PS e direita insultam-se, pequenos partidos querem discutir a Europa
Debate na Antena 1 juntou oito dos 16 cabeças de lista às eleições de domingo.
O PS, liderado nestas eleições por Francisco Assis, e Paulo Rangel, que representa a Aliança Portugal, a coligação que junta PSD e CDS-PP, não resistiram a acusar-se de demagogia e a chamar "mentiroso" um ao outro, ainda que num tom calmo e ordeiro. Primeiro sobre declarações do antigo ministro das Finanças Teixeira dos Santos acerca do PEC4 poder ter ou não evitado a vinda da troika, depois sobre a questão da mutualização da dívida.
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O PS, liderado nestas eleições por Francisco Assis, e Paulo Rangel, que representa a Aliança Portugal, a coligação que junta PSD e CDS-PP, não resistiram a acusar-se de demagogia e a chamar "mentiroso" um ao outro, ainda que num tom calmo e ordeiro. Primeiro sobre declarações do antigo ministro das Finanças Teixeira dos Santos acerca do PEC4 poder ter ou não evitado a vinda da troika, depois sobre a questão da mutualização da dívida.
No debate de hora e meia na Antena 1, os oito candidatos foram questionados sobre a ideia de um referendo ao euro ou da saída da moeda única, sobre o tratado orçamental, sobre como se podem usar os mecanismos europeus para ajudar países em crise como Portugal, sobre as consequências internas do resultado destas eleições e até sobre se estavam arrependidos de algo que tenham dito ou feito na campanha.
À volta dos microfones da rádio pública juntaram-se António Marinho e Pinto (MPT), Francisco Assis (PS), Gil Garcia (MAS), João Ferreira (CDU), Leopoldo Mesquita (PCTP/MRPP), Marisa Matias (BE), Paulo Rangel (Aliança Portugal – PSD-CDS) e Rui Tavares (Livre). Esta sexta-feira, haverá outro debate com os restantes oito partidos mais pequenos.
Sair do euro? É tarde de mais
Sobre uma eventual saída do euro, reclamada por alguns pequenos partidos como o PCTP/MRPP, a larga maioria dos cabeças de lista ouvidos hoje afastam-na – e nisso PS e a direita PSD-CDS concordam – e só dois aceitam referendá-la. É o caso do MAS e da CDU, que defende a necessidade de o país se preparar para uma eventual saída do euro, por escolha da “vontade popular”, ou imposta pela Europa, como consequência da situação económico-financeira. “Não se pode sair à má fila”, diz Gil Garcia, que acrescenta que a saída “teria de ser depois negociada com os credores”.
Embora admita que a criação da união económica e monetária “foi precipitada” e que deveria ter sido referendada, Marinho e Pinto recusa a saída do euro. “Agora é tarde para voltar atrás. E seria uma tragédia Portugal sair (…)”, afirmou, acrescentando preferir “pensar nos benefícios que o euro trouxe”.
É esse mesmo adiantado do relógio que leva Marisa Matias a dizer que “não há nenhuma saída fácil da situação em que estamos” e que deixar o euro seria “desvalorizar” a economia portuguesa. Em vez de à moeda, Marisa Matias prefere apontar baterias à política de austeridade, o “caminho mais rápido para pôr Portugal fora do euro”, e defender a recuperação económica e social dos países intervencionados.
Rui Tavares realçou que os problemas da Europa “não se resumem ao euro” e lembrou as desvantagens do virar de costas à moeda única – saída que tinha de ser aprovada pelos restantes Estados-membros –, desde o fim de Portugal no espaço Schengen à expulsão do mercado comum, para defender uma conferência de credores e devedores, um mecanismo completamente europeizado.
“Sair é uma má resposta para um problema real”, considera Francisco Assis, que defende uma “maior integração europeia para uma verdadeira governação económica”. Classificando a saída de decisão “catastrófica”, Rangel atirou as culpas da bancarrota no PS. “Lá volta a cassete do Paulo Rangel”, ouviu-se, em fundo, Assis comentar.
Tendo-lhes sido pedido para identificarem o que os separa na questão do Tratado Orçamental, nem Assis nem Rangel foram directos. O socialista preferiu criticar a opção “política do Governo de aplicar o dobro da austeridade prevista no memorando”, e lá foi dizendo que o conteúdo do tratado, que o PS também aprovou, permite uma ampla “interpretação que passa por uma boa negociação na Europa”. Paulo Rangel retribuiu na mesma moeda, criticou a ausência de propostas dos socialistas e acusou-os, citando José Sócrates, de defenderem “que as dívidas são para gerir e não para pagar”.
Respostas ao lado que levaram João Ferreira, da CDU, a apontar-lhes o dedo por fugirem ao assunto e a dizer que o tratado prevê a “ingerência permanente de entidades externas”, tornando Portugal permanentemente numa “colónia [da Alemanha] em termos económicos”. Crítica logo secundada pelos restantes candidatos, havendo mesmo alguns a pedir um referendo ao tratado – Marisa Matias, Rui Tavares e Marinho e Pinto. Este último, porém, acusou os restantes partidos de terem estado “calados sobre o Tratado Orçamental” e de só criticarem agora que a crise está instalada. “Isto é muito bom para quem vive da contestação e de organizar greves”, afirmou.
Como pode a Europa ajudar?
Questionados sobre como é que mecanismos europeus se podem usar para ajudar países em crise, Francisco Assis defendeu uma permanente negociação política entre as diversas instituições europeias, mais tempo para a consolidação orçamental e uma política monetária menos restritiva. Rangel concentra atenções numa maior coordenação das políticas orçamentais, na concretização da união fiscal, na melhoria da supervisão e na preparação de uma agenda para o crescimento. Marinho e Pinto pediu “mais integração e mais coesão”, a definição de um ordenado mínimo europeu, mais apoios sociais à maternidade. “Os problemas da União Europeia são como os das democracias: resolvem-se com mais União Europeia e com mais democracia."
Leopoldo Mesquita insistiu na saída do euro e Gil Garcia nas críticas ao PS e PSD. Rui Tavares defendeu a criação de uma agência especial para ajudar países ou regiões em crise com mais poderes para o BCE poder investir, de uma rede europeia de energia baseada nas renováveis, de uma universidade europeia nos países que precisam de ajuda, e o fim dos paraísos fiscais. João Ferreira avisou que vai defender no Parlamento Europeu a revisão das políticas comuns de agricultura e de pescas para a reintrodução de quotas e direitos de produção e a reorientação das políticas comerciais para a complementaridade entre produção e importação, um aumento do orçamento da União.
Marisa Matias preferiu concentrar-se na exigência da reestruturação da dívida. Assis criticou o facto de a maioria achar que “já não há qualquer problema com a dívida, mas permanecem problemas estruturais; Rangel troçou da ideia socialista da mutualização dizendo que até os socialistas europeus já “tiraram isso da agenda”. Rui Tavares acrescentou a propostas de uma conferência europeia de dívida para a UE encontrar uma solução global em conjunto.
Pouco antes, os ânimos azedaram entre Rangel e Assis. O primeiro disse que até Teixeira dos Santos “afirmou que o PEC4 não evitava o resgate”, e o socialista corrigiu-o: “É mentira, disse que não estava em condições de afirmar se evitava ou não o resgate.” Rangel, como apoio de Marinho e Pinto vincou “depois veremos quem mente”.
Sondagem? Desvalorizar e esperar por domingo
Sobre a sondagem divulgada nesta quinta-feira pela RTP e Antena 1, que dá uma ligeira vantagem ao PS (34%) sobre a coligação PSD/CDS (30%), as palavras de ordem foram desvalorizar e “esperar” por domingo. Paulo Rangel realçou que em 2009 as sondagens – estudos que são “pura especulação” – “falharam” e o PSD acabou por ganhar e o CDS por eleger dois eurodeputados (quando os estudos de opinião não lhe davam nenhum); Francisco Assis, cauteloso, diz que em sondagens “é melhor estar à frente do que atrás”, para logo a seguir afirmar que está “absolutamente confiante numa vitória expressiva no domingo”.
“Prudente” está também João Ferreira, cuja CDU poderá eleger entre dois (como agora) e quatro eurodeputados, e à qual as sondagens de 2009 davam menos percentagem do que agora. Marinho e Pinto, a quem a sondagem dá esperança de poder ter lugar em Bruxelas, diz que “não liga” a estes estudos e que se candidatou “para ser eleito”; Marisa Matias, desiludida por o BE só poder vir a ter um deputado quando em 2009 elegeu três, diz que vai “continuar a fazer essa disputa até domingo”, mas avisa que devido aos altos níveis de abstenção as sondagens das europeias costumam andar longe do resultado final.
Os restantes três partidos não deverão eleger ninguém. Rui Tavares diz que o Livre foi fundado há apenas oito semanas, mas “está em crescendo” e o tempo de antena já foi visualizado 60 mil vezes – e foi emitido depois da realização da sondagem –, mas falta que isso se traduza em votos. O argumento da idade do partido foi repetido por Gil Garcia sobre o MAS, que lamentou que as sondagens não traduzam o desprezo que os portugueses sentem “pela política e pelas eleições” e se queixou da falta de cobertura da comunicação social. Leopoldo Mesquita (PCTP/MRPP) seguiu o mesmo caminho sobre o papel dos media, mas acredita que o seu partido será o mais votado entre os que não têm assento no Parlamento. E afirmou que, se a sondagem incluísse perguntas sobre os temas de campanha, a saída do euro venceria.
Confessionário
A campanha foi mais rica em acusações mútuas do que em esclarecimento - e essa é também normalmente apontada como a razão para o alheamento dos eleitores. Em final de campanha, é hora de perceber se há arrependimentos. Aparentemente, há poucos.
Rangel não tem nada de que se arrependa e aproveita para fazer queixas do PS, do “estilo barroco” de insultos de Assis, e por Manuel Alegre o ter tentado “encostar à ideologia nazi”. Francisco Assis respondeu-lhe que “está a especializar-se em fazer-se de vítima” e disse arrepender-se de ter posto Bloco e PCP no mesmo saco da abordagem do processo europeu. O rebuçado deu-o aos bloquistas porque os comunistas têm “uma atitude muito mais fechada”.
Marisa Matias mostrou-se desiludida pelo “empolamento” das declarações sobre o surf. “Limitei-me a apoiar uma proposta da câmara da Nazaré, que é CDU, de incluir o surf no desporto escolar naquela região”, descreveu e apesar da polémica, hoje mantém a proposta. “O que faltou nesta campanha foi dar mais possibilidade de o povo dizer o que pensa”, acrescentou. A bloquista recebeu depois um elogio e um lamento de Rui Tavares: o dissidente gostava de estar na mesma lista de Marisa e tem “pena por a convergência do 3D não ter dado certo”. A esquerda tem que perceber que só terá a ganhar se se unir, defendeu. Nisso mereceu a concordância de Gil Garcia, mas com uma crítica: acusou Tavares de ter a “estratégia de se aliar ao PS”.
Marinho e Pinto gostaria de ter tido mais oportunidade para denunciar com mais veemência a “maldição” de o país ser governado pelo PS e a direita. E Leopoldo Mesquita queixou-se da cobertura mediática. O comunista João Ferreira lamentou não ter tido resposta do PS ou da direita sobre o desfaio do que votaram diferente no Parlamento Europeu.
A rematar, a análise ao resultado, com Rangel contra todos. O líder da coligação rejeita consequências do resultado de domingo na política interna, ao passo que todos os outros candidatos se manifestaram a favor de o Governo e o Presidente da República fazerem uma leitura dos números finais.