteiro nos já citados Triplet ou nos Lacraus; Alex nos Cast a Fire), para esta garrida luminosidade em que os encontramos hoje. A mudança resultou de uma tomada de consciência. “Tal como existem várias cores, também existem várias texturas diferentes na música e formas diferentes de ela ser composta e tocada”, aponta Alex. “[Decidimos que] Não havia barreiras, apenas balizas para não nos perdermos e estarmos focados naquilo que era a nossa linguagem, mas tínhamos o terreno livre para explorar.”
#batequebate, a começar pelo título em hashtag — palavra chave que serve para indexar tópicos de discussão nas redes sociais —, mostra o que ambiciona ser. A capa é tropicalista, a produção é cheia, preenchida, a música apresenta-se com essa Frescobol (que no Brasil designa ténis de praia) tão colorida e apelativa quanto a capa (batida metronómica, sintetizadores a esvoaçarem), tem guitarra picada e batida robótica em Lugar estranho, comentário à vida enquanto avatar on-line (“É mais fácil escolher o que queremos ser/ e o resto esconder”) e há-de mostrar guitarras bem expostas nessa homenagem ao espírito dos Beastie Boys que é Barulho. No fim, diminuem as rotações, desaparece o sol no horizonte e a música torna-se nocturna, pop ainda, mas atacada de melancolia digital (Homologação, Primavera). Alex descreve a viagem de uma forma curiosa: “Acho que começas como o gajo fixe do Facebook e acabas como a amiga chata que se lamenta no mural ‘ah, hoje preciso do meu namorado’ e ninguém quer saber.
#batequebate é música enquanto comunicação instantânea, um festim lúdico que vai decorrendo em várias divisões de um mesmo edifício. As canções sucedem-se na sua diversidade, rápidas e fugazes, e os D’Alva, disco cá fora, não têm ambição desmedida. “Tenho mudanças muito bruscas de humor e quando ouço este disco há uma canção, a Aquele momento, que funciona como anti-depressivo”, conta Alex. “Juro que ouço-a todos os dias antes de entrar no escritório. Se estes quatro anos [desde o início da colaboração com Ben] serviram só para esta canção existir, great. Espero que a nossa música possa ter esse efeito noutras pessoas.” Quanto a Ben, só tem um desejo: “Que toda a gente possa dar uma escutadela ao disco pelo menos uma vez, sem preconceitos, e que depois decida se gosta ou não. Se o fizerem, já fico feliz.”
Os D’Alva só querem que bata o #batequebate.
A verdade faz-nos mais fortes
Das guerras aos desastres ambientais, da economia às ameaças epidémicas, quando os dias são de incerteza, o jornalismo do Público torna-se o porto de abrigo para os portugueses que querem pensar melhor. Juntos vemos melhor. Dê força à informação responsável que o ajuda entender o mundo, a pensar e decidir.
Ben Monteiro tinha uma banda de punk alinhada com as bandas punk banhadas pelo sol da Califórnia, os Triplet. Alexandre D’Alva Teixeira adorava os Triplet e, como os adorava, aquele dia haveria de chegar. Alex organizava concertos na Moita, a cidade em que nasceu. Fazia-o com dois objectivos: “Trazer bandas de que gostava à minha comunidade e fazer as primeiras partes dessas bandas.” E é então, naquele contexto, que Ben encontra Alex. “Ganhei logo admiração por ele”, conta o primeiro. “Estávamos num bar cheio de metaleiros com tatuagens e bandas com pessoal que berra e ele aparece com a banda dele, que soava a Bloc Party em português. Estava vestido de branco da cabeça aos pés e é um preto deste tamanho. Fiquei a pensar que ou ele tinha grandes cojones ou havia ali qualquer coisa que não batia bem.” Ben perceberia depois que era uma “mistura das duas coisas”, sentencia com uma gargalhada.
Assim começou a história que, chegada a este ponto em que Alex e Ben são o duo D’Alva que, depois de se apresentar com alguns singles, se prepara para editar na próxima segunda-feira, pela renovada Optimus Discos, o álbum de estreia #batequebate, não regista sinais de Bloc Party ou punk banhado pelo sol da Califórnia. Isto é pop, totalmente pop, convictamente pop. Isto é o mundo enquanto caleidoscópio, que é a imagem fragmentada que a Internet e as suas redes sociais nos devolvem. Dos anos 1980 mais sintéticos ao hip-hop enquanto festa na pista de dança; do Portugal dos Heróis do Mar ou dos GNR às licões de Prince quando 1999 era muito distante; da electrónica subterrânea movida a riff de sintetizadores (com a convidada Capicua a incitar: “Vamos fazer barulho!”) à melancolia feita de farrapos de R&B que ouvimos num Franck Ocean — tudo isto filtrado pelas lentes de quem está absolutamente imerso no seu tempo. Confirmemo-lo no próximo Optimus Alive, onde os D’Alva se apresentarão em dose dupla, dia 11 e dia 12 de Julho (no primeiro concerto acompanhados pelo Gospel Collective, no segundo em formato redux no Coreto, “num misto de live performance com feel de DJ set”).
“A música que estamos a fazer é como um Tumblr [plataforma de micro-blogging que permite partilhar on-line conteúdos multimédia]”, compara Ben Monteiro. “Agrupam-se coisas que parecem não ter relação entre si, mas ao veres o quadro completo sobressai uma identidade. Tens um filme a preto a branco, depois uma cena do Vanilla Sky, depois O Príncipe de Bel-Air, a seguir uma foto de um padrão de leopardo, depois um 3D manhoso.” O foco central, insistem, está nessas três letras que compõem a expressão mágica: P-O-P.
Sem preconceitos
Quando Alex D’Alva Teixeira editou o EP Isto Não É Um Projecto, pela Flor Caveira (Ben agia ainda como guia musical, produtor e companheiro de palco), disseram-lhes numa entrevista de rádio que o EP era “vá lá, pop”. Afirmaram-no a medo, contam, “como se fosse uma palavra feia”: “Isso deu-nos ainda mais vontade. Não temos medo da palavra, não precisamos de nos camuflar no indie-pop ou no synth-pop — a pop só parece ser validada se tiver prefixo”, comenta Ben. E depois acrescenta: “Decidir fazer pop como fazemos, quando o fizemos, foi uma atitude punk-rock.”
Há dez anos a separar o rapaz dos vintes Alex D’Alva Teixeira e o trintão Ben Monteiro. À parte esse facto, há muito a ligá-los. As origens (são ambos filhos de pai africano e mãe nascida no Brasil), o crescimento no seio da Igreja Evangélica (Alex na Moita, Ben em Carcavelos), o trabalho profissional na área do design, a ligação à editora Flor Caveira e, claro, a música que os rodeou desde muito novos. “A minha mãe tocava guitarra na igreja e eu ouvia muita música em casa. Daí a aprender a tocar um instrumento ou a querer cantar foi um salto”, recorda Alex. Momento definidor 1: ver Michael Jackson na televisão. Momento definidor 2: a chegada dos Nirvana (“Depois disso, pensei ‘quero ter uma banda rock’ e comecei a fazê-las com os meus amigos ou com a minha irmã mais nova”). Ben, por sua vez, complementava a música que brotava pela casa (“Há sempre um violão em qualquer casa de famílias brasileiras”) com a rotação de êxitos na rádio, que ouvia horas e horas a fio. Liga-os também a passagem de música electricamente ruidosa, em contexto rock (Ben Monteiro nos já citados Triplet ou nos Lacraus; Alex nos Cast a Fire), para esta garrida luminosidade em que os encontramos hoje. A mudança resultou de uma tomada de consciência. “Tal como existem várias cores, também existem várias texturas diferentes na música e formas diferentes de ela ser composta e tocada”, aponta Alex. “[Decidimos que] Não havia barreiras, apenas balizas para não nos perdermos e estarmos focados naquilo que era a nossa linguagem, mas tínhamos o terreno livre para explorar.”
#batequebate, a começar pelo título em hashtag — palavra chave que serve para indexar tópicos de discussão nas redes sociais —, mostra o que ambiciona ser. A capa é tropicalista, a produção é cheia, preenchida, a música apresenta-se com essa Frescobol (que no Brasil designa ténis de praia) tão colorida e apelativa quanto a capa (batida metronómica, sintetizadores a esvoaçarem), tem guitarra picada e batida robótica em Lugar estranho, comentário à vida enquanto avatar on-line (“É mais fácil escolher o que queremos ser/ e o resto esconder”) e há-de mostrar guitarras bem expostas nessa homenagem ao espírito dos Beastie Boys que é Barulho. No fim, diminuem as rotações, desaparece o sol no horizonte e a música torna-se nocturna, pop ainda, mas atacada de melancolia digital (Homologação, Primavera). Alex descreve a viagem de uma forma curiosa: “Acho que começas como o gajo fixe do Facebook e acabas como a amiga chata que se lamenta no mural ‘ah, hoje preciso do meu namorado’ e ninguém quer saber.
#batequebate é música enquanto comunicação instantânea, um festim lúdico que vai decorrendo em várias divisões de um mesmo edifício. As canções sucedem-se na sua diversidade, rápidas e fugazes, e os D’Alva, disco cá fora, não têm ambição desmedida. “Tenho mudanças muito bruscas de humor e quando ouço este disco há uma canção, a Aquele momento, que funciona como anti-depressivo”, conta Alex. “Juro que ouço-a todos os dias antes de entrar no escritório. Se estes quatro anos [desde o início da colaboração com Ben] serviram só para esta canção existir, great. Espero que a nossa música possa ter esse efeito noutras pessoas.” Quanto a Ben, só tem um desejo: “Que toda a gente possa dar uma escutadela ao disco pelo menos uma vez, sem preconceitos, e que depois decida se gosta ou não. Se o fizerem, já fico feliz.”
Os D’Alva só querem que bata o #batequebate.
***
D’Alva
#batequebate
Optimus Discos