De emigrantes a trabalhadores móveis

Quem recruta quadros de topo para empresas não teme o aumento da emigração de portugueses qualificados porque, dizem, há talento a circular no mundo inteiro. O maior desafio é trazê-los de volta ao país.

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Nas universidades, os cortes nos orçamentos públicos afastam o talento. Retê-lo “está a ser um desafio monstruoso” Público (arquivo)

“Mais importante do que nos preocuparmos com a possibilidade de os jovens saírem é ocuparmo-nos em criar um país e cidades com condições económicas, ambientais e culturais que sejam atractivas para que pessoas talentosas queiram e possam exercer a sua actividade profissional e viver a sua vida aqui”, diz José Bancaleiro, que tem dedicado a carreira a gerir trabalhadores (foi director de recursos humanos na Tabaqueira, na Essilor ou na OPCA). O também professor e actual director da Stanton Chase, empresa que recruta executivos de topo, acredita que, com um “pequeno esforço”, Portugal podia ser “o país mais atractivo da Europa”.

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“Mais importante do que nos preocuparmos com a possibilidade de os jovens saírem é ocuparmo-nos em criar um país e cidades com condições económicas, ambientais e culturais que sejam atractivas para que pessoas talentosas queiram e possam exercer a sua actividade profissional e viver a sua vida aqui”, diz José Bancaleiro, que tem dedicado a carreira a gerir trabalhadores (foi director de recursos humanos na Tabaqueira, na Essilor ou na OPCA). O também professor e actual director da Stanton Chase, empresa que recruta executivos de topo, acredita que, com um “pequeno esforço”, Portugal podia ser “o país mais atractivo da Europa”.

Quando um cliente lhe pede para procurar alguém para ocupar um cargo de liderança, na lista de nomes que apresenta é normal ter candidatos que trabalham fora de Portugal. O mercado de trabalho alargou fronteiras e o destino varia consoante as oportunidades profissionais. “Mais do que emigrantes muitas destas pessoas transformaram-se em trabalhadores móveis, que se têm vindo a adaptar ao fenómeno da globalização. Basta pensar no número de quadros que há uns anos achavam quase impossível irem trabalhar longe de casa e que já estão em Angola ou em Espanha”, diz, lembrando o caso dos engenheiros civis.

Maria da Glória Ribeiro, fundadora e managing partner da Amrop em Portugal, diz mesmo que há mais expatriados, hoje, não devido à crise, mas sim graças à globalização. “É fundamental perceber que quase nunca, hoje, há fronteiras para fazer pesquisa de candidatos”, diz. Nos momentos de instabilidade económica, “as pessoas tendencialmente ficam mais presas aos seus lugares porque não correm riscos”, acrescenta, excluindo da análise todos os que não conseguem encontrar emprego. Ao mesmo tempo, as empresas recrutam menos, fruto da queda do investimento.

As ofertas de trabalho também têm mudado nos últimos anos. José Bancaleiro conta que a “tradicional figura da expatriação tem vindo a ser substituída pela figura da mobilidade internacional”, oferecida como uma condição normal de admissão e sem qualquer pacote financeiro “extraordinário”. Quem é recrutado, sabe que tem um posto de trabalho global e pode, caso aceite, mudar de país mas sem receber um “pacote dourado” e apetecível, como sucedia há alguns anos.

Reter pessoas: o “desafio monstruoso”
A globalização de talentos existe há muito nas universidades que, cada vez mais, competem pelos melhores professores e alunos. Francisco Veloso, director da escola de gestão da Católica, recorda que há anos que perde e ganha docentes nesta “guerra” pelos melhores. “Este ano, por exemplo, recrutámos uma professora da Turquia que estava a acabar o doutoramento na Carnegie Mellon e tinha ofertas de escolas da Europa, dos Estados Unidos e da Ásia. E perdi um professor colombiano que teve uma oferta de uma escola do Canadá”, conta, sublinhando que, ter uma escola nos rankings internacionais, com boa reputação e investigação é determinante para cativar profissionais qualificados.

Francisco Veloso acredita que até ao espoletar da crise económica, em Portugal havia “menos mobilidade do que seria desejável”. Recorda o caso da Irlanda que nos anos 1980 assistiu à fuga massiva de talentos, para os ver regressar na década de 1990. “Essas pessoas são uma fonte, absolutamente crítica, de contactos”, defende, referindo-se à afinidade cultural que pode ajudar a abrir portas. “Portugal não tinha uma diáspora qualificada, nem lugar de destaque, salvo raras excepções. Esta saída mais alargada de portugueses vai permitir ter alguns benefícios”, acredita. Francisco Veloso partilha a mesma opinião de José Bancaleiro: o desafio é aproveitar o talento que se move no planeta. “É muito importante, à medida que o país recupera, as escolas estarem completamente integradas nas redes de circulação de saber internacional, para atrair alunos e professores que podem contribuir para o tecido económico. Estrangeiros e portugueses”, sustenta.

Na outra face da moeda estão instituições que, como a Unidade de Transferência de Tecnologia da Universidade de Aveiro, que lutam para manter os seus colaboradores. Os cortes nos orçamentos públicos afastam o talento. Retê-lo, diz José Paulo Rainho, coordenador desta unidade, “está a ser um desafio monstruoso”. “O problema é que não existe capacidade ou possibilidade de pagar o que estas pessoas merecem. Temos, infelizmente, colaboradores com doutoramento, pós graduações e uma capacidade incrível de trabalho, a receber o ordenado mínimo. E, confrontadas com estes valores as pessoas começam a fazer contas e têm de encontrar oportunidades lá fora”, diz, lamentando a falta de capacidade para reter estes profissionais.

Ainda esta semana, o ministro da Economia alemão Sigmar Gabriel mostrou-se preocupado com os efeitos desta emigração qualificada em Portugal e Espanha e que, na sua opinião, mais poderia contribuir para o crescimento dos países mais afectados pela crise da dívida.